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A advogada Leonor Caldeira é especialista em Direitos Humanos e costuma trabalhar em processos relacionados com o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem
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A advogada Leonor Caldeira é especialista em Direitos Humanos e costuma trabalhar em processos relacionados com o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

A advogada Leonor Caldeira é especialista em Direitos Humanos e costuma trabalhar em processos relacionados com o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem

8 perguntas e respostas sobre a queixa de jovens portugueses contra 32 países europeus por inação na luta contra a emergência climática

Quem são os seis jovens portugueses? O que está em causa na queixa apresentada no Tribunal Europeu dos Direito Humanos e quais as consequências de uma possível vitória? O Observador explica tudo.

É um processo que tem dado muito que falar na imprensa europeia desde que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), com sede em Estrasburgo, aceitou em novembro de 2020 apreciar a queixa dos seis jovens portugueses e notificou os 32 Estados-membros do Conselho da Europa da mesma.

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Desde esse momento histórico, seguiu-se a tramitação processual normal no TEDH que culminará com a primeira sessão desta quarta-feira perante o plenário daquele tribunal, onde estarão presentes os 17 juízes que julgarão a causa e os representantes dos queixosos e dos 32 países europeus visados.

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O Observador explica-lhe o caso em 8 perguntas e respostas com a ajuda da advogada Leonor Caldeira, especialista em Direitos Humanos que costuma trabalhar com processos do TEDH e que participou no programa “Justiça Cega” da Rádio Observador dedicado a este tema.

1Quem são os seis jovens portugueses e quando foi apresentada a queixa?

Este é um processo que é conhecido no Tribunal Europeu e dos Direitos do Homem como o caso  “Duarte Agostinho e Outros v. Portugal e 31”. O nome da primeira queixosa é Cláudia Duarte Agostinho, aos quais se juntaram os seus irmão Martim e Mariana, os igualmente irmãos Sofia e André Santos Oliveira e Catarina Santos Mota. Na altura da queixa, a idade dos queixosos variava entre os 8 e os 21 anos.

Os irmãos Duarte Agostinho e Catarina Santos Mota moram no concelho de Pombal, enquanto os irmãos Santos Oliveira residem na zona de Almada.

O nome da primeira queixosa é Cláudia Duarte Agostinho, aos quais se juntaram os seus irmão Martim e Mariana, os igualmente irmãos Sofia e André Santos Oliveira e Catarina Santos Mota. Na altura da queixa, a idade dos queixosos variava entre os 8 e os 21 anos. Os irmãos Duarte Agostinho e Catarina Santos Mota moram no concelho de Pombal, enquanto os irmãos Santos Oliveira residem na zona de Almada.

Os seis jovens apresentaram em setembro de 2020 uma queixa formal no TEDH contra 33 países europeus — daí o título do processo incluir inicialmente Portugal, um dos países visados pela queixa, e mais 32 países. Mas como os jovens acabaram por retirar a queixa contra a Ucrânia, passaram a ser 31 mais Portugal, esclareceu já na manhã desta quarta-feira um assessor de imprensa dos advogados que representam o grupo.

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Dois meses depois, o Tribunal aceitou a queixa e notificou os Estados-membros visados para apresentarem as suas alegações.

Jovens que levam 33 países ao Tribunal Europeu dos Diretos Humanos esperam ganhar, para não ter que voltar

Um pormenor relevante: os queixosos estão a ter o apoio legal da ONG Global Legal Action Network, com sede em Londres, que organizou o financiamento deste processo através de uma campanha de crowdfunding.

2 O que está em causa na queixa apresentada?

Os jovens processaram os 32 países europeus por, no seu entender, os respetivos governos não estarem a fazer tudo o que está ao seu alcance para combaterem de forma eficaz as alterações climatéricas, violando assim os compromissos que assumiram com os Acordos de Paris.

Tecnicamente, os seis jovens têm de alegar que a Convenção Europeia dos Direitos Humanos não está a ser respeitada pelos países que a subscreveram — e os 32 países alvo da queixa são todos subscritores daquele texto adoptado pelo Conselho da Europa a 4 de novembro de 1950 e que entrou em vigor em 1953.

Ou seja, os queixosos alegam que, com as suas omissões no combate às alterações climatéricas, os países alvo da queixa estão a violar o seu direito à vida (protegido pelo art. 2.º da Convenção) porque a sua longevidade estão a ser ameaçada pelos efeitos das alterações climáticas.

Por outro lado, os 32 países europeus não estão a respeitar o seu direito à privacidade (que está enquadrado no art. 8.º da Convenção) porque este inclui sua saúde física e mental — que está posta em causa por serem obrigados a passar mais tempo dentro de casa devido às ondas de calor e de frio.

E, finalmente, que está a ser violada a “proibição de discriminação” prevista no art. 14.º da Convenção. Ou seja, os jovens queixam-se de que estão discriminados pela falta de combate às alterações climatéricas visto que os mais jovens são os mais afetados.

3 O que aconteceu depois de o tribunal notificar os países denunciados e o que alegaram estes?

Os 32 Estados-membros tentaram reverter a aceitação da queixa por parte do TEDH e apresentaram uma moção nesse sentido — que foi rejeitada formalmente pelos juízes do tribunal de Estrasburgo em fevereiro de 2021.

Após outras entidades, como a Amnistia Internacional, se terem juntado à causa, e os próprios países que são alvo da mesma terem apresentado os seus argumentos, o TEDH decidiu a 30 de junho de 2022 que o caso seria apreciado por um coletivo de 17 juízes do plenário do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

Este plenário é como se fosse a principal secção do tribunal e é composta por, entre outros, o presidente e o vice-presidente do TEDH e os presidentes das diversas secções.

