O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, escreveu um artigo de opinião para a edição desta segunda-feira do jornal britânico The Guardian em que denuncia uma “pandemia de abusos dos direitos humanos” que foi exposta pela pandemia da Covid-19 — e alerta para os riscos da difusão descontrolada do vírus nos países mais pobres.
“A maior crise internacional em várias gerações rapidamente se transformou numa crise económica e social”, escreveu Guterres. “Um ano depois, um outro duro facto é tragicamente evidente: o nosso mundo está a enfrentar uma pandemia de abusos dos direitos humanos.”
“A Covid-19 aprofundou divisões, vulnerabilidades e desigualdades pré-existentes, e abriu novas fraturas, incluindo novas linhas de falha nos direitos humanos. A pandemia revelou a interligação da nossa família humana — e do espectro completo dos direitos humanos: civis, culturais, económicos, políticos e sociais. Quando um destes direitos está sob ataque, outros estão em risco”, diz o secretário-geral da ONU.
Guterres não tem dúvidas de que “o vírus prosperou porque a pobreza, a discriminação, a destruição do nosso ambiente natural e outras falhas nos direitos humanos criaram enormes fragilidades nas nossas sociedades”.
O ex-primeiro-ministro português sublinha os problemas da discriminação, sobretudo de mulheres e de minorias étnicas, que em muitos países compõem a maioria dos trabalhadores de primeira linha, e também a intensificação dos episódios de violência doméstica, violência contra mulheres e tráfico sexual.
“A pobreza extrema está a aumentar pela primeira vez em décadas. Os mais novos estão em dificuldades, fora da escola e muitas vezes com acesso limitado à tecnologia”, remata Guterres.
No mesmo artigo de opinião, o secretário-geral das Nações Unidos insurge-se contra o “mais recente ultraje moral” associado à pandemia.
“O falhanço em assegurar a equidade nos esforços de vacinação. Apenas 10 países já administraram 75% de todas as vacinas contra a Covid-19. Entretanto, mais de 130 países ainda não receberam uma única dose”, diz Guterres.
“Se permitimos que o vírus se espalhe como um incêndio descontrolado em partes do Sul Global, vai sofrer mutações uma e outra vez. Novas variantes podem tornar-se mais transmissíveis, mais mortíferas e potencialmente ameaçar a eficácia das vacinas e dos diagnósticos atuais”, alerta.
“Isto pode prolongar a pandemia significativamente, permitindo ao vírus regressar ao Norte Global — e atrasar a recuperação económica do mundo.”