O Ministério Público está a analisar a carta do primeiro-ministro, na qual pede que sejam avaliados procedimentos para acautelar a proteção dos interesses do Estado no Novo Banco, segundo fonte oficial da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Confirma-se a receção da carta do senhor primeiro-ministro. A mesma encontra-se em análise”, respondeu fonte oficial da PGR à Lusa.

O Expresso noticiou no sábado que António Costa enviou uma carta à procuradora-Geral da República, Lucília Gago, onde pede a suspensão da venda de ativos do Novo Banco até que esteja concluída a auditoria que está a ser feita pela Deloitte.

Segunda a carta a que o semanário teve acesso, o chefe do Governo fala das acusações feitas no parlamento pelo presidente do PSD, Rui Rio, sobre as vendas de ativos pelo Novo Banco para sustentar o pedido para que o Ministério Público desenvolva “os procedimentos cautelares adequados à proteção dos interesses financeiros do Estado” até que a auditoria esteja concluída.

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Na semana passada, na sua intervenção de fundo no debate do estado da nação, Rio reiterou suspeitas sobre as perdas registadas na venda de imóveis do Novo Banco e defendeu que a informação disponível “é já suficiente para que o Ministério Público se possa debruçar sobre a forma como este contrato de venda do Novo Banco à Lone Star tem vindo a ser executado”.

O jornal Público noticiou, no início de julho, que o lote de quase 200 imóveis vendido em agosto de 2019 com um desconto próximo de 70% a entidades ligadas ao fundo de investimento Cerberus teve perdas de 328,8 milhões de euros e que o fundo a que foi vendido é o principal acionista do banco austríaco Bawag PSK, que era liderado por Byron Haines até meados de 2017, pouco antes de este assumir o cargo de ‘chairman’ do Novo Banco (presidente do Conselho Geral e de Supervisão).

Ainda segundo o jornal, foi feita uma queixa à Autoridade Europeia de Mercados e Títulos (ESMA, na sigla em inglês) por gestão ruinosa e pedindo uma investigação criminal.

Na semana passada, em entrevista ao Jornal Económico, Byron Haines disse que a venda da carteira de imóveis foi competitiva e que não foi feita com desconto, mas ao preço de mercado, afirmando que os ativos não estavam corretamente avaliados.

Tenho 25 anos de experiência na indústria financeira e a qualidade de alguns ativos foi a pior que vi na minha vida profissional. Foi a qualidade dos ativos que pressionou, para baixo, o preço do mercado”, afirmou.

Byron Haines disse ainda que não tem tido contacto com o fundo Cerberus desde que saiu do Bawag Bank.

O Novo Banco não é o BES, o Conselho de Administração Executivo do Novo Banco não é a antiga gestão do BES e eu não sou o Ricardo Salgado”, acrescentou.

Ainda na entrevista ao Jornal Económico, o ‘chairman’ do Novo Banco disse que, mesmo face à crise do Covid-19, a prioridade da sua equipa continua a ser ‘limpar’ o Novo Banco dos ativos ‘tóxicos’ herdados do BES (crédito malparado e imóveis) que penalizam o seu capital e resultados, designadamente através de vendas, e que quer concluir esse processo este ano.

Nascido na resolução do BES (em 3 de agosto de 2014), 75% do Novo Banco foi vendido em outubro de 2017 ao fundo de investimento norte-americano Lone Star, mantendo o Fundo de Resolução bancário 25%, numa solução acordada entre Banco de Portugal e Governo.

O Lone Star não pagou qualquer preço, tendo injetado 1.000 milhões de euros no Novo Banco. Além disso, foi acordado um mecanismo de capital contingente, que previa que durante oito anos o Fundo de Resolução compensasse o Novo Banco por perdas de capital num conjunto de ativos ‘herdou’ do BES até 3.890 milhões de euros.

Desde então e até esta segunda-feira, o Fundo de Resolução já injetou 2.976 milhões de euros e ainda poderá colocar mais de 900 milhões de euros, valores que em cada ano têm impacto nas contas públicas uma vez que o Fundo de Resolução é uma entidade da esfera do Estado.

Em junho, o presidente executivo do Novo Banco, António Ramalho, disse que a instituição vai precisar de mais capital do que o previsto para este ano, face ao impacto da Covid-19, mas sem revelar números.

Essas declarações levaram o Presidente da República a declarar ter ficado “estupefacto” e o ministro das Finanças, João Leão, disse que o Governo, à semelhança de Marcelo Rebelo de Sousa, também ficou “estupefacto”.