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O que se sabe
- O primeiro-ministro, António Costa, apresentou esta terça-feira a sua demissão ao Presidente da República, na sequência da notícia de que lhe foi instaurado um processo-crime. Marcelo Rebelo de Sousa aceitou a demissão de António Costa — que surge como culminar de uma controvérsia que se desenrolou ao longo de toda a manhã desta terça-feira, depois de terem sido noticiadas um conjunto de buscas em edifícios governamentais, detenções e suspeitas contra membros do Governo.
- O chefe de gabinete de António Costa, Vítor Escária, e o empresário Diogo Lacerda Machado, um dos homens mais próximos do até agora primeiro-ministro, foram esta terça-feira detidos no âmbito de um processo relacionado com os negócios de exploração de lítio e de hidrogénio. A informação foi inicialmente avançada pela SIC Notícias e pelo jornal Público.
Quem é Vítor Escária, o chefe de gabinete de Costa que foi detido
- O processo em causa visa também os ministros João Galamba (Infraestruturas) e Duarte Cordeiro (Ambiente), bem como o ex-ministro do Ambiente João Pedro Matos Fernandes, tendo decorrido buscas em vários locais, incluindo a residência oficial do primeiro-ministro e as casas de diferentes ministros.
- Entre os detidos estão também o presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas, o CEO da Start Campus de Sines, Afonso Salema, e o diretor jurídico e de sustentabilidade da empresa, Rui Oliveira Neves.
- Os detidos vão passar a noite na PSP em Moscavide. Fonte ligada ao processo adiantou ainda ao Observador que os detidos foram encaminhados para o Comando Metropolitano de Lisboa apenas por uma questão de logística, tal como aconteceu no caso Altice. Deverão ser presentes a um juiz de instrução criminal no prazo de 48 horas.
- A PGR confirmou que, além dos detidos, foram também constituídos arguidos o Ministro das Infraestruturas, João Galamba, e do Presidente do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente.
- No total, de acordo com a PGR, foram feitas 17 buscas domiciliárias, cinco buscas em escritório e domicílio de advogado e 20 buscas não domiciliárias. Entre estas últimas incluem-se os “espaços utilizados pelo chefe do gabinete do Primeiro-Ministro”, bem como locais “no Ministério do Ambiente e da Ação Climática, no Ministério das Infraestruturas e na Secretaria de Estado da Energia e Clima”, na câmara de Sines e em outras entidades públicas e empresas.
- Já houve várias confirmações oficiais destas buscas. O Ministério do Ambiente confirmou as buscas nas suas instalações, mas disse não conhecer a razão das buscas. O palácio de São Bento, por seu turno, confirmou as buscas ao gabinete de Vítor Escária. A câmara de Sines também confirmou a realização de diligências policiais.
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- “As diligências foram ordenadas ou autorizadas pelas entidades competentes – Ministério Público e juiz de Instrução Criminal – e estão a ser executadas com o apoio operacional de elementos da Polícia de Segurança Pública (PSP) e da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT). Participam nas buscas 17 magistrados do Ministério Público, três magistrados judiciais, dois representantes da Ordem dos Advogados, cerca de 145 elementos da PSP e nove da AT”, diz a PGR.
- Em causa está um processo em que são investigados os negócios do lítio e do hidrogénio, havendo suspeitas de tráfico de influências e de corrupção envolvendo favorecimentos nos contratos de exploração de lítio e hidrogénio. A PGR já tinha confirmado formalmente a existência deste inquérito em janeiro deste ano. Segundo a SIC Notícias, a investigação está a ser liderada por dois procuradores e foi desenhada no sentido de evitar fugas de informação devido à sensibilidade do caso, envolvendo vários membros do Governo.
- Agora, a PGR já veio confirmar os detalhes do que está em causa. “No âmbito de inquérito dirigido pelo Ministério Público do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), estão a ser realizadas diligências de busca para identificação e apreensão de documentos e outros meios de prova de interesse apara a descoberta da verdade”, lê-se num comunicado.
