Na manhã da VI Cimeira do Turismo, na Fundação Champalimaud, o primeiro-ministro ouviu de tudo e sobretudo sobre o novo aeroporto — sobre o qual fez uma longa exposição, num estilo quase stand up, sobre todos os momentos dos últimos 15 anos e avisou que qualquer que seja a solução, que a sua maioria tomará mesmo sem acordo, terá “80% de oposição”. Pelo meio anunciou que esta semana o Governo aprovará a metodologia para a decisão e a proposta que trava o poder de veto da localização pelas câmaras.
António Costa atirou à plateia impaciente que “quem esperou 50 anos, espera seguramente mais um”, mas também disse que quer ter a “equipa constituída brevemente” e o trabalho entregue “rapidamente”. Por parte do Governo, afirmou que o Conselho de Ministros desta quinta-feira vai aprovar a metodologia que foi avançada na última sexta-feira, depois de fechado o acordo com o PSD, e também a proposta que altera as competências dos municípios, limitando o seu poder de veto a aeródromos das classes I, II e III. Os de classe IV, onde se enquadram aeroportos, ficam de fora. “Os municípios têm de ser tidos em conta, mas não podem condicionar a decisão”, detalhou o primeiro-ministro.
Quanto à escolha do coordenador da Avaliação Ambiental Estratégica, de que falou na sexta-feira, Costa diz agora que será proposto de forma conjunta pelo presidente do Conselho Superior de Obras Públicas, Carlos Mineiro Aires, o presidente do Conselho de Reitores das Universidades portuguesas, António de Sousa Pereira, e pelo presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável, Filipe Duarte Santos. A escolha terá de ser avalizada pelo primeiro-ministro, a quem cabe a nomeação.
Será este coordenador que vai escolher, por sua vez, os coordenadores das das seis áreas temáticas que vão ser definidas por um “painel de peritos designado pelo Conselho de Reitores”, explicou o primeiro-ministro. Estas entidades terão “orçamento e competências para contratar os serviços que entenderem” para a execução do trabalho que têm de entregar até ao final de 2023.
“Se não houver acordo é a vida. Quem tem maioria, tem de usar a maioria”
Nessa altura, e depois da discussão pública, o Governo terá condições para tomar a decisão sobre a localização do novo aeroporto. Haverá acordo? À pergunta que o primeiro-ministro coloca, responde o próprio: “Não posso responder pelo líder da oposição. Mas há uma coisa que tenho a certeza, o facto de ter sido possível entender-nos sobre a metodologia é o primeiro passo para podermos ter um acordo sobre a decisão final”. Quanto ao Governo, aí Costa responde: “Q”, rematou sobre o assunto respondendo a um apelo da Confederaçãod o Turismo (ver mais abaixo).
Ao presidente do PSD, Luís Montenegro, o primeiro-ministro elogiou, no entanto, não só a “discrição” como decorreram as reuniões que resultaram no acordo anunciado sexta-feira, como também a “vontade efetiva” de procurar o acordo: “Sei que ambos desejamos chegar a acordo”.
Costa fala na “janela de oportunidade” para decisão: dois anos de estabilidade pela frente
Antes de chegar aqui, o primeiro-ministro tinha tido o seu momento stand up, numa descrição detalhada dos últimos 15 anos (desde que foi eleito presidente da Câmara de Lisboa) de avanços e recuos sobre o novo aeroporto de Lisboa. Desde a “Ota, se não fosse a Ota não haveria aeroporto” a “Alcochete é que era, vamos todos para Alcochete”.
Desde a solução Alcochete ter sido defendida pelos patrões da indústria (a CIP), até à ironia de “BE e PCP passarem a ser grandes defensores da solução defendida pela CIP”, travando uma alteração à lei que dá competências às autarquias para vetarem a construção de um aeroporto no seu território — recorde-se que Moita e do Seixal, ambas da CDU, tinham vetado a construção no Montijo (a solução Portela+1 que vinha do Governo PSD/CDS e que o atual primeiro-ministro tinha seguido, deixando na Câmara de Lisboa “uma estante cheia de estudos” sobre localizações possíveis).
