A alegada proibição de ensino à distância em escolas internacionais e privadas em Portugal durante este período de interrupção letiva — que o Governo veio agora clarificar vários dias depois da polémica, garantindo que não tivera a intenção de a fazer — começa a ter eco na imprensa britânica.
Esta quarta-feira, o jornal britânico The Times publicou um texto intitulado “Portugal impede aulas remotas em escolas privadas para ajudar os alunos do público”. No artigo é dado destaque à indignação de pais de alunos ingleses que estudam em Portugal e que supostamente poderiam ser impedidos de continuar a ter aulas — agora online — pelo Governo. “É absolutamente chocante”, terá afirmado a mãe de uma aluna da escola St Dominic’s International School, Maja Jotzmuth-Clarke, citada pelo The Times.
De acordo com o jornal que tem sede em Londres, muitos dos estudantes britânicos que frequentam aulas presenciais em escolas internacionais e de língua inglesa, como a St. Dominic’s Internacional School, aprendem de acordo com um projeto educativo e o currículo letivo britânico, tendo professores de língua inglesa como docentes.
Esse será o caso da filha de Maja Jotzmuth-Clarke e Gary Clarke, dois dos pais ouvidos pelo The Times. O casal garante que a filha está a estudar para os exames GCSE — uma ferramenta de avaliação do sistema curricular britânico prevista para alunos do ensino secundário, habitualmente com 16 anos — e temiam que ficasse impedida de aprender durante duas semanas, devido à alegada proibição do ensino à distância. “Dizem que não podem aprender nada de novo. Isto é simplesmente brincar por completo com a educação das crianças”, queixava-se a mãe, notando que a escola tinha capacidade para continuar a dar aulas em regime online mas não lhe fora permitido.
Nos colégios “haverá de tudo um pouco”. Há os que fecham e os que mantêm aulas à distância
Sarah Hosford é outra das mães britânicas com filhos a estudar em Portugal — nesta caso, duas filhas — que se queixa da situação ao jornal The Times. A escola internacional frequentada pelas suas duas filhas “montou um sistema de ensino online brilhante, garantindo às crianças que tudo estava preparado, mas de repente apareceu a regra que” supostamente a proibiria.
Ficámos todos muito chocados porque estamos a seguir um sistema educativo [programa curricular] completamente diferente do português… a ideia de deixar toda a gente em desvantagem ser a solução para o problema de alguns alunos, poucos, não terem computador é uma loucura”, critica Sarah Hosford.
No artigo do The Times, a mãe de uma aluna da St. Dominic’s International School menciona ainda o episódio de uma intervenção policial na escola privada de Cascais. A PSP foi chamada a intervir por haver alunos a fazer presencialmente um exame de décimo ano do plano curricular britânico. “Eram apenas cerca de 20 alunos socialmente distanciados num pavilhão desportivo enorme”, queixa-se a mãe. Na verdade, tratar-se-iam de 43 estudantes. A instituição defendeu-se na altura, garantindo estar a cumprir a lei.
A alegada proibição do ensino online foi alvo de fortes críticas por parte de vários quadrantes políticos, da oposição ao Governo — Rui Rio foi muito crítico da medida, considerando-a “totalitária” e “de perfil marxista” — ao próprio Presidente da República, que defendeu a possibilidade de ensino remoto quando possível. O próprio Governo acabou por, já esta quarta-feira, garantir que não seguiria por essa via.
Vários especialistas questionaram até a constitucionalidade de uma proibição do ensino à distância. E muitos responsáveis políticos imputaram ao Governo impreparação na dotação dos alunos de equipamento (nomeadamente computadores) que lhes permitisse poder continuar a ter aulas à distância. O ensino à distância e pela ‘telescola’, recorde-se, foi a opção encontrada pelo Governo para garantir a continuação das aulas durante os meses de primeiro confinamento.
A proibição de aulas digitais no ensino privado é uma medida totalitária de perfil marxista. Ela nada tem a ver com a defesa do interesse público, muito menos com a defesa da saúde pública. É a esquerda no seu pior.
— Rui Rio (@RuiRioPT) January 22, 2021
Quando anunciou o encerramento das escolas e o fim das aulas presenciais como medida para travar a propagação da pandemia da Covid-19, o Governo decretou que os 15 dias de paragem letiva presencial funcionariam como antecipação de férias — as do Carnaval ficavam sem efeito e as férias da Páscoa reduziam-se.
A justificação do executivo de António Costa para sinalizar a suspensão de aulas (não enunciando logo exceção alguma para as atividades letivas online) em escolas privadas e internacionais passaria pela desigualdade que acentuaria entre alunos, prejudicando estudantes que estivessem impossibilitados (pelos meios disponíveis em casa) de aprender a partir das suas habitações.