Os apoiantes de Paulo Rangel vão mesmo avançar com um pedido para um Conselho Nacional Extraordinário e assim tentar forçar a antecipação do próximo Congresso social-democrata. O objetivo é garantir que, em caso de eleições antecipadas, cenário que parece cada vez mais inevitável, o próximo líder do partido estará perfeitamente legitimado para ir a votos.
De resto, Rangel já tinha assumido publicamente que estaria disponível para acelerar o processo eleitoral e antecipar o Congresso do PSD, agendado para a segunda quinzena de janeiro — só depois de entronizado na reunião magna do partido é que qualquer líder do PSD está formalmente em funções.
O passo em frente foi dado pelos conselheiros que apoiam Rangel: de acordo com a informação avançada inicialmente pela TVI24, e confirmada entretanto pelo Observador, já circula um requerimento para organizar um Conselho Nacional Extraordinário no prazo de cinco dias e assim levar à votação a antecipação do Congresso, originalmente agendado para 14, 15 e 16 de janeiro.
“A preparação e prontidão do PSD para as eventuais eleições legislativas antecipadas beneficiaria com a realização do Congresso Nacional do PSD em período mais próximo das eleições diretas e ainda no mês de dezembro de 2021”, argumenta o texto do requerimento.
Para que o Conselho Nacional Extraordinário aconteça, serão necessárias as assinaturas de um quinto dos conselheiros, o que, atendendo ao número de apoiantes de Rangel e à aparente disponibilidade da direção de Rui Rio para acolher o pedido, a hipótese é mais do que provável.
A questão do calendário tem sido um dos grandes braços de ferro entre Rui Rio e Paulo Rangel. O líder do PSD defendeu o adiamento das eleições internas para precaver um eventual chumbo do Orçamento do Estado — chumbo que deve mesmo a confirmar-se. Rangel sempre desvalorizou a hipótese mas, com o precipitar da crise política, acabou por reforçar a convicção de que o Congresso pode e deve ser antecipado.
Em teoria, num eventual cenário de vitória de Rangel e tendo o partido de apresentar listas de deputados à Assembleia da República cerca de 40 dias antes das eleições legislativas (que Marcelo Rebelo de Sousa defendeu publicamente que fossem logo que possível), o PSD poderia ficar numa situação esdrúxula: ser outro que não o vencedor das eleições internas do partido a preparar todo o processo eleitoral e a escolher os respetivos candidatos.
Colocava-se, então, a bola no campo de Marcelo Rebelo de Sousa: podia ou não o Presidente da República adiar as próximas eleições legislativas para uma data em que os dois partidos à direita (PSD e CDS, ambos a braços com eleições internas) estivessem reorganizados? Publicamente, Marcelo tem dito exatamente o contrário: as eleições têm de acontecer o mais rapidamente possível, eventualmente a 16 de janeiro.
Ora, a decisão de tentar forçar a antecipação do Congresso do PSD surge depois de Paulo Rangel ter sido recebido por Marcelo Rebelo de Sousa, em Belém. E, de acordo com o Expresso, o Presidente da República terá lembrado ao eurodeputado que, no passado, a reunião magna do PSD já foi antecipada em 15 dias — dando assim respaldo à intenção dos apoiantes de Rangel.
Depois da conversa com Marcelo, as coisas precipitaram-se nesse sentido: Rangel, que tinha defendido a antecipação do Congresso como hipótese meramente académica, vai mesmo propô-la ao partido. Resta saber se houve ou não uma relação de casualidade entre a posição assumida pelo Presidente da República e a decisão dos apoiantes do eurodeputado.
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Rio irritado com Marcelo
Quem não gostou do encontro entre Rangel e Marcelo em Belém foi Rui Rio. Esta manhã, no Parlamento, o líder do PSD disse que não era “minimamente aceitável que o chefe de Estado” pudesse “combinar” datas de eleições de partidos com eventuais candidatos.
“Acho muito estranho que o Presidente da República receba um putativo candidato à liderança de um partido. Se ainda por cima o que foram tratar é a data das legislativas e as diretas do PSD”, afirmou Rui Rio.
O líder social-democrata — que vai defender a realização de eleições legislativas o quanto antes, a 9 ou a 16 de janeiro — sempre argumentou que o país não poderia esperar pela clarificação interna do PSD para ir a votos — daí ter tentado adiar as diretas no partido, intenção que o Conselho Nacional do partido chumbou.
Esta manhã, Rio reiterou-o: “Significa que vamos condicionar o país às diretas do PSD, quando ainda por cima o presidente do PSD, que sou eu, explicou ao Conselho Nacional que isto podia acontecer. Na marcação de eleições legislativas antecipadas o que comanda o meu pensamento e ação é o que é melhor para o país e não para o PSD. Que isto fique claro e quem não gostar que vote contra nas diretas do PSD.”
Já no final do dia de terça-feira, Rui Rio tinha sido surpreendido pelos jornalistas com a informação, divulgada oficialmente pela Presidência da República, de que Rangel tinha sido recebido por Marcelo em Belém.
Sem esconder o incómodo com o sucedido, Rio falou ainda da igualmente assumida tentativa de Marcelo de interferir na votação do Orçamento do Estado. “Se fez [diligências] junto de partidos acho que é legítimo, se fez avulsamente já não me parece a forma mais ortodoxa de agir, mas não posso falar de uma coisa que desconheço”, atirou Rio.