Parecem tudo boas notícias. A Johnson & Johnson está a desenvolver uma vacina, que considera ser forte candidata a líder no combate ao coronavírus, segundo anunciou a empresa esta segunda-feira. A multinacional espera começar os testes em humanos já daqui a seis meses e, no início de 2021, acredita que o fármaco estará pronto a ser usado em situações de emergência. Mais ainda, compromete-se a usar a capacidade produtiva das suas fábricas para produzir mil milhões de doses da vacina. Para que tal seja possível, a empresa e o governo dos EUA vão investir mil milhões de dólares na capacidade de produção da empresa, cabendo à administração de Donald Trump uma fatia de 421 milhões.

Antes de soltar os foguetes — até porque há mais farmacêuticas a prometer encontrar a vacina para a Covid-19 —vamos analisar o comunicado de imprensa do Johnson & Johnson. Ali há factos científicos e há promessas que, por enquanto, não passam disso mesmo.

Primeiro, os factos. Desde janeiro de 2020, quando foi sequenciado o genoma do SARS-CoV-2 que a multinacional deu o tiro de partida. Através da Janssen, a companhia farmacêutica do grupo Johnson & Johnson, começou a investigar possíveis candidatos a vacinas em parceria com o Centro Médico Beth Israel Deaconess, de Boston, um hospital-escola da Escola de Medicina Harvard. Várias vacinas foram testadas até se identificar aquela que oferece maior garantias de produzir uma resposta imune durante os testes pré-clínicos.

É nesse ponto que a investigação se encontra. A Johnson & Johnson anunciou ter encontrado aquele que acredita ser o candidato mais forte a impedir a infeção do novo coronavírus.

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Antes de qualquer teste em humanos — como os que, por exemplo, a equipa da virologista Chen Wei já estão a levar a cabo na China — uma potencial vacina tem de passar pelos testes em laboratório, onde são analisados os novos compostos, pelos testes pré-clínicos, onde é avaliada a segurança e eficácia, e finalmente pelos estudos de toxicidade in vivo em animais. Só depois se entra na fase de ensaios clínicos, ou seja, testes em humanos.

A vacina da Johnson & Johnson vai agora começar os testes pré-clínicos.

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Testes em humanos em setembro

Factos à parte, daqui para a frente entramos na parte de especulação e desejos das equipas da Johnson & Johnson. O calendário da investigação é apertado: a multinacional acredita que até setembro os testes pré-clínicos terão assegurado a segurança e eficácia da vacina, e que os estudos em animais terão dado certo.

Se tudo correr bem, e dentro destes prazos, a companhia estima que em setembro de 2020 estará a dar início aos estudos clínicos de fase I, ou seja, ao uso do medicamento pela primeira vez num ser humano. Nesta fase, o fármaco é testado em voluntários saudáveis e sem a doença que está a ser estudada, neste caso Covid-19.

Se tudo continuar a correr bem, na fase II estudam-se cerca de 100 a 300 indivíduos doentes com diferentes dosagens da vacina para confirmar se existe efeito terapêutico. Na fase III, acompanham-se milhares de pacientes por um período maior de tempo e os voluntários recebem ou o novo tratamento ou o placebo.

Cada uma destas fases leva o seu tempo e, se demorar vários meses até se chegar à fase III, o principal risco é não haver doentes suficientes para se fazer o ensaio em grande escala. Só depois da fase III é que se pode pedir a aprovação de um medicamento.

Pelas contas da Johnson & Johnson, tudo isto estará pronto no início de 2021, altura em que estima que a vacina possa ser usada em situações de emergência, “num período substancialmente acelerado em comparação com o típico processo de desenvolvimento de vacinas”, diz no seu comunicado.

O uso de emergência significa que um produto médico não aprovado possa ser usado em situações de emergência, como a da atual pandemia, para diagnosticar, tratar ou prevenir doenças graves. Ou seja, alguns passos dos ensaios clínicos poderão ainda não estar concluídos antes de se usar a vacina em alguns doentes.

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“O mundo enfrenta uma crise de saúde pública urgente e estamos comprometidos a fazer a nossa parte para tornar a vacina disponível e acessível, de forma global, o mais rápido possível. Como maior empresa de assistência médica do mundo, sentimos uma profunda responsabilidade de melhorar a saúde das pessoas em todo o mundo”, disse Alex Gorsky, CEO da Johnson & Johnson.

Mil milhões de doses

Para produzir as doses a que se propõe, a Johnson & Johnson terá de aumentar a sua capacidade de produção. Segundo Paul Stoffels, diretor científico da empresa, a sua fábrica nos Países Baixos poderá produzir até 300 milhões de doses da vacina, valor que “não será suficiente para o mundo inteiro”.

Por isso mesmo, a empresa começou a construir uma fábrica nos Estados Unidos que deverá estar pronta para fabricar vacinas até ao final do ano. Segundo Stoffels, a empresa está também à procura de intalações fabris na Europa e na Ásia capazes de produzir o tipo de vacina que está a ser desenvolvido.