É cada vez mais real o risco do regresso aos confrontos na Bósnia-Herzegovina. O cenário passa de hipótese a ‘vermelho’ com uma perspetiva “muito real”. E o Alto Representante das Nações Unidas para a Bósnia-Herzegovina, o alemão Christian Schmidt, deixa claro num relatório enviado à ONU que se os separatistas sérvios cumprirem a ameaça de recuperar o exército próprio, dividindo as atuais forças armadas do país em duas, será necessário reforçar a presença das forças armadas internacionais para conseguir manter a paz no território.

No primeiro relatório que realizou, depois de ter assumido o cargo em agosto, Schmidt alertava que a Bósnia estava a enfrentar “a maior ameaça existencial do pós-guerra”. Milorad Dodik, o líder sérvio da presidência tripartida da Bósnia, ameaça desfazer instituições chave do Estado. O cenário inclui desmantelar o exército nacional que tem sido formado ao longo dos últimos 25 anos com apoio internacional, em outubro Dodik já fez saber que caso o ocidente tentasse intervir militarmente tem “amigos” que já prometeram apoiar a causa sérvia naquilo que foi entendido pela comunidade internacional como uma referência à Rússia.

Também em outubro, a polícia sérvia da Bósnia realizou exercícios de contraterrorismo no Monte Jahorina, o mesmo local usado pelas forças sérvias durante o cerco de 1992-1995 para bombardear Sarajevo.

“Isto é o equivalente à secessão, mas sem a proclamar”, escreve agora Schmidt no relatório que entregou na sexta-feira ao secretário-geral da ONU, António Guterres. Alertando que as ações de Dodik “colocam em risco não só a paz e estabilidade do país e da região, mas — caso não tenham qualquer resposta da comunidade internacional — podem levar mesmo à anulação do acordo [Dayton 1995]”.

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Schmidt assume ainda a hipótese de confrontos entre as forças bósnias e a polícia sérvia. “Se as forças armadas da Bósnia-Herzegovina se dividir em dois ou mais exércitos, o nível de presença militar internacional precisará de ser reavaliado”, refere o Alto Comissário das Nações Unidas no relatório acrescentando que “as perspetivas de mais divisão e conflito são muito reais”.

Nomeação de Schmidt sobre críticas russas desde o primeiro momento

Há atualmente cerca de 700 homens na Bósnia-Herzegovnia responsáveis por assegurar a manutenção da paz no território, com a NATO a ter sede em Sarajevo. Caberá ao conselho de segurança da ONU renovar esta semana o mandato anual de ambas as forças, mas a Rússia já fez saber que exige a eliminação de qualquer referência ao Alto Representante.

Desde a nomeação que a escolha de Schmidt gerou mal-estar junto dos russos. Logo em maio, aquando da escolha, o representante da Rússia emitiu um comunicado oficial do Gabinete do Alto Representante afirmando que a nomeação do alemão foi uma violação da prática estabelecida de eleger o Alto Representante na Bósnia-Herzegovina por consenso.

“Nenhum candidato sem a aprovação do Conselho de Segurança da ONU terá a necessária legitimidade jurídica internacional e não poderá ser considerado um Alto Representante nos termos do Acordo de Paz de Dayton”, escrevia à data o representante russo.