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"Big Boys" e o eterno poder da televisão

Este artigo tem mais de 6 meses

Há uma nova geração de argumentistas e atores a dar a volta à comédia social britânica como não se via há duas décadas. Jack Rooke é um deles e a segunda temporada de "Big Boys" chega à FilmIn dia 18.

Big Boys parte da vontade do autor de criar uma ficção inspirada na própria experiência com o trauma enquanto entra para a universidade e tem liberdade para explorar a sexualidade. O resultado é notável
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Big Boys parte da vontade do autor de criar uma ficção inspirada na própria experiência com o trauma enquanto entra para a universidade e tem liberdade para explorar a sexualidade. O resultado é notável

Big Boys parte da vontade do autor de criar uma ficção inspirada na própria experiência com o trauma enquanto entra para a universidade e tem liberdade para explorar a sexualidade. O resultado é notável

Desde que pela primeira vez falámos aqui sobre Big Boys, há pouco mais de um mês, o criador da série — Jack Rooke — ganhou o BAFTA para Melhor Argumento em Comédia por causa da segunda temporada, que agora se estreia na Filmin. É um prémio entre outros que a série tem recebido e, numa altura em que tanta produção televisiva tem o intuito de apanhar ondas de causas, adaptar livros ou gozar com a paciência do espectador, é uma maravilha que algo como Big Boys exista: simples, honesto, emocional, embrulhado numa comédia de fácil trato, inteligente no seu propósito de ser vulgar.

É possível que a era de ouro da televisão tenha terminado. Seja porque os bolsos já não são tão fundos para se arriscar, ou porque de repente tudo é streaming, tudo aumenta os preços, há publicidade metida ao barulho e os assinantes (ou potenciais) eventualmente perdem a cabeça: cancelam tudo, regressam à pirataria ou voltam a sair de casa. Mas é curioso que nesta falência se vejam sinais de uma renovação, é notável que coisas como Baby Reindeer, Such Brave Girls, Tires e este Big Boys existam em paralelo com a televisão que quer vencer por gritar mais alto e querer estar tão parecida com a última fórmula de sucesso. E, por inacreditável que seja, numa altura de tanta oferta, uma série que se passa na década passada em volta de estudantes universitários e respetivos fantasmas é das melhores séries correntes.

Big Boys parte da vontade do autor de criar uma ficção inspirada na própria experiência com o trauma — sobretudo com a morte do pai — enquanto entra para a universidade e tem liberdade para explorar a sexualidade. Jack, o protagonista (interpretado por Dylan LLewellyn), conhece Danny (Jon Pointing), companheiro de casa que entrou muito tarde na universidade; Corinne (Izuka Hoyle), uma estudante ambiciosa que foi rejeitada das melhores universidades; e Yemi (Olisa Odele), um estudante de moda, a primeira pessoa com quem Jack tenta explorar a homossexualidade. Há ainda Peggy (Camille Coduri), a mãe de Jack, Shannon (Harriet Webb), a tia, e uma série de outras personagens secundárias que existem com grande consequência.

[nos bastidores da segunda temporada de “Big Boys”:]

O grande golpe de Big Boys — e isso mexe ainda mais nesta segunda temporada — passa pela forma como engana a audiência em constância sobre o real propósito. Mexe-se como uma série da pós-adolescência, em parte porque acontece na universidade e cada uma das temporadas reporta-se a um ano letivo, rege-se pelos códigos do que acontece naquele espaço, naquele universo (as aulas, as festas, os diferentes estágios do percurso curricular), mas é também um exuberante tratado sobre lidar com as coisas tramadas da vida. Em que idade for, quando for.

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[Já saiu o quinto episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio, aqui o segundo episódio, aqui o terceiro episódio e aqui o quarto episódio]

Na primeira temporada, por exemplo, a narração constante de Jack confunde-nos sobre quem realmente é o centro da série. Se, no início, estamos convencidos que é Jack, pela morte recente do pai, a entrada na universidade e a exploração da sexualidade; mas, a dado momento, a coisa dá a volta, Danny passa a ser a preocupação do espectador. Danny surge no início quase como uma piada, tipo mais velho do que os outros, desajustado e desalinhado com os tempos — por vezes parece que saiu de uma caverna —, até que se descobre que não consegue ter ereções com nenhuma miúda entre as dezenas de engates nas primeiras semanas. Porquê? Antidepressivos. E porque os toma? Vida tramada, abandonado pelos pais, o porto seguro foi a avó que agora está próxima da morte.

Todo o julgamento que se criou em volta de Danny no primeiro episódio é desmoronado. Percebe-se que entrou tarde na universidade porque passou os últimos anos a tomar conta da avó (agora está num lar); que o desajuste existe por não ter tido uma adolescência e pós-adolescência como a dos outros miúdos, privado de uma série de experiências que fazem parte — neste caso — da cultura britânica; e que grande parte da gabarolice vem de uma tremenda insegurança causada pela falta de suporte familiar. Pensamos que Jack Rooke está apenas a contar a uma história pessoal na primeira temporada e, quando menos se espera, há um ato de altruísmo ficcional: Rooke abandona-a para dar a Danny o palco principal.

Big Boys é uma maravilha, duas temporadas, doze episódios, vinte e poucos minutos cada. Sem gorduras e uma carnificina de emoções misturadas com gargalhadas

Às tantas, Danny é acolhido por Jack e Peggy, como se fosse o irmão ou o segundo filho que nunca existiu em casa. É um gesto quase impercetível de tão natural. Por ser assim, tem alguma piada quando Jack, enquanto narrador, lembra algures na segunda temporada que na primeira estava toda a gente a cuidar de Danny e que nesta ele é o apoio de toda a gente.

Ou seja, Big Boys raramente é sobre aquilo que estamos a ver naquele momento. É sempre sobre outra coisa que ainda vai acontecer. E é belíssimo como consegue ser divertido e, em simultâneo, ter tantas coisas certas a dizer sobre o luto, a depressão, a viuvez, a homossexualidade, a doença e o abandono. A segunda temporada refina os instrumentos da primeira e, apesar de cada episódio começa por situar-nos em que mês se está — para contextualizar o ano universitário —, a universidade é apenas o momento em que Jack Rooke se confrontou com estas coisas todas.

O último episódio desta segunda temporada — uma terceira já está confirmada — embrulha alguns fantasmas enquanto uma série de situações caricatas acontecem num hospital. Termina com uma cena emblemática, pujante e, talvez, um dos maiores rebentamentos da quarta parede (aquela que separa a ação dos espectadores): inesperado, brilhante e uma violência emocional. Não se sinta mal se deixar cair a guarda, é daqueles momentos que ainda nos fazem acreditar no poder da televisão e que isto está longe de estar perdido. Big Boys é uma maravilha, duas temporadas, doze episódios, vinte e poucos minutos cada. Sem gorduras e uma carnificina de emoções misturadas com gargalhadas.

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