O embaixador russo em Lisboa, Oleg Belous, considerou esta segunda-feira que os Estados Unidos estão na linha da frente da atual “agressiva campanha anti-russa” porque não gostam de que a Rússia tome “decisões independentes”. “O papel principal nesta agressiva campanha anti-russa é desempenhado pelos Estados Unidos, que incentivam outros Estados a seguir o mesmo caminho”, considerou o embaixador, em entrevista à Lusa, em plena crise político-diplomática entre Moscovo e o ocidente, que já implicou a expulsão de centenas de diplomatas pelas duas partes.

“Os EUA não gostam que a Rússia tenha a sua própria opinião, não gostam que a Rússia tome decisões independentes, que dê uma prioridade aos seus interesses nacionais, claro que tomando em conta os interesses nacionais dos restantes parceiros”, assinalou. “Não gostam que a Rússia tenha a sua própria avaliação da situação mundial e, mais importante, não gostam que não escutemos as ordens que Washington tenta dar a todos”, prosseguiu Oleg Belous, 66 anos, que desde 2013 exerce em Lisboa as funções de embaixador da Federação da Rússia.

Perante o atual contexto geopolítico, agravado desde 2014 pela anexação russa da península da Crimeia após um referendo no território, o embaixador russo prefere evitar o termo de um suposto regresso à Guerra Fria, mas admite uma “crise nas relações” entre Rússia e o ocidente e entre Rússia e NATO. “O mais importante neste momento seria que os políticos em Washington, na Europa, na Rússia, fizessem uma pausa para pensarem no que vamos fazer nesta situação. Mas de qualquer forma, não estamos interessados num aumento desta tensão”, disse.

Oleg Belous também recorre a declarações do Presidente russo, Vladimir Putin, para assegurar a disponibilidade de “cooperação e diálogo” e que poderiam solucionar as atuais posições opostas. “Mas é um facto evidente que há uma guerra de informação, basta mesmo ler os jornais portugueses, sem falar dos norte-americanos ou britânicos. No terreno da informação, existe uma ofensiva muito ativa”, considerou. As relações diplomáticas entre Washington e Moscovo têm-se ainda degradado após as alusões de uma ingerência russa nas eleições presidenciais norte-americanas de 2016, e que culminaram na crise motivada pelo envenenamento em território britânico do ex-duplo espião russo Serguei Skripal e da sua filha Yulia. Uma ação atribuída por Londres a Moscovo, que refuta as acusações.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Estamos todos, inclusivamente o Presidente da federação da Rússia, Vladimir Putin, bastante cansados de falar sobre o tema da eventual ingerência nas presidenciais dos EUA. Até ao momento não há provas… [e esta questão está sempre a ser colocada] porque a candidata Hillary Clinton não podia admitir que ia perder, e alguém teria de ser culpado por esse fracasso. E a Rússia passou a ser a responsável… Os participantes mais ativos destas acusações são democratas”, sublinhou. O diplomata, que já exerceu funções na França e Bélgica, ao serviço da União Soviética, e na segunda capital também ao serviço da Rússia, além de ter representado o seu país junto da OSCE, sublinha ainda as recentes acusações sobre interferências de Moscovo em outros processos eleitorais, no referendo sobre o ‘Brexit’, na Alemanha, mesmo na Catalunha, e que define como “disparates”.

Oleg Belous sustenta que o fim do equilíbrio estratégico foi provocado pelos Estados Unidos, quando declararam em 2002 a sua saída do Tratado sobre Defesa antimíssil. “Por isso, no momento atual, o território russo está cercado por instalações antimísseis, para que possam intercetar os eventuais mísseis balísticos russos”, disse. A resposta, como refere, foi concretizada recentemente. “As Forças Armadas russas estão a ser equipadas com mísseis que não podem ser intercetados pela defesa antimíssil norte-americana. Ou seja, no momento atual e em certa medida regressámos ao equilíbrio estratégico. Não se trata de nenhuma corrida aos armamentos, anualmente as despesas militares russas são cerca de 50 mil milhões de dólares norte-americanos, os EUA despendem 700 mil milhões”.

Mas, como garantiu, existe a disponibilidade de Moscovo em fazer recuar esta eventual escalada. “Já após as eleições presidenciais russas, em 18 de março, o nosso Presidente declarou que os principais programas militares de defesa foram cumpridos e por isso as despesas militares russas podem ser reduzidas”, assegurou.