O número dois de António Costa vai passar a número um. Isto porque o secretário-geral do PS renuncia, esta quarta-feira, ao mandato de presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Se, por um lado, Costa pode agora dedicar-se em exclusivo ao PS e à preparação da campanha para as legislativas, por outro, Fernando Medina tem pela frente responsabilidades acrescidas junto dos munícipes da capital portuguesa.

Conhecido por ser um dos homens fortes do candidato a primeiro-ministro pelo PS, o economista de formação vai liderar a câmara aos 42 anos (cumpridos há cerca de um mês) sem ter ido a votos diretamente. Mas quais são as opiniões de Medina sobre o país e o mundo, ele que é, ao mesmo tempo, um dos membros da atual direção do partido com experiência de Governo?

Sobre António Costa

  • Em fevereiro de 2015, Medina dizia numa entrevista ao Diário Económico que António Costa, então presidente da Câmara de Lisboa, só deixaria o cargo quando fosse nomeado primeiro-ministro. “A situação é muito clara, o António Costa é o presidente da Câmara de Lisboa e só deixará de ser presidente da CML, pelo que a lei obriga, quando for nomeado primeiro-ministro. Até lá, a gestão da Câmara e do partido tem-se mostrado totalmente compatível”, argumentou. À data, Fernando Medina foi longe nas declarações. Na verdade, a intenção era dizer que Costa não estava a ser pressionado em termos de tempo para abandonar a presidência da autarquia.
  • Defendeu ainda, na mesma entrevista, a acumulação de funções do também secretário-geral do PS: “António Costa é um quadro político verdadeiramente excecional, não vejo que haja dificuldade ou incompatibilidade na acumulação de funções, quando se tem equipas treinadas e organizadas e o trabalho organizado nas duas frentes. E isso tem corrido bem nas duas frentes”, dizia.
  • Fernando Medina desvalorizou, em fevereiro último, a polémica em torno do vídeo de António Costa — no qual se vê o secretário-geral socialista a dizer, perante uma plateia de empresários chineses, que “o país está hoje bastante diferente do que estava há quatro anos”. Em entrevista à TSF, Medina afirmou que “é absolutamente inequívoco o pensamento de António Costa sobre a situação do país e o que foi feito nos últimos anos”. Afirmou, ainda, que o caso era apenas “um fait-divers” que estava “a ser aproveitado, que não belisca a substância do pensamento de António Costa, que é sólido, claro e transparente”.

Sobre o Partido Socialista

  • O sucessor de António Costa criticou a direção do PS em junho de 2014 (com António José Seguro na liderança) por ter “silenciado o passado”. Numa entrevista ao Observador, defendeu a herança recente do partido e afirmou que José Sócrates “não é fantasma nenhum — cometeu erros, fez coisas grandiosas”. Nesta altura, o ex-primeiro-ministro ainda estava a meses de ser preso preventivamente.
  • Sobre António Guterres, Medina mostrou não ter dúvidas de que o antigo primeiro-ministro daria um “extraordinário candidato e, acima de tudo, um extraordinário Presidente da República”, tal como disse à rádio TSF, também em fevereiro deste ano.
  • Sobre o financiamento da Câmara Municipal de Lisboa disse, em novembro de 2014, ao Diário de Notícias: “A situação financeira da câmara é uma situação sólida, uma situação que tem riscos do ponto de vista da evolução, quer do ponto de vista das receitas correntes, que está muito ligada também à situação do país e da crise. A Câmara, ao longo dos anos, teve uma deterioração da sua receita estrutural. Temos também de lidar durante este mandato com duas contingências grandes: o processo da feira popular – da antiga feira popular – e a extinção da EPUL”.

Sobre a crise económica

  • Na entrevista ao Observador, Fernando Medina afirmou que o afogo económico que se vive no país em anos recentes resultava de uma crise da balança de pagamentos: “Hoje é evidente que a leitura de que esta situação ocorreu por causa da despesa do Estado está profundamente errada. (…) O que temos hoje é uma crise da balança de pagamentos, que resultou de uma acumulação de dívida e de uma rutura do mecanismo de financiamento dessa dívida dentro da moeda única”.
  • Ainda no decorrer da mesma entrevista, Medina afirmou que a crise nunca poderia ter sido evitada — nem uma política contracionista nem o corte de salários, em 2009, por parte do Estado surtiriam efeito. À data, apontou o dedo às instituições europeias, acusando-as de terem perpetuado incertezas face ao financiamento dos Estados: “A Europa deixou que se introduzisse uma dúvida sobre se havia ou não financiamento aos Estados. A crise de financiamento começou nos bancos, mas estes têm financiamento no BCE – os Estados não. (…) “Nós não podíamos ter evitado o problema da rutura de financiamento.”
  • Em maio de 2014, no seu espaço de opinião no Jornal de Negócios, o socialista escrevia que o “falhanço da resposta europeia à crise” tornara claro que “vivemos um momento de mudança profunda no modelo de relacionamento interno na União Europeia”, para o qual o “atual Governo” se recusara a contribuir. “Pela simples razão de que partilhou com os países credores a visão de que a aplicação da austeridade expiaria os nossos pecados. Afinal de contas, para o Governo, a arquitetura da zona euro estava perfeita e o problema das economias periféricas resumia-se a um problema de despesa, de dívida e de salários demasiado altos.”
  • Mais tarde, já este ano como membro do Secretariado Nacional do PS defendeu à RTP, a importância estratégica para a economia portuguesa do programa de investimentos da Comissão Europeia, isto é, o Plano Juncker. Para Fernando Medina, “o Plano Juncker é tudo aquilo que o Governo português sempre negou: Negou que Portugal necessitasse de uma resposta europeia, e este é um programa à escala europeia; negou em absoluto a necessidade de um investimento de iniciativa pública; e negou em absoluto os elementos que permitiriam a Portugal recuperar mais rapidamente da crise”.

Sobre a Grécia

  • O socialista considerou, em meados de fevereiro, que a decisão da Europa de empurrar a Grécia para uma saída do euro seria “trágica”, além de “um processo totalmente incontrolável”, capaz de gerar “o risco de uma turbulência financeira na Europa sem precedentes”. Em declarações à SIC Notícias, afirmou, ainda, que as reivindicações de Alexis Tsipras — um prolongamento do programa de assistência financeira com o alívio das medidas de austeridade –, não só faziam sentido como mereciam resposta séria por parte dos parceiros europeus.

Sobre o atual Governo

  • Fernando Medina olha para os últimos anos de governação como um fracasso e critica as medidas de consolidação em vigor, as quais estão a “levar-nos para uma situação de insustentabilidade”, tal como disse a Observador. A solução, alega, passa por uma “negociação séria na Europa sobre a situação da dívida”.

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