Costa também foi a esse episódio e à sua “ingenuidade reconhecida” ao pensar que ao propor a continuação da proposta do Governo PSD/CDS, “não seria difícil ao PSD aprovar a alteração à lei”, quando o partido era suficiente para essa maioria no Parlamento. “Tal como a realidade às vezes surpreende os pessimistas, às vezes também surpreende os otimistas”, atirou sobre esse capítulo: “Constatei que no PSD também havia dúvidas sobre essa solução [Portela+1].
Tudo isto para chegar ao momento em que o país se encontra “finalmente numa situação que é uma oportunidade de excelência, para podermos ter uma decisão que seja mesmo irreversível: temos um Governo que tem uma maioria na Assembleia da República que durará até outubro de 2026, os mandatos autárquicos completaram ontem o seu primeiro ano e temos um novo líder da oposição que iniciou funções para dois anos”.
Neste encontro de pessimistas e otimistas verificou-se a coincidência feliz de dois anos de estabilidade. Temos aqui uma janela de oportunidade única para decidir e bem”.
Mas ao mesmo tempo, Costa não se atravessa por um acordo em 2023 sobre a localização que vier a ser apontada como a mais favorável pela comissão técnica que vai fazer a avaliação ambiental. “Todas as soluções têm vantagens e inconvenientes. Há tantas e é um tema tão apaixonante que nenhuma terá nunca um apoio superior a 20%, ou seja, qualquer uma terá oposição de 80%”, disse Costa.
Do presidente da Câmara de Lisboa já tinha ouvido, entretanto no mesmo palco, um pedido para que a localização seja “de proximidade”, já que este será o aeroporto internacional que serve Lisboa. Isto numa altura em que o primeiro-ministro já admitiu que Santarém será também uma localização a ser estudada.
Setor do Turismo já tinha pedido a Costa: “Tendo maioria absoluta, use-a”.
Logo ao início da manhã, na mesma cimeira, numa mensagem enviada em vídeo, o Presidente da República colocou a “estabilidade política” como um importante factor para a atração desta atividade económica a Portugal. Mas a Confederação do Turismo alertou-o que nem tudo são rosas e que sem o novo aeroporto de Lisboa as consequências para a economia nacional serão pesadas. E pediu a Costa: “Tendo maioria absoluta, use-a”.
O presidente da CTP, Francisco Calheiros, deixou esta manhã três números ao Governo (e não só) que o ouvia sentado na primeira fila do auditório, as três consequências do atraso na decisão do novo aeroporto de Lisboa: menos 7 mil milhões de euros que entram na economia; menos 28 mil empregos; 2 mil milhões de euros de receita fiscal.
É por isso mesmo que Calheiros disse ser “urgente decidir já” e “não perder mais tempo com incertezas e decisões” sobre o novo aeroporto, cuja localização só será definida no final do próximo ano. A Confederação do Turismo não gosta da solução encontrada no acordo entre Governo e PSD e defende que António Costa use a maioria absoluta que conquistou em janeiro deste ano. Aliás, o presidente da CTP disse mesmo que o sector se “congratula com a maioria absoluta” e que com ela Costa “pode decidir a questão do novo aeroporto”. “Não podemos continuar com estudos, novas localizações, novas remodelações, devemos avançar já”.
Na intervenção do Presidente da República não esteve este ponto quente da atualidade política — que por estar em visita à Costa Oeste dos Estados Unidos enviou uma mensagem gravada em vídeo –, mas Marcelo foi a outros.
“Não percebo o especular-se de forma sistemática com cenários de instabilidade. Lá fora o que é admirado por todos em Portugal é a segurança e a estabilidade, que é o que têm aqui, tanto no turismo clássico como para quem quer viver no país”, argumentou Marcelo Rebelo de Sousa.
Marcelo também disse que ainda se lembra quando algumas pessoas falavam em turismo a mais, dizendo discordar sempre da ideia. “Sem o turismo não podíamos ter a recuperação do final do ano passado e já deste ano”, referiu sobre a economia nacional. “O turismo continua a ser um dos motores da economia portuguesa”, disse também.