A PricewaterhouseCoopers (PwC) entrevistou vários ex-gestores da Portugal Telecom e do Banco Espírito Santo (BES) para apurar todas as circunstâncias que rodearam os investimentos realizados em empresas detidas pelo Grupo Espírito Santo (GES), que através do BES era o maior acionista da operadora.

Entre as 15 pessoas ouvidas estão Henrique Granadeiro e Luiz Pacheco de Melo, os dois responsáveis da PT que se demitiram na sequência do investimento de 897 milhões de euros na Rioforte, mas também Zeinal Bava, João Mello Franco (atual presidente da PT SGPS e antigo membro da comissão de auditoria), Rafael Mora, administrador da PT e da Ongoing, Amílcar Morais Pires e Joaquim Goes, dois ex-administradores do BES que estavam representados no conselho de administração da operadora de telecomunicações. Só não conseguiu chegar à fala com o homem que terá dado indicação expressa à PT para investir na Rioforte, apesar de não exercer qualquer cargo na empresa.

“Não foi possível, apesar dos contactos estabelecidos, entrevistar o Dr. Ricardo Salgado”, revelam as conclusões da auditoria divulgadas pela empresa na quinta-feira à noite. O documento sugere que o ex-presidente do BES omitiu informação sobre a situação financeira da Rioforte na reunião em que apresentou a nova holding do GES ao administrador financeiro da PT no início de 2014.

Neste encontro com Luíz Pacheco de Melo, o então presidente do BES detalhou o plano de reestruturação do Grupo Espírito Santo, indicando que os investimentos realizados até então na Espírito Santo International, e que à data ascendiam a 750 milhões de euros, deveriam ser desviados para a Rioforte. A apresentação era omissa sobre a situação financeira da Rioforte, que se degradou substancialmente depois das operações concluídas uma semana antes por via da compra da participação da ESI na Espírito Santo Financial Group (ESFG). De acordo com a PwC, o preço desta transação foi fixado muito acima do valor de mercado, representando 4,34 vezes a capitalização bolsista da ESFG, tendo a Rioforte passado de credora da ESI para devedora de 1,4 mil milhões de euros.

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O nome de Ricardo Salgado é ainda invocado numa reunião realizada no BES a 26 de março entre o chief finance officer da PT, o diretor financeiro Carlos Cruz, e Amílcar Morais Pires, administrador financeiro do BES que serviu para analisar a continuação do investimento da PT na Rioforte. Neste encontro, Morais Pires diz que o presidente do BES lhe terá transmitido que a renovação da aplicação já teria sido combinada com Granadeiro e Zeinal Bava, envolvendo aqui o então presidente da Oi. Pacheco de Mello invoca orientações de Henrique Granadeiro, à data presidente executivo da PT.

Na audição na comissão parlamentar de inquérito, Ricardo Salgado lamentou o que aconteceu à PT, acrescentando que foi a única consequência que não previu quando alertou o Banco de Portugal para os efeitos sistémicos da queda do grupo e do banco. “Foi uma tristeza o que aconteceu na PT. Foi o único elemento que não previ”, afirmou o antigo presidente do BES.

O investimento na Rioforte de 897 milhões de euros foi renovado a 15 e 17 de Abril por três meses, quando já tinha sido aprovado o relatório e contas de 2013 da holding não financeira em que o auditor alertava para o excesso de passivos sobre os ativos correntes na sequência da compra da ESFG, que foi financiada com dívida de curto prazo (foi uma parte desta dívida que a PT refinanciou), avisando, ainda, para a incerteza quanto ao processo em curso de extensão da maturidade dos empréstimos.

Segundo testemunhou na comissão de inquérito ao BES o ex-presidente executivo da Rioforte, este relatório estava disponível quando a PT renovou a aplicação. João Pena Rodrigues garante que a operadora nunca contactou a administração da empresa onde investiu 897 milhões de euros.

Mais do que renovar a operação, o que a auditoria revela é que a PT teve de ir ao mercado levantar dinheiro, aumentando a dívida, para poder cumprir os seus compromissos no aumento de capital da Oi, devido à aplicação feita na Rioforte. Não foi, aliás, a primeira vez. Já em maio de 2013, a empresa, então liderada por Zeinal Bava (que só assumiu a presidência da Oi no mês seguinte), emitiu obrigações no valor de mil milhões de euros, dos quais metade foi usada para subscrever títulos da Espírito Santo International (ESI).

Decisões informais sem evidência de quem as tomou

A PwC assinala as várias restrições e limitações a que foi sujeito o seu trabalho, designadamente ao nível do acesso a documentos e análises que poderão estar na posse de pessoas que já não estão na empresa. Refere informações contraditórias prestadas pelos entrevistados e decisões tomadas de forma informal e sem ser deixada evidência sobre quem tomou determinada decisão ou sobre quem aprovou determinada transação.

Levanta ainda a questão: em que medida é que os dois administradores da PT que também eram do BES, Joaquim Goes e Amílcar Morais Pires, deveriam ter alertado para o risco de solvabilidade da ESI e Rioforte, mas conclui que não foi possível apurar que tivessem conhecimento das dificuldades financeiras dessas entidades.

O que disseram os ex-gestores do BES na comissão de inquérito sobre o investimento da PT na Rioforte

Ricardo Salgado “Foi uma tristeza o que aconteceu na PT. Foi o único elemento que não previ. O BES sempre esteve ao lado da PT para financiar todas as empresas que a PT comprou.”

Amílcar Morais Pires “Nunca tomei uma iniciativa para sugerir investimentos na Rioforte ou na ESI. Do lado do banco, só podia ter sido Ricardo Salgado a dar indicação para a PT realizar o investimento.”

Joaquim Goes “Nunca tive conhecimento direto do investimento da PT no Grupo Espírito Santo. Nunca tive intervenção e o caso nunca foi discutido no conselho de administração.”