O candidato está escolhido e anunciado, mas a guerra local no PS/Braga — com implicações para o PS a nível nacional — está bem longe de terminar. Com Hugo Pires, deputado eleito por Braga e membro da direção do partido, oficializado como candidato e já em campanha no terreno, o PS local “repudia” a forma como o processo decorreu e acusa mesmo a direção nacional de “prepotência”, “arrogância” e incumprimento dos estatutos.

Se já na elaboração das listas de deputados, que acabaram por ser avocadas pela direção nacional, o conflito entre a estrutura de Braga e a direção do partido não foi disfarçado, desta vez a guerra volta a ser aberta. A polémica tem a ver com o processo de escolha de Hugo Pires: com quatro nomes disponíveis, ou pelo menos ponderados, para avançar, o PS encomendou uma sondagem que media as reais hipóteses de cada um nas urnas (Hugo Pires, que tinha manifestado essa vontade e que a direção incluiu no lote; Palmira Maciel, deputada e indicada pelo presidente da federação de Braga, Joaquim Barreto; Artur Feio; e a vereadora Liliana Pereira, ambos indicados pela concelhia).

Foi precisamente com base nos resultados dessa sondagem que a direção acabou por comunicar à concelhia, que teria concordado em usar o estudo de opinião para definir o candidato, que caberia a Hugo Pires a tarefa de tentar ‘roubar’ a capital de distrito o PSD. O problema é que a concelhia, que se reuniu duas vezes antes de reagir à decisão, alega agora que a direção não só “incumpriu os estatutos” como “amesquinhou” os órgãos locais, que dizem sentir “repulsa” pela forma como o processo decorreu.

Na carta dirigida a José Luís Carneiro, secretário-geral adjunto do PS, e Maria da Luz Rosinha, secretária nacional para as autarquias, que já tinha merecido o destaque da Agência Lusa, a concelhia diz-se “obrigada” a aceitar a decisão, por uma questão de “disciplina partidária”, mas não é por isso que poupa nas críticas a uma decisão que considera “unilateral e prepotente”.

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A discordância tem, desde logo, a ver com o uso da sondagem como critério absoluto: “A mesma foi apresentada como mais um instrumento de trabalho e nunca como a peça que determinaria uma decisão, como agora pretendem fazer crer”, argumenta a missiva, segundo confirmou Observador.

Por isso, e lembrando que os estatutos do partido determinam que o processo autárquico deve ser assegurado e desencadeado pelos órgãos locais (embora a direção nacional tenha a última palavra), a carta remata assegurando que deste “nebuloso processo” se conclui que a direção quis desde o início decidir sobre Braga, “avocando” a decisão sobre o candidato.

Nas hostes bracarenses corre outro argumento: a referida sondagem, feita em janeiro, indica que Hugo Pires seria, para 10,3% dos inquiridos, o vencedor das eleições, sendo o candidato do PS mais bem colocado; por outro lado, a deputada Palmira Maciel vence, por pouca margem (7,8% contra 6,8%) quando a pergunta é sobre o candidato “preferido” dos inquiridos.

Mas mais preocupante para qualquer um dos lados será a conclusão do estudo que aponta para que mais de 80% dos inquiridos não prefere nem votaria em nenhuma das hipóteses avançadas pelos socialistas, o que lhes mina as hipóteses de conquistarem a câmara à coligação que o social-democrata Ricardo Rio vai encabeçar.

Pires mandou newsletter, concelhia não gostou

Os resultados positivos para Hugo Pires, que incluem também o facto de ser o candidato a candidato com maior notoriedade, e o facto de a concelhia ter aceitado indicar nomes para a sondagem são os argumentos a favor da candidatura de Pires, que já está na ‘rua’ e nos e-mails dos militantes.

A candidatura está a colocar cartazes em Braga e esta semana já enviou uma newsletter em que Hugo Pires se apresenta como candidato, semanas depois de ter dirigido um convite a Artur Feio para integrar as suas listas, frisando que seria preciso avançar agora trabalhar para um consenso.

Ora, segundo as informações apuradas pelo Observador junto de fontes locais, a concelhia não levou a bem que, com mais uma reunião com a direção marcada para a próxima semana, a newsletter que oficializa o candidato já tivesse seguido para as caixas de e-mail dos militantes.

O referido e-mail faz precisamente menção a este conflito, argumentando que “conhecer o partido é saber que ninguém faz nada sozinho”. Depois, Pires é ainda mais claro: “É neste contexto que vos quero dizer quanto desejo que pessoas de quem andei mais distante nos últimos tempos, com quem tive até divergências, sintam que este caminho não se faz sem elas, que juntos podemos desenvolver um projeto válido e agregador, que resulte vencedor no tempo certo”.

Para já, a tentativa de enterrar o machado de guerra é recebida com ceticismo por parte das estruturas locais. Resta saber se a reunião com a direção servirá para acabar com o desentendimento. Com uma nuance relevante: há muito que as interpretações sobre os atritos de Braga ganham leituras sobre confrontos nacionais, desde logo porque o candidato que a direção escolheu, Hugo Pires, é dado como próximo da líder parlamentar, Ana Catarina Mendes, enquanto o presidente da concelhia, Artur Feio, é mais próximo do ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos. Ou seja, dois nomes com ligações a duas das figuras mais faladas para uma futura sucessão de António Costa à frente do PS.