Ninguém sabe quando isto vai acabar, mas António Costa pede um esforço aos portugueses para manterem a disciplina — sobretudo aos idosos, que “têm de fazer um esforço maior para estar sós”. O tom é realista, e o primeiro-ministro faz questão de repetir várias vezes a ideia de que não quer dar falsas esperanças. Sair do buraco, vamos sair. Quando, ninguém sabe. Pode durar mais “dois, três meses”, o “sonho” era que voltássemos gradualmente à normalidade “no fim de abril”, mas do sonho à realidade vai uma distância considerável. Uma coisa é certa: “este é o mês mais difícil” porque as pessoas vão sentir a quebra no rendimento e vão sentir o cansaço, e as saudades, inerentes ao isolamento. O esforço tem, por isso, de ser maior e, para evitar cedências ao cansaço, a malha do Governo também vai ser mais apertada.
Foi isso que o primeiro-ministro anunciou ao final da manhã desta quarta-feira no Programa da Cristina, na SIC. O estado de emergência vai ser renovado por mais 15 dias e o Governo vai aproveitar para “apertar um bocadinho a lei” para que fique claro que não devemos ceder nem facilitar.
António Costa não especificou que tipo de medidas restritivas o Governo vai apertar, mas alertou várias vezes para o facto de os portugueses terem de perceber que as férias da Páscoa não podem ser sinónimo de maior circulação nas estradas. “As pessoas não podem ir à terra. Não podem ir visitar os familiares. Os emigrantes portugueses, este ano não podem vir a Portugal, até porque não vão poder sair de casa. As famílias numerosas vão ter de estar cada uma em sua casa”, enumerou, explicando como a Páscoa este ano vai ter de ser “radicalmente diferente”.
“É muito difícil manter esta disciplina, e depois acresce o cansaço. Ao fim de algum tempo é difícil manter este isolamento. Acho que vamos ter de apertar um bocadinho a lei para que fique mais claro que temos de fazer este esforço agora para que dure o mínimo tempo possível”, sublinhou.
Questionado por Cristina Ferreira sobre em que estado Portugal vai sair desta situação, o primeiro-ministro admitiu que “vamos sair mais pobres” e “mais frágeis do ponto de vista económico” mas também “vamos melhorar a nossa auto-estima coletiva”. “Vamos ter de fazer um esforço enorme para relançar a economia. Para que possamos chegar na maior saúde financeira possível ao fim deste túnel. Esperemos que isto dure dois ou três meses, mas essa é uma esperança que não posso transmitir”, disse ainda no final da entrevista.
Aos mais idosos, que são os que correm maior risco de vida se contraírem o vírus, António Costa pediu que fizessem um “esforço maior de estarem sós”, para se protegerem da doença. “As pessoas que têm uma saúde normal e que têm menos de 65 anos podem demorar a curar-se da doença, mas em princípio não correm risco de vida. São os mais idosos que são mais suscetíveis de serem contaminados, e são os que têm maior risco de vida, são aqueles onde é mais difícil tratar a doença”.
Questionado sobre se não falta mesmo nada no SNS, Costa admitiu que a sua frase não foi bem percebida, mas garante que “todos os dias temos pedido mais material”. O problema é que “há uma luta brutal em todo o mundo por ventiladores, óculos, viseiras, máscaras”, ou seja, a corrida é “brutal” e é “mundial”. O primeiro-ministro insiste que não há falta de ventiladores, por exemplo, havendo habitualmente mais de mil no SNS, mas essa compra está a ser feita até para “controlar o pânico”. Ou seja, não temos falta, ainda, de ventiladores, mas temos de nos prevenir, disse o primeiro-ministro. Para evitar que aconteça em Portugal o que acontece noutros países em que os médicos têm de escolher quem salvam: “Temos de dar segurança às pessoas para ir combatendo o pânico: se isto se descontrolar, temos de saber que temos capacidade de resposta”.
“Vamos engolir muita água”. Costa admite ensino via TV
Sobre a reabertura ou não das escolas neste ano letivo, Costa recusou-se a dizer que o mais provável é não voltarem a abrir este ano. Disse que só no dia 9 é que vai tomar essa decisão, sendo que a regra é “o máximo de contenção com o mínimo de perturbação”. No dia 7 haverá nova reunião com os peritos da DGS estritamente para o Governo tomar uma decisão sobre as escolas. No cenário menos mau, o primeiro-ministro disse que as escolas deveriam abrir no início de maio, sendo que as férias da Páscoa acabam a 15 de abril. “Não há cenários bons, mas esse seria o menos mau”.
Mas o grau de probabilidade não é elevado. Em todo o caso, o Governo está a estudar a hipótese de o ensino no terceiro período ser feito à distância, nomeadamente através da televisão digital terrestre para garantir acesso a todos. “Estamos a trabalhar para ter uma solução para todos os níveis educativos, para que seja na TV (TDT) para ser acessível a toda a gente”, continuou, assumindo a dificuldade que é assegurar grelha para todas as disciplinas.
E garantiu: “Não podemos perder o ano, vamos salvar o ano e assegurar a todos a maior justiça na avaliação e as maiores oportunidades no acesso educativo para garantir a aprendizagem que os alunos devem adquirir. Queremos ter uma rede de segurança assente na TV para garantir a acessibilidade, ao mesmo tempo que vamos continuar a desenvolver nas escolas todas as plataformas digitais que têm sido utilizadas e estudar ao máximo a oportunidade de as escolas reabrirem o mais cedo possível”.
Uma coisa é certa: ninguém sabe quanto tempo a fase de contaminação vai durar. Vai ser duro, e o primeiro-ministro não quer iludir ninguém. “Quando eu disse que uma boia não nos salva do tsunami, isso significa que vamos engolir muita água. Mas quanto mais disciplinados formos neste período, menos tempo isto dura”, disse. “E quando reabrirmos vamos ter de reabrir devagarinho, porque o vírus ainda vai estar entre nós”. Ou seja, vamos ter de aprender a conviver com o vírus, já que vamos ter de passar mais um inverno sem vacina.