O défice vai ser maior, o agravamento estrutural maior ainda e a economia não vai crescer tanto como o Governo espera. A Comissão Europeia olhou para o esboço do Orçamento do Estado para 2016 e as contas estão longe das do Governo, todas para pior: défice estimado nos 3,4%, economia só cresce 1,6%. Pior só o agravamento do défice estrutural, que dizem subir 1,5 pontos percentuais em 2015 e 2016. Comissário europeu para os Assuntos Económicos já esclareceu que estas previsões não incluem ainda o resultado das negociações com Lisboa, que diz estarem em curso. Opinião só na sexta-feira.

A Comissão Europeia divulgou hoje novas previsões no seu boletim económico de inverno, onde inclui previsões para todos os países da União Europeia, e aqui deixou a sua primeira avaliação ao esboço do Orçamento do Estado para 2016 enviado por Mário Centeno para Bruxelas (sem contar com mais informação depois do Esboço): o resultado está longe das contas que o Governo fez nos principais indicadores e com sérios alertas ao que poderá vir a seguir.

Documentos na íntegra:
European Economic Forecast Winter 2016;
Winter 2016 Economic Forecast: Weathering new challenges;
Portugal: Selected Economic Indicators.

No capítulo do crescimento económico, depois de ver a economia crescer 1,5% do PIB no ano passado, a Comissão Europeia, tomando em conta as medidas de estímulo incluídas no esboço do Orçamento do Estado para 2016, só vê a economia crescer mais uma décima este ano, ou seja, 1,6% do PIB.

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Os indicadores de curto prazo, diz, já indicavam no final do ano passado um abrandamento da recuperação económica. A isto junta-se o impacto no consumo privado da deterioração na confiança dos consumidores e do menor ritmo de criação de emprego na segunda metade do ano passado.

Se é verdade que o aumento do salário mínimo e as medidas expansionistas incluídas nos planos do Governo vão ajudar a manter um crescimento da economia este ano, também o é que para Bruxelas este crescimento não será tão grande como o esperado pelo Governo. A equipa de Mário Centeno espera que o consumo privado se mantenha a crescer 2,6% este ano, tal como aconteceu no ano passado, mas Bruxelas não acredita que passe dos 2%.

Para além do consumo privado não crescer tanto, a Comissão aponta também que o elevado endividamento do setor privado e um cenário menos positivo nos principais parceiros comerciais de Portugal vai limitar o crescimento do investimento. Investimento que deve voltar a recuperar em 2017, mas graças à aplicação de fundos comunitários.

A isto acrescenta-se ainda um cenário em que as exportações devem crescer em linha com o previsto pelo Governo, mas as importações devem crescer mais que as exportações, dando um contributo negativo para as contas externas portuguesas.

A previsão da Comissão Europeia é assim que a economia portuguesa cresça 1,6% este ano, e mais uma décima em 2017, para 1,7%, mas mesmo este ligeiro crescimento face às previsões anteriores tem vários riscos, entre eles o elevado endividamento da economia portuguesa, a incerteza em torno do caminho que o Governo pretende implementar que, dizem, pode aumentar os juros da dívida portuguesa e levar os consumidores a adiar gastos e as empresas a suspender investimentos.

O Governo previa no Esboço que a economia crescesse 2,1% do PIB.

Défice pode chegar aos 3,4%

As contas ao orçamento são ainda mais negativas que as considerações sobre a economia. Segundo Bruxelas, tendo em consideração o Esboço do Orçamento (e mais nenhuma informação depois disso), o défice orçamental deve atingir os 3,4% este ano, quando o Governo previa 2,6%.

Mas não é apenas deste ano que as contas mostram um agravamento. O Executivo comunitário diz que no ano passado o saldo estrutural – que exclui fatores cíclicos e medidas temporárias – já tinha piorado em 0,5 pontos percentuais, para os 1,9% do PIB potencial (Governo estima que tenha ficado nos 1,3%).

A redução do défice que foi feita o ano passado, diz a Comissão, foi baseada exclusivamente em fatores cíclicos, o que explica a inexistência de esforço orçamental, ou neste caso, mesmo um agravamento.

Este ano o caso complica ainda. O agravamento do défice estrutural é o dobro – um ponto percentual – para os 2,9% (previsão do Governo é que baixe para 1,1%) e, se nada for feito, vai piorar ainda mais para 2017, até atingir os 3,5%.

A Comissão sublinha que este agravamento se explica porque todas as medidas de consolidação apresentadas no Esboço do Orçamento têm natureza pró-cíclica e avisa: Portugal tem de tomar mais medidas.

Entre os riscos em torno das projeções para as contas públicas portuguesas, diz Bruxelas, está mais uma vez o cenário económico (como explicado acima), possíveis derrapagens nas contas públicas e ainda “a inexistência de acordo em torno das medidas de consolidação para 2016 e 2017” entre o Governo e a Comissão Europeia na altura em que o Esboço foi entregue a Bruxelas, faz sexta-feira duas semanas.