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Depois de milhares de dispositivos de comunicação do Hezbollah terem sido sabotados e cerca de metade dos seus líderes terem sido assassinados no espaço de duas semanas, o líder supremo do Irão, o ayatollah Ali Khamenei, enviou uma mensagem ao secretário-geral do grupo xiita libanês: a Mossad, agência de informação israelita, tinha-se infiltrado nos círculos iranianos e libaneses e tinha planos para matar Hassan Nasrallah. O líder do movimento xiita libanês preferiu confiar nos seus militantes mais próximos, mas acabou por ser morto num ataque israelita poucos dias depois.

Nas últimas semanas, Khamenei contactou Nasrallah por duas vezes, avisando-o dos planos israelitas, avançou esta quarta-feira a Reuters, citando múltiplas fontes iranianas e libanesas. A primeira vez foi logo a seguir ao ataque israelita que visou os pagers e walkie-talkies do Hezbollah e matou dezenas de pessoas, nos dias 17 e 18 de setembro. O líder do grupo xiita libanês respondeu com um voto de confiança ao seu círculo mais próximo, afirmando que se sentia seguro, relatou um oficial iraniano.

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Dias depois, Khamenei deixou um segundo alerta a Nasrallah: enviou um mensageiro para avisar o Hezbollah presencialmente da dimensão das suspeitas de Teerão. Abbas Nilforoushan, um comandante sénior da Guarda Revolucionária iraniana, chegou a Beirute com avisos e um convite para o secretário geral se refugiar no Irão. Na madrugada de sexta-feira para sábado, Nilforoushan estava no mesmo abrigo que Nasrallah e ambos morreram no ataque das Forças de Defesa de Israel (IDF).

A maior infiltração de sempre da Mossad

Nas suas mensagens, Khamenei partilhou com Nasrallah as suspeitas de que a Mossad se tinha infiltrado no grupo libanês. Os alertas soaram pela primeira vez em julho, depois do assassinato por Telavive de Ismail Haniyeh, líder do Hamas, e Fuad Shukr, um dos comandantes de topo do Hezbollah. À data, as agências de informação do Irão notaram que alguns membros da Guarda Revolucionária estavam a viajar frequentemente para o Líbano e que um deles começara a fazer questões sobre o paradeiro de Nasrallah e os seus abrigos frequentes. Uma investigação foi aberta e todos estes indivíduos foram detidos, relataram fontes iranianas, sem adiantar os seus nomes.

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Em simultâneo, no Líbano — e apesar da confiança de Nasrallah nos seus homens — também foi aberta uma investigação, liderada pelo militante sénior Sheikh Nabil Kaouk. Centenas de membros foram interrogados sobre a sabotagem israelita israelita dos dispositivos de comunicação e outras potenciais interferências de Telavive, confirmaram três fontes libanesas. Muitos foram detidos. Um especialista sediado em Beirute, ouvido pela Reuters, descreveu a dimensão desta operação da Mossad como “a maior infiltração de Israel” desde a fundação do Hezbollah nos anos 80.

Mas no sábado, um dia depois da morte de Nasrallah, um novo ataque das IDF atingiu Beirute: Kaouk e a maior parte dos comandantes envolvidos na investigação foram mortos. No Líbano, o assassinato de Nasrallah expôs a necessidade de continuar a investigação que tinha sido começada por Kaouk, com recurso a inquéritos “mais profundos e compreensivos”, assim como de uma purga dentro do próprio grupo, argumentou uma fonte libanesa.

O medo e a desconfiança governam Teerão

Com todas as informações recolhidas pela Mossad, as IDF procederam à destruição do Hezbollah ao longo de duas semanas. Nestes ataques, que classificam como “precisos”, Israel eliminou metade do conselho de líderes do Hezbollah e os comandantes das suas principais unidades, para além de ter morto mais de 1000 civis, segundo os números do Ministério da Saúde libanês. Desde a morte de Nasrallah, Ali Khamenei está refugiado numa “localização segura”. Agora, o medo e a desconfiança governam Teerão, mencionam uma dezena de fontes diferentes ouvidas pela Reuters. Medo, pela segurança do ayatollah. Desconfiança, porque a possibilidade de a Mossad estar infiltrada continua a existir. “A confiança que fazia tudo funcionar desapareceu”, afirmou à Reuters um outro oficial iraniano.

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Para além da desconfiança dentro dos grupos, o clima repete-se nas relações entre Teerão, o Hezbollah e os restantes grupos aliados. Com a fragilização do Hezbollah, o objetivo israelita de desestabilizar o Eixo da Resistência, liderado pelo Irão, parece estar mais próximo, segundo as fontes da Reuters, que classificam esta como a situação mais complicada para a coordenação entre os diferentes grupos.

A fragilidade do Eixo da Resistência reflete-se principalmente na dificuldade do Hezbollah em substituir todos os líderes e comandantes mortos por Israel. “Nomear um novo secretário-geral pode ser perigoso, caso Israel o assassine logo a seguir. O grupo não pode arriscar mais caos ao nomear alguém só para o ver morto”, considerou um jornalista local da comunidade xiita, Ali al-Amin à Reuters.

Para além da nomeação, ficam igualmente adiadas as cerimónias fúnebres de Nasrallah. “Ninguém pode autorizar um funeral nestas circunstâncias”, confirmou uma fonte do Hezbollah. A opção poderá ser um enterro temporário e um funeral oficial, mais tarde, para “honrar” o líder, adiantaram outras quatro fontes libanesas.