Duas das entidades que representam o setor do táxi em Portugal vão participar numa manifestação de taxistas europeus, em 8 de setembro, em frente à sede da Comissão Europeia, em Bruxelas, reclamando medidas da instituição após o caso “Uber Files“.
Portugal entre países onde Uber usou violência de taxistas para obter benefícios
Num comunicado esta quinta-feira divulgado, a Federação Portuguesa do Táxi e a Associação Nacional dos Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros (ANTRAL) dão conta de que o objetivo do protesto “é exigir da Comissão Europeia, Parlamento Europeu e parlamentos dos respetivos Estados-membros consequências da promiscuidade agora revelada – com factos – que permitiram a invasão e instalação desta multinacional na Europa“.
Pretende-se conhecer as intenções da Comissão Europeia após a divulgação do caso, exigir inquéritos parlamentares, sanções e compensações, e reivindicar que “seja claramente marcada a diferença entre o serviço de utilidade pública do táxi e as ofertas da iniciativa privada”.
Do manifesto fazem ainda parte a exigência da orçamentação para a modernização e descarbonização do serviço de utilidade pública do táxi, e de um travão na liberalização do serviço de utilidade pública do táxi, sobre o qual as associações europeias não foram ouvidas.
“Nós, táxis europeus (serviço de utilidade pública), exigimos que toda a luz seja lançada sobre o escândalo “Uber Files”. A ex-comissária da Concorrência e Vice-presidente da Comissão Europeia está seriamente implicada. Pesadas suspeitas de tráfico de influência e conflito de interesses pesam sobre os ombros desta antiga alta funcionária que agora trabalha para a empresa americana Uber”, pode ler-se no documento.
A empresa norte-americana Uber concebeu uma estratégia de expansão que recorreu a lóbi político junto de governos, mas também formas ilícitas para ludibriar autoridades, revelou um trabalho do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI) divulgado em 10 de julho passado.
Os taxistas solicitam agora reuniões com a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, com a comissária da Concorrência, Margrethe Vestager, com o comissário para o Emprego e Direitos Sociais, Nicolas Schmi, e com a comissária para os Transportes, Adina Valean.
“O objetivo principal da nossa manifestação de 8 de setembro é garantir que o escândalo “Uber Files” não seja enterrado. É importante que as personalidades em questão, o denunciante Mark Macgann, bem como os jornalistas da CIJI, sejam ouvidos. Queremos saber quais são as intenções da Comissão Europeia e que seguimento pretende dar às revelações do CIJI”, refere a nota.
Os profissionais exigem também o cancelamento de uma recomendação europeia (2022/C62/01) que, entre outros, promove a desregulamentação do serviço público de táxi para uma maior liberalização, salientando que “nenhuma organização nacional de motoristas de táxi solicitou essa mudança”.
“A recomendação parece-nos inspirada no “Lobby MOVE EU” (constituído pela Uber, FreeNow, Bolt) que força a liberalização, para conforto das multinacionais. Exigimos que seja claramente assinalada a distinção entre o serviço público de táxi e outras ofertas remuneradas de transporte de passageiros“, escrevem.
Entre as associações presentes no dia 8 vão estar a Asociación Nacional del Táxi e o Sindicat Del Taxi de Catalunya (Espanha), e a Team Táxi, a La CGT Táxis, a Federação Nationale du Táxi, a Union Nationale des Táxis, a Fédération Nationale des Taxis Indépendant e a Nouveaux Taxis Parisiens (França).
Participam igualmente a Unite The Union (Inglaterra e Irlanda), a United Cabbies Group (Inglaterra), a Union Nationale Taxis Suisse (Suíça), a Unione di Rappresentanza Italiana dei Tassisti (Itália), e a Elite Taxi e a Brussels Taxi Fed (Bélgica).
A investigação “Uber Files” envolveu 40 meios de comunicação em 29 países (Portugal não está nesta lista de “media partners”, embora o caso português tenha sido abordado), e analisou mais de 124 mil documentos. Concluiu que, entre 2013 e 2017, o então CEO da plataforma de transporte, Travis Kalanick, deu aval a uma estratégia (inclusive em Portugal) que explorava a violência contra motoristas da Uber para promover a imagem da empresa contra os taxistas e os governos que criavam problemas ao seu negócio.
O plano começou a ser desenhado em 2015, quando os estrategos da empresa norte-americana perceberam que poderiam beneficiar com os atos de violência contra os motoristas, ganhando a simpatia da opinião pública, foi referido.
A investigação citou um dos lobistas da empresa, Christian Samoilovich, numa mensagem enviada a um colega, em março desse ano, em que reconhece que a Uber poderia usar a seu favor a violência contra os motoristas, depois de um conselheiro da Comissão Europeia ter escrito na rede social Facebook que um Uber em que viajara tinha sido atacado por taxistas.