Arrisca-se a ser a maior operação da Polícia Judiciária (PJ) durante o ano de 2024 — e o primeiro trimestre ainda não terminou. Suspeitas de fraude com fundos europeus de cerca de 39 milhões de euros levou a PJ a lançar uma mega-operação de buscas e apreensão na Grande Lisboa, no Grande Porto e noutros distritos do país. A operação recebeu o nome “Maestro”.

A CNN Portugal avança o nome do empresário Manuel Serrão como sendo um dos alvos das buscas. O Observador confirmou a informação de que Serrão é um dos principais alvos nesta operação da PJ. As autoridades estão a realizar igualmente buscas judiciais a Júlio Magalhães. O jornalista e Serrão são sócios em duas sociedades que são visadas nos autos e estão a ser alvos de buscas domiciliárias no Porto, sendo que Júlio Magalhães também foi alvo de buscas na sua residência em Lisboa.

Manuel Serrão e Júlio Magalhães são colaboradores do Observador.

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Apesar de o montante sob suspeita ser, para já, de cerca de 38,9 milhões de euros (segundo a própria PJ, em comunicado), os factos que estão sob investigação poderão levar a um acréscimo muito significativo do valor total da alegada fraude com fundos europeus.

Em comunicado, a PJ indica que realizou uma operação para execução de 78 mandados de busca, 31 buscas domiciliárias e 47 não domiciliárias que visaram recolher provas relacionadas com “fortes suspeitas da prática dos crimes de fraude na obtenção de subsídio, fraude fiscal qualificada, branqueamento e abuso de poder e que lesaram os interesses financeiros da União Europeia e do Estado português”. A operação aconteceu nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, assim como na região de Aveiro e na Guarda.

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A PJ acrescenta que em causa estão “esquemas organizados de fraude que beneficiaram um conjunto de pessoas singulares e coletivas”, que lesaram os interesses financeiros da UE e do Estado português, no que toca ao financiamento através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) e da subtração aos impostos devidos.

Para isso, foram criadas “estruturas empresariais complexas, visando a montagem de justificações contratuais, referentes a prestações de serviços e fornecimentos de bens para captação fraudulenta de fundos comunitários no âmbito de, pelo menos, 14 operações aprovadas, na sua maioria, no quadro do Programa Operacional Competitividade e Internacionalização (POCI), executadas desde 2015″.

Através dos 14 projetos cofinanciados pelo FEDER, executados entre 2015 e 2023, “os suspeitos lograram obter, até ao momento, o pagamento de incentivos no valor global de, pelo menos, 38.938.631,46€“, acrescenta a PJ.

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Buscas na sede do COMPETE e funcionários sob suspeita de abuso de poder

Há, ainda, “fortes suspeitas do comprometimento de funcionários de organismos públicos, com violação dos respetivos deveres funcionais e de reserva, a agilização e conformação dos procedimentos relacionados com as candidaturas, pedidos de pagamento e a atividade de gestão de projetos cofinanciados”.

A investigação a cargo da PJ, sob a direção do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, tem como alvo um dos primeiros programas de fundos europeus em Portugal: o COMPETE 2020 – Programa Operacional Temático de Competitividade e Internacionalização que tinha uma dotação de cerca de 4,4 mil milhões de euros para o período entre 2014 e 2020 e que era classificado como o maior programa do Portugal 2020. Com a crise da COVID-19, o COMPETE foi reforçado em mais 1,8 mil milhões de euros até 2022 com fundos do programa NEXT Generation.

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Segundo apurou o Observador, os funcionários do COMPETE 2020 que estão, alegadamente, envolvidos são suspeitos de abuso de poder.

O Observador sabe que os escritórios da sede do COMPETE, localizados na zona da Expo, perto do Campus da Justiça, em Lisboa, estão a ser varridos de alto a baixo por diversas equipas da PJ, acompanhadas por vários procuradores. Segundo apurou o Observador no local, junto da recepcionista, os inspetores da Polícia Judiciária, cerca de 10, chegaram por volta das 9h00 e às 13h15 ainda estavam no interior das instalações.

Como surge o nome da Operação “Maestro”?

O nome da operação da PJ, uma prática comum na principal polícia de investigação criminal nacional, nasce de uma coluna que Manuel Serrão assina no jornal T. Trata-se de uma publicação em papel e digital que tem Serrão, que foi jornalista nos anos 80 em diversas publicações do Porto, como diretor editorial.

Como diretor da publicação, Manuel Serrão é apresentado precisamente como o “Maestro”.

A publicação T é financiada pelo COMPETE 2020 e é propriedade da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal.

Programa COMPETE garante “gestão rigorosa” dos fundos europeus

Entretanto o COMPETE já reagiu, afirmando o seu “compromisso com a gestão rigorosa e transparente” dos fundos públicos.

Em comunicado, citado pela agência de notícias Lusa, confirma que “está a colaborar com procedimentos em curso por parte da Polícia Judiciária”.  A estrutura da administração central do Estado diz desconhecer “os contornos da investigação”, assegurando estar “totalmente disponível para prestar todas as informações e o apoio necessário para o bom andamento da investigação”.

Outros locais de busca relevantes são as sedes sociais das empresas alegadamente beneficiadas e dos domicílios dos respetivos administradores que se situam na Grande Lisboa e no Grande Porto.

Ao que o Observador apurou, os meios operacionais envolvidos levaram vários meses a organizar. A PJ fala em 306 operacionais. Na operação participaram 250 inspetores, 32 peritos da Unidade de Perícia Tecnológica e Informática e 24 peritos da Unidade de Perícia Financeira e Contabilística. Participaram, ainda, as Unidades Nacionais, Diretoria do Norte, Diretoria de Lisboa e Vale do Tejo, Diretoria do Centro, Departamentos de Investigação Criminal de Setúbal, Braga, Guarda e Aveiro, além de Magistrados Judiciais, Magistrados do Ministério Público e Especialistas do NAT da PGR, de acordo com a PJ.

O que é o COMPETE 2020?

Liderado pelo académico Nuno Mangas desde novembro de 2020, a autoridade de gestão do COMPETE 2020 tinha como objetivo reforçar a “capacidade de investimento das empresas portuguesas, estimulando a competitividade da economia, a aposta na inovação, a presença no mercado internacional e a criação de emprego”.

Com a crise pandémica e a respetiva criação do PRR — Plano de Recuperação e Resiliência, o COMPETE 2020 passou a ter mais tarefas de acesso ao novo quadro financeiro plurianual para 2021-2027, de forma a aceder a uma parte dos cerca de 45 mil milhões de euros previstos para Portugal até 2032.

Mais de 1.400 irregularidades nos fundos até 2022 e 3% são suspeitas de fraude

Por exemplo, os fundos europeus que financiaram a campanha da vacinação contra a Covid-19 (além das vacinas propriamente ditas, todas as despesas associadas) saíram do COMPETE 2020 à ordem de 247 milhões de euros, o mesmo acontecendo com a testagem rápida nas escolas (18 milhões de euros) ou os apoios à criação de emprego ou a recuperação de recuperação e consolidação das aprendizagens (cerca de 260 milhões de euros). Isto além da inovação empresarial para a economia circular e a transição climática e energética (cerca de 188 milhões). Todos estes dados foram transmitidos por Nuno Mangas numa entrevista ao Expresso.

Texto atualizado às 11h15 com o comunicado da Polícia Judiciária e mais tarde às 13h38 com a reação do programa COMPETE2020.