A chuva intensa que se abateu sobre a Beira, centro de Moçambique, trouxe para Rabeca Mussece lembranças do pesadelo de um passado recente de destruição, tendo sido obrigada novamente a procurar refúgio num centro de acolhimento após inundações na sua casa.

“Voltei a ser obrigada a deixar as minha casa e fugir para um centro de acomodação devido a chuva, tal como em março. Perdi o pouco que estava a tentar reorganizar”, lamenta à Lusa Rabeca Mussece, 33 anos, com o filho ao colo, sentada num dos bancos da Escola Secundária de Matadouro, no bairro da Manga, cidade da Beira.

Tal como Rabeca Mussece, um total de 110 pessoas foram obrigadas a procurara refúgio naquele escola após chuva intensa, de quarta-feira e quinta-feira, na nalguns distritos da província de Sofala, incluindo a cidade da Beira.

Estas regiões tentam reerguer-se após a passagem do ciclone Idai, que matou cerca 604 pessoas no centro do país e afetou 1,5 milhões, destruindo diversas infraestruturas.

Resilientes e conformados. Na Beira, os moçambicanos convencem-se de que a normalidade voltou

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

As chuvas começaram na madrugada de quarta-feira, anunciando a época chuvosa que país agora atravessa e que só termina em abril. “Só na madrugada quarta-feira a quantidade de chuva que caiu foi a que nós estávamos a prever para os próximos 15 dias deste mês. Foi muita chuva e vamos continuar a monitorar até que as baixas pressões passem ao nível desta região”, disse à Lusa Jamal Alfat, delegado do Instituto Nacional de Meteorologia em Sofala.

Além da cidade da Beira, a chuva inundou residências nos distritos de Marromeu, Cheringoma, Caia, Muanza, Dondo, Búzi, Nhamatanda, Marínguè, Gorongosa, destruindo infraestruturas e deixando um total de cinco mil pessoas vulneráveis.

Hoje, para os que se refugiaram nos centros de acomodação, os problemas parecem ser os mesmo de há nove meses. “Pedimos água, mantas e redes mosquiteiras, pois muitos de nós perdeu quase tudo com a chuva de quarta-feira”, conta Rabeca Mussece.

Não muito longe da Escola Secundária de Matadouro, o bairro periférico Ndunda é um retrato fiel do impacto das chuvas, com várias casas submersas e crianças a transformarem os charcos em lagoas, num evidente perigo para a saúde pública.

Reportagem. Depois do ciclone, a cólera ameaça no silêncio das ruas da Beira

“Há pessoas a beberem água retirada dos charcos”, alerta Afonso Luis Neves, um dos poucos residentes do bairro que teve a coragem de permanecer no local, embora, por vezes, temesse que chuva tivesse o impacto do Idai. “Não sabíamos muito bem o que estava a acontecer na madrugada de quarta-feira. Mas decidi ficar, não dá para perder tudo novamente como aconteceu no Idai”, acrescenta Afonso Luis Neves.

O Hospital Central da Beira espalhou brigadas pelas ruas da cidade da beira para evitar surtos e outras doenças associadas às chuvas. “Até ao momento não temos qualquer caso de diarreia relacionado com o evento que estamos a passar, mas estamos prontos para responder, disse à Lusa a diretora clínica do HCB, Ana Tambo.

Apesar de ter abrandado nos últimos dois dias, as previsões apontam para chuva na Beira nos próximos dias.

O ciclone Idai afetou cerca de 1,5 milhões pessoas no centro do país. Pouco tempo depois, em abril, o norte do país foi afetado por outro ciclone, o Kenneth, que causou a morte de 45 pessoas e afetou 250 mil.

Entre os meses de novembro e abril, Moçambique é ciclicamente atingido por ventos ciclónicos oriundos do Índico e por cheias com origem nas bacias hidrográficas da África Austral.