O mundo necessita de energia eléctrica para tudo e mais alguma coisa. Além de iluminar as nossas casas, escritórios e fábricas, aquecê-los e mantê-los em funcionamento, a electricidade serve ainda para recarregar as baterias que alimentam cada vez mais veículos com emissões zero. Mas, em muitos casos, esta energia ainda é gerada com recurso à queima de combustíveis fósseis, que poluem e são pouco eficientes, sejam essas centrais a carvão, fuel ou gás natural. Há uma crescente percentagem de fontes renováveis, mas são ainda raros os países – sendo Portugal um dos poucos exemplos – onde elas são maioritárias.

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As centrais térmicas, as mais comuns, queimam combustíveis de origem fóssil para gerar calor, com o qual produzem vapor de água, que por sua vez faz girar as turbinas que geram electricidade. O processo é simples e fácil, ainda que muito poluente. E se cada vez mais se opta por soluções menos nefastas para o ambiente para gerar electricidade, há sectores que não conseguem prescindir da queima de combustíveis. Precisamente aqueles que necessitam de temperaturas mais elevadas, que as renováveis têm dificuldades em satisfazer. Ou tinham. Pelo menos, até surgir a Heliogen.

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Inteligência artificial ao serviço do Sol

A produção industrial de cimento e aço, entre outras, exige temperaturas acima dos 1.000 ºC, valor que necessita de queima directa para ser atingido. Daí que sectores como estes sejam responsáveis por 7% das emissões de CO2 do planeta, a que urge somar as partículas, os NOx, o enxofre e tudo o mais que os combustíveis fósseis produzem quando os queimamos. E num futuro não muito longínquo, mesmo quando todos os países já produzirem a electricidade de que necessitam a partir de fontes renováveis, corremos o risco de continuar a ter de queimar gasóleo ou gás para termos o cimento, o ferro e o aço de que precisamos. Parece que a “criatividade” da Heliogen veio por fim a tudo isto.

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A startup financiada por Bill Gates, fundador da Microsoft, e Patrick Soon-Shiong, dono do Los Angeles Times e o criador de um medicamento para o tratamento de cancro dos pulmões, mama e pâncreas, desenvolveu uma central solar que consegue produzir entre duas a três vezes mais calor do que era possível até aqui. Seguindo os princípios do que se designa por Concentrated Solar Power, ou CSP, a Heliogen também recorre a espelhos (tipicamente cerca de 1.000) que reflectem a luz do Sol, concentrando-a num único ponto. No papel, a CSP da empresa californiana não difere muito das restantes centrais do género e há muitas. Excepção feita para a temperatura que consegue gerar, pois se as concorrentes se ficam pelos 500 a 650º C, a Heliogen já supera 1.000º C e pode atingir 1.500º C. Qual é o truque? Inteligência artificial, que é usada para controlar o movimento dos espelhos para os concentrar num ponto muito mais pequeno, incrementando a temperatura, que assim pode atingir ¼ do valor medido na superfície do Sol (5.500º C).

Este é o sistema de funcionamento tradicional de uma central solar por concentração

Esta solução permite, pela primeira vez ,substituir os combustíveis fósseis nas indústrias cimenteira e metalúrgica, que só por si são responsáveis pela libertação de metade (7%) do CO2 atribuído ao sector dos transportes (14%), recorrendo ao calor gerado com emissões zero e com custos reduzidos.

Sistema “low cost” para electricidade e hidrogénio

Além de resolver o problema das indústrias que mais necessitam de calor, através da HelioHeat, a Heliogen desenvolveu outra componente, a HelioFuel. Esta última visa aproveitar a imensa quantidade de energia que os seus espelhos articulados e dirigidos milimetricamente conseguem produzir, com custos muito reduzidos, para os colocar ao serviço da produção de electricidade e de combustíveis como o hidrogénio e os combustíveis sintéticos.

O sistema HelioMax garante que os espelhos estão sempre apontados a um ponto muito pequeno na torre. As elevadas temperaturas permitem produzir calor, ou utilizá-lo para fabricar hidrogénio ou gerar electricidade

No caso específico do hidrogénio, necessário para alimentar as células de combustível alimentadas por este gás, a Heliogen afirma que é capaz de termoquimicamente separar as moléculas de água. Defendem os técnicos da empresa californiana que, graças à energia e ao calor que controlam, é possível produzir combustíveis renováveis competitivos em custo face aos combustíveis fósseis.

Todo o sistema de funcionamento da Heliogen foi desenvolvido por cientistas e engenheiros da Caltech – o Califórnia Institute of Technology – em colaboração com o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e apresenta a grande vantagem de ser escalável, o que significa que podem ser instalações grandes capazes de gerar vários gigawatts, mas pode-se igualmente optar por instalações mais pequenas, até um mínimo de 1 MW. Sempre gerando energia com custos mais reduzidos do que os conseguidos pelos sistemas tradicionais e poluentes, à custa de combustíveis fósseis.