Quase três anos depois da decisão de primeira instância, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu manter a pena de prisão efetiva de seis anos e oito meses ao procurador do Ministério Público Orlando Figueira, de acordo com o respetivo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa a que Observador teve acesso.

Figueira tinha sido condenado em primeira instância a cadeia efetiva por corrupção passiva, branqueamento de capitais, violação do segredo de justiça e falsificação de documento e cinco anos de proibição de exercer funções.

Também o advogado Paulo Blanco foi condenado, mas a uma pena suspensa de quatro anos e quatro meses por corrupção ativa, branqueamento de capitais, violação do segredo de justiça e falsificação de documento naquela que foi chamada a Operação Fizz. Ao advogado, o Tribunal da Relação de Lisboa manteve igualmente a pena decidida pela primeira instância.

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A juíza desembargadora Maria Leonor Silveira Botelho, relatora do acórdão, alterou apenas alguns factos contestados nos recursos dos arguidos Orlando Figueira e Paulo Blanco, mas não tocou medida das penas decididas pela primeira instância.

“Entendemos que tais penas se mostram justas e adequadas às necessidades de prevenção, geral e especial, que no caso se fazem sentir e ao grau de culpa dos arguidos, não padecendo as mesmas de qualquer excesso, sendo, consequentemente, de manter”, lê-se no acórdão que é também assinado pelas desembargadoras Ana Paula Grandvaux Barbosa (adjunta) e Maria da Conceição Alves Gonçalves, presidente da 3.ª Secção Criminal da Relação de Lisboa.

Os arguidos ainda poderão recorrer desta decisão para os tribunais superiores, conseguindo assim a suspensão da execução das penas decretadas.

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O caso demorou mais tempo a ser apreciado pelo tribunal superior porque o magistrado Orlando Figueira decidiu regressar à magistratura já depois de condenado. O magistrado estava em licença sem vencimento quando decorreu o processo e foi julgado em primeira instância, no entanto, voltando ao Ministério Público (embora ainda suspenso de funções) o seu recurso devia ser apreciado pelo Supremo Tribunal de Justiça, a instância que se segue ao Tribunal da Relação onde os magistrados são julgados. O incidente foi levado ao Supremo para decidir o que fazer, mas o recurso acabou por ser apreciado pelo Tribunal da Relação de Lisboa onde foi distribuído em março deste ano.

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Figueira foi condenado por suspeitas de ter recebido mais de 760 mil euros do ex-vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, para o beneficiar nos processos que investigava no Departamento Central de Investigação e Ação Penal. Como recompensa, segundo o Ministério Público, o magistrado ganhou também um lugar de assessor jurídico do Banco Privado Atlântico, em Angola, para onde nunca chegou a ir.

Aliás, foi esse contrato que serviu de argumento a Orlando Figueira para justificar parte do recebimento desses valores. Um contrato promessa que teve a participação do advogado Paulo Blanco, que só não participou no contrato definitivo porque ambos cortaram relações.

Para o Tribunal da Relação, ficou claro que esse contrato promessa de trabalho visava “dar uma aparência de legalidade ao pagamento a Orlando Figueira do montante de 210.000,00 USD, pagamento que foi feito no âmbito do aludido acordo corruptivo e em troca do arquivamento dos inquéritos que visavam Manuel Vicente, a que Orlando Figueira efetivamente procedeu com manifesta violação dos deveres do cargo que desempenhava enquanto magistrado do Ministério Publico”.

O processo-crime de Manuel Vicente foi separado deste e foi enviado para Angola. Armindo Pires, titular de uma procuração para representar Vicente em Portugal, foi absolvido.

O magistrado Orlando Figueira foi condenado a uma pena única efetiva de seis anos e oito meses de cadeia pelos crimes de corrupção passiva, branqueamento, falsificação de documento e violação do segredo de justiça e proibição de voltar à magistratura durante cinco anos. O advogado Paulo Blanco foi considerado corresponsável (embora por corrupção ativa) e condenado a uma pena suspensa única de quatro anos e quatro meses de prisão, sem necessidade de deixar o exercício da profissão.

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Paulo Blanco já reagiu entretanto à decisão via rede social Facebook. “O acórdão hoje publicado julgou incorretamente vários pontos essenciais da matéria de facto e de Direito, o que conduziu a uma inevitável errada aplicação da lei”, considerou, lembrando que em primeira instância o tribunal decidiu não suspendê-lo da profissão, contrariamente ao que pedia o Ministério Público. “O Ministério Público não recorreu, nem da minha absolvição, nem da minha condenação”, lembrou. Recorreu ele a 20 de Fevereiro de 2019, considerando “ilegal a condenação” e insistindo que nem sequer conhece pessoalmente Manuel Vicente.