Dar mais poderes ao fisco para aceder e controlar as declarações de rendimentos dos titulares de cargos políticos, uma alteração ao código de IRS e a possibilidade de o Estado apreender os bens não declarados são algumas das medidas previstas no projeto de lei do PS sobre combate ao enriquecimento não declarado, apresentado esta sexta-feira no Parlamento.

A proposta, que dá hoje entrada na Assembleia da República, foi apresentada aos jornalistas por Jorge Lacão, que não se poupou nas críticas aos restantes partidos por terem “perdido dois anos” ao incorrerem em “inconstitucionalidades”.

De acordo com o diploma, que o Observador teve acesso, estas são as principais propostas:

  • Alarga a obrigatoriedade de apresentação da declaração de rendimentos e de património, além dos titulares de cargos políticos, “a outros cargos públicos equiparados”, como os casos de dirigentes de primeiro grau da administração pública ou de administradores de empresas do setor público empresarial.
  • Além da indicação dos rendimentos brutos, o PS quer incluir também a indicação das entidades pagadoras, caso se trate de trabalhadores por conta de outrem ou em regime de avença.
  • Os titulares de altos cargos públicos e políticos, além de terem de apresentar a declaração de rendimentos e património todos os anos desde que chegam ao cargo, devem também renovar as suas declarações até ao limite de três anos após cessarem funções. O objetivo é fazer uma análise comparada.
  • Ministério Público, Tribunal Constitucional e Autoridade Tributária podem em qualquer momento desencadear mecanismos de controlo da sua entrega atempada, ou mesmo da sua autenticidade.
  • O tribunal pode iniciar investigações nos casos em que, depois de aviso do fisco ou do TC, houver fortes indícios de manifestações de fortuna ou acréscimos súbitos de riqueza não justificada. No decorrer da investigação, o tribunal tributário pode decidir-se pela apreensão preventiva dos bens não justificados. Se a suspeita resultar em condenação do arguido, a sentença pode converter-se em perda definitiva dos rendimentos não lícitos a favor do Estado.
  • Alteração ao código do IRS: o PS propõe que os acréscimos patrimoniais não justificados, de valor superior a 100 mil euros, nos termos do código de IRS, passem a ser tributados à taxa especial de 80%, e não de 60% como até aqui.
  • Criação de uma base de dados eletrónica, a funcionar junto da secretaria do Tribunal Constitucional, que faça o registo das declarações de rendimentos, para agilizar a sua consulta por parte das autoridades.

Em conferência de imprensa, na Assembleia da República, o dirigente socialista e ex-ministro Jorge Lacão reforçou que o diploma dos socialistas retoma um projeto apresentado já há três anos, durante a direção de António José Seguro, “que visava regulamentar o combate ao enriquecimento injustificado de forma adequada”. O projeto, na altura, foi chumbado por todos os restantes grupos parlamentares, que aprovaram o diploma da maioria que acabaria chumbado no Tribunal Constitucional.

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“Dissemos na altura que as soluções por outros defendidas eram grosseiramente inconstitucionais e o Tribunal Constitucional deu-nos inteira razão. Estamos agora em completamente à vontade para, em coerência com o que já defendemos no passado, renovar uma iniciativa legislativa”, declarou o ex-ministro dos Assuntos Parlamentares, citado pela agência Lusa.

O projeto hoje apresentado, no entanto, não é exatamente o mesmo do que o apresentado pelo partido em 2011, ao comando de Seguro. Entre as novidades conta-se a alteração ao código de IRS, que antes não estava prevista, assim como a criação da base de dados eletrónica, ou ainda a possibilidade de o Estado apreender preventivamente os bens do arguido nos casos em que é instaurado um processo judicial de natureza criminal ligado à corrupção, tráfico ou de natureza semelhante.

Interrogado sobre outros projetos sobre prevenção e combate à corrupção já equacionados pelo PS, designadamente outro em matéria de reforço das incompatibilidades, Jorge Lacão remeteu para mais tarde a sua apresentação. “Neste momento vamos entregar este projeto sobre acréscimos de riqueza e de património, matéria que está agendada para a próxima semana. Em face dos agendamentos previstos, o PS apresentará as outras iniciativas legislativas”, disse o dirigente socialista.