- Segundo a PGR, estão em causa factos relacionados com: “As concessões de exploração de lítio nas minas do Romano (Montalegre) e do Barroso (Boticas); Um projeto de central de produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, apresentado por consórcio que se candidatou ao estatuto de Projetos Importantes de Interesse Comum Europeu (IPCEI); O projeto de construção de data center desenvolvido na Zona Industrial e Logística de Sines pela sociedade ‘Start Campus’.”
- Concretamente, estão em causa “factos suscetíveis de constituir crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência“.
- A PGR também explicou a razão pela qual foram feitas as detenções. “Em face dos elementos recolhidos na investigação e por se verificarem os perigos de fuga, de continuação de atividade criminosa, de perturbação do inquérito e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, o Ministério Público emitiu mandados de detenção fora de flagrante delito do chefe de gabinete do Primeiro-Ministro, do Presidente da Câmara Municipal de Sines, de dois administradores da sociedade ‘Start Campus’ e de um advogado/consultor contratado por esta sociedade.”
- Ao mesmo tempo, a PGR confirmou a abertura de um inquérito no Supremo Tribunal de Justiça visando o próprio António Costa. “No decurso das investigações surgiu, além do mais, o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos no contexto suprarreferido [processos do lítio e do hidrogénio]. Tais referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, por ser esse o foro competente”, disse a PGR. O Supremo Tribunal de Justiça é a entidade competente para inquéritos visando o primeiro-ministro, que pela lei tem direito a foro especial. Esta foi a principal razão que levou António Costa a apresentar a demissão.
- A Savannah Resources, promotora do projeto de lítio do Barroso, também foi alvo de buscas.
- Na sequência da eclosão da polémica, António Costa e vários membros do Governo cancelaram a sua agenda para esta terça-feira.
- António Costa apresentou a sua demissão do cargo de primeiro-ministro e garantiu que não se recandidataria. “Não me pesa na consciência a prática de qualquer ato ilícito ou censurável”, diz o primeiro-ministro. “A dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com qualquer suspeição sobre a sua integridade, boa conduta e menos ainda a suspeita de prática de ato criminal.”
- Por sua vez, Marcelo Rebelo de Sousa, na sequência do pedido de demissão do primeiro-ministro, que aceitou, decidiu convocar os partidos políticos representados na Assembleia da República para esta quarta-feira e convocará o Conselho de Estado na quinta-feira. “O Presidente da República falará ao País imediatamente a seguir à reunião do Conselho de Estado.”
Quem é Diogo Lacerda Machado, o “melhor amigo” de Costa que foi detido
O que falta saber
- Ainda não há detalhes concretos sobre as suspeitas em causa, designadamente quais as acusações que poderão vir a ser imputadas aos atuais e antigos membros do Governo, ao autarca, ao chefe de gabinete de Costa e aos outros detidos — e ao próprio António Costa.
- Não são ainda conhecidas as medidas de coação que serão aplicadas aos detidos, havendo um limite de 48 horas para que sejam presentes a um juiz de instrução criminal para que isso seja feito.
- Para já, não são conhecidas as intenções de Marcelo Rebelo de Sousa, mas há três cenários possíveis: a convocação de eleições a curto prazo, mas nunca antes de janeiro, já que a lei eleitoral dita uma antecedência mínima de 55 dias para convocar um ato eleitoral; a convocação de eleições, mas só após o Orçamento do Estado estar aprovado; e a não convocação de eleições, com o PS a indicar um novo líder.
- Gera-se a incerteza em relação ao Orçamento para 2024. A demissão de António Costa deixa em risco o Orçamento e, consequentemente, uma série de propostas, nomeadamente a mudança no IRS. Mas também ficam em stand by outros temas, como a venda da TAP.
- Não se sabe ainda se a demissão de Costa representa a saída de secretário-geral do PS e, consequentemente, quais serão os próximos passos do partido. Carlos César, presidente do PS, disse na terça à noite que os socialistas estão prontos para qualquer cenário e que contam com Costa para “servir o país”.