A presidente da Associação das Juízas Portuguesas lamenta que, quase 50 anos após a entrada das mulheres na magistratura, as magistradas de carreira ainda sejam uma minoria no Supremo Tribunal de Justiça.

“Temos 50 anos de mulheres nas magistraturas, mais ou menos. E, ainda assim, temos poucas juízas conselheiras de carreira, o que acho que é ilustrativo de que existem dificuldades para as mulheres fazerem uma carreira profissional como os homens fazem”, disse a juíza Paula Ferreira Pinto.

Em declarações à Lusa a propósito do Dia Internacional das Mulheres, que se assinala na sexta-feira, a magistrada lembrou que as juízas já são a maioria dos magistrados nos tribunais de primeira instância e começam a ser a maioria nos tribunais da Relação.

No Supremo Tribunal de Justiça (STJ), no entanto, as mulheres são apenas 21 dos 64 juízes conselheiros e algumas delas não provêm da carreira judicial, ou seja, são juristas, são académicas, mas não são magistradas de carreira.

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“O que se passa nos tribunais é que as mulheres magistradas acabam por não conseguir chegar tão longe na sua carreira, por regra, por virtude de todas as incumbências sociais que têm, de tarefas extra que sobre si recaem como recaem sobre qualquer outra mulher e que não lhes permitem aprofundar os conhecimentos jurídicos”, afirmou Paula Ferreira Pinto.

Produzir literatura jurídica, fazer mestrados e pós-graduações “são condições que são muito valorizadas no acesso aos tribunais superiores e, portanto, tendo esta sobrecarga de trabalho, as mulheres magistradas têm tido maior dificuldade em ascender aos tribunais superiores”.

Mesmo nos tribunais de primeira instância, sublinhou, existem diferenças remuneratórias, uma vez que aos lugares mais bem remunerados só podem concorrer os magistrados com classificação de mérito, sendo que as mulheres chegaram a ser prejudicadas na sua avaliação por usufruírem de licenças de maternidade.

“Apesar de não haver formalmente uma distinção ou uma discriminação remuneratória, a verdade é que há estes constrangimentos indiretos que acabam por prejudicar, inclusivamente, a progressão remuneratória na carreira“, lamentou.

A magistrada reconheceu que o Conselho Superior de Magistratura está atualmente a demonstrar “muito maior preocupação” com as questões da igualdade de género, para as quais a associação tem alertado desde a sua criação há quatro anos, e defendeu que também há uma mudança cultural entre os magistrados.

“As próprias colegas estão mais interventivas no sentido de reivindicar o exercício dos seus direitos”, já não se intimidam com possíveis repercussões e não se deixam prejudicar, o que também significa que “tem havido uma evolução da mentalidade a todos os níveis”.

Ainda assim, a magistrada sublinhou que o tema da igualdade de género “não é um tema que esteja ultrapassado, antes pelo contrário”.

E avisou: “São conquistas, como os tempos de agora sombriamente nos recordam, que estão legisladas há muito, mas que, na prática, têm sido muito custosamente implementadas. E também são muito facilmente revertidas na prática e, portanto, temos de nos manter alerta”.