Uma semana depois de os talibãs terem capturado a capital do Afeganistão, Cabul, o Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, continua sob fogo, dentro e fora de portas, pelo modo como tem gerido e continua a gerir a retirada militar norte-americana do Afeganistão.
Dentro dos EUA, o antigo Presidente Donald Trump considerou no sábado que o modo como Biden operacionalizou a retirada das tropas americanas do Afeganistão foi “a maior humilhação em política externa” da história dos Estados Unidos.
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Num comício com apoiantes em Cullman, no estado norte-americano do Alabama, Donald Trump não hesitou em culpar Joe Biden e a sua estratégia para retirar as tropas do Afeganistão pela queda do país nas mãos dos talibãs — embora tenha sido o próprio Trump a negociar com os talibãs, entre 2018 e 2020, um acordo de paz com vista à saída dos EUA do Afeganistão.
“O fiasco da saída de Biden do Afeganistão é a exibição mais inacreditável de sempre da incompetência grosseira de um líder de um país”, disse Donald Trump. “Isto não foi uma retirada. Isto foi uma rendição total“, atirou o ex-presidente, dizendo que Biden não seguiu os planos traçados pela sua administração para a saída do Afeganistão.
“Poderíamos ter saído com honra. Deveríamos ter saído com honra. Em vez disso, saímos com o exato oposto de honra”, considerou Trump.
Os Estados Unidos invadiram o Afeganistão em 2001, na sequência dos atentados de 11 de setembro contra as Torres Gémeas, em Nova Iorque. Na altura, o líder do grupo terrorista Al-Qaeda, Osama bin Laden, principal autor do atentado, havia encontrado refúgio no Afeganistão, à época liderado pelos talibãs (que ali mantiveram um regime fundamentalista islâmico entre 1996 e 2001).
As forças norte-americanas derrubaram o regime dos talibãs e impuseram no país um sistema político democrático de inspiração ocidental — e mantiveram-se no Afeganistão durante duas décadas. Porém, há vários anos que a saída dos militares americanos do Afeganistão — a mais longa guerra dos EUA — tem sido um desejo de sucessivos presidentes.
Desde 2018, os Estados Unidos mantiveram negociações diretas com os talibãs, que nas últimas décadas tiveram o seu gabinete político sediado em Doha, no Catar, com vista a promover um processo de paz interna no Afeganistão e a acelerar a retirada dos EUA do país. O acordo de paz foi alcançado em fevereiro de 2020. No final de 2020, Joe Biden foi eleito Presidente e, em abril deste ano, prometeu que a saída dos militares norte-americanos estaria concluída antes do vigésimo aniversário do 11 de Setembro.
Em poucos meses, os talibãs aproveitaram o recuo das forças norte-americanas para assumir o controlo quase total do Afeganistão. No último domingo, o movimento fundamentalista invadiu Cabul, a capital do país, e o Presidente afegão, Ashraf Ghani, fugiu do território — deixando os talibãs como governantes de facto do Afeganistão. O movimento prometeu apresentar em breve um novo governo que garante ser inclusivo e plural — e tem dado sinais de uma maior moderação, em comparação com o regime de 1996-2001, com o objetivo de obter o reconhecimento da legitimidade da sua governação no plano global.
Ao longo da última semana, os EUA e vários países aliados da NATO têm levado a cabo uma complexa operação de evacuação, a fim de retirarem de Cabul os cidadãos norte-americanos e dos países aliados, bem como os afegãos que trabalharam ao lado das forças ocidentais durante os últimos anos e que, por isso, poderão estar na mira dos talibãs.
Contudo, também neste processo os Estados Unidos estão a ser criticados internacionalmente.
Segundo fontes da União Europeia ouvidas pelo jornal espanhol El País, os militares norte-americanos estão a ser “o principal obstáculo para aceder às instalações do aeroporto“. “Para os EUA, a saída de afegãos não é uma prioridade, e as forças que foram mobilizadas são tropas de combate sem qualquer experiência em verificação de documentos ou em filtrar as pessoas que têm direito a partir”, dizem as mesmas fontes.
Recentemente, Joe Biden assegurou que tudo fará para retirar os cidadãos norte-americanos e os afegãos que necessitem de asilo de Cabul. Este domingo, a Casa Branca anunciou que Joe Biden vai falar publicamente sobre o Afeganistão às 20h, hora de Lisboa.
Este sábado, ameaças de possíveis ataques terroristas levados a cabo pelo Estado Islâmico — grupo fundamentalista islâmico rival dos talibãs — junto ao aeroporto de Cabul levaram a embaixada dos EUA a aconselhar os norte-americanos a não se aproximarem do aeroporto.