4 O facto de os queixosos serem menores, invalida a queixa?

Não inviabiliza. “As crianças, assim como os adultos, são titulares dos direitos humanos e podem figurar em juízo desde que sejam autorizadas e representadas pelos seus pais ou pelos representantes legais. Neste caso, a TED serve para ampliar os fundamentos da ação”, explica a advogada Leonor Caldeira.

"As crianças, assim como os adultos, são titulares dos direitos humanos e podem figurar em juízo desde que sejam autorizadas e representadas pelos seus pais ou pelos representantes legais. Neste caso, a Tribunal Europeu dos Direitos Humanos serve para ampliar os fundamentos da ação".
Advogada Leonor Caldeira

Isto porque, “além de uma violação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, os queixosos ainda invocam que a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança também está a ser violada e deve ser conjugada aqui com a Convenção. Portanto, ainda há mais base legal com o facto de dois dos seis serem menores”, conclui a jurista.

5 Pode-se dizer que este é um caso histórico?

Sim, claramente. Em primeiro lugar, porque é a primeira vez que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) vai apreciar uma queixa contra Estados-membros do Conselho da Europa que subscreveram a Convenção Europeia dos Direitos do Homem a propósito da sua alegada inação no combate à emergência climática.

Por outro lado, os queixosos seguiram uma via também ela excecional. Isto é, e tal como explica a advogada Leonor Caldeira, a situação normal é que os cidadãos primeiro esgotem “todas as vias internas” no sistema de justiça nacional de cada Estado-membro antes de recorrerem ao TEDH.

Jovens que levam 33 países ao Tribunal Europeu dos Diretos Humanos esperam ganhar, para não ter que voltar

Contudo, há exceções. E, no caso “Duarte Agostinho e Outros v. Portugal e 32”, os queixosos alegaram que seria desproporcional (até por razões económicas) se tivessem de recorrer aos sistema de justiça de cada um dos 32 países alvos da queixa, antes de terem a possibilidade de recorrer o TEDH, explica Caldeira.

E o tribunal concordou.

6 O que vai acontecer na sessão desta quarta-feira?

A sessão desta quarta-feira não servirá para “ouvir produção de prova de natureza pessoal, ouvir as próprias declarações das partes”, nomeadamente dos queixosos, para saber “o que é pretendem” ou “o que é sofreram” — como acontece habitualmente com as primeiras sessões de um julgamento judicial em Portugal, explica a advogada Leonor Caldeira.

Nos processos do TEDH, a prova é apresentada “toda por escrito”, logo as provas de peritos ou de testemunhas são apresentadas previamente sob aquela forma.

A primeira audiência “serve para os advogados apresentarem uma espécie de alegações, uma exposição sobre a sua pretensão, com direito a réplica e tréplica” por parte da outras partes”, enfatiza Leonor Caldeira.

Nos processos do TEDH, a prova é apresentada "toda por escrito", logo as provas de peritos ou de testemunhas são apresentadas previamente daquela forma. A primeira audiência "serve para os advogados apresentarem uma espécie de alegações, uma exposição sobre a sua pretensão. Ou seja, uma espécie de alegações, com direito a réplica e tréplica" por parte da outras partes", enfatiza Caldeira.

Após essa exposições iniciais, os 17 juízes do TEDH podem colocar perguntas aos advogados, sendo certo que as respostas podem ser dadas após uma pausa.

“No fundo é uma sessão de trabalho entre os advogados e os juízes do TEDH” que pode não terminar logo esta quarta-feira mas que não demorará muito mais tempo do que isso, conclui Leonor Caldeira.

7 Que consequências práticas podem advir de uma eventual vitória dos jovens?

A primeira consequência não será, ao contrário do que costuma acontecer com as decisões do TEDH, o pagamento de qualquer indemnização por parte dos Estados-membros aos queixosos.

“O pedido formulado nesta queixa é de que os Estados sejam condenados a adotar medidas concretas, legislativas e administrativas capazes de fazer cumprir o Acordo de Paris que foi assinado em 2015. Esse acordo previa que os Estados se obrigavam a manter os níveis de temperatura até 2 graus Celsius face aos níveis pré-industriais”, começa por explicar Leonor Caldeira.

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Na prática, os queixosos querem que os países denunciados mudem a sua conduta. “O que se pede na queixa é uma obrigação de resultado e não de meio”, diz a jurista.

Na prática, os queixosos querem que os países denunciados mudem a sua conduta. "O que se pede na queixa é uma obrigação de resultado e não de meio", diz a jurista. Isto é, os seis jovens querem que os 32 países europeus cumpram os Acordos de Paris, mantendo os níveis de temperatura até aos 2 graus Celsius já referidos.

Isto é, os seis jovens querem que os 32 países europeus cumpram os Acordos de Paris, mantendo os níveis de temperatura até aos 2 graus Celsius já referidos.

Queixa no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos pode levar a um Acordo de Paris regional

Se os jovens ganharem a causa — o que significa que o TEDH reconheceu que a Convenção Europeia dos Direitos Humanos foi violada —, tal decisão será transmitida ao “Comité de Ministros do Conselho da Europa que tem a responsabilidade de fiscalizar o cumprimento das decisões do tribunal”, diz Caldeira.

Ou seja, o Comité de Ministros do Conselho da Europa ficará responsável pela fiscalização da aplicação das ” medidas concretas que devem ser adotadas, sejam elas alteração da legislação nacional ou de governação.”

8 Há outros exemplos de decisões judiciais sobre casos relacionados com a emergência climática?

A consciência social das opiniões públicas europeias sobre as consequências da emergência climática tem levado a cada vez maior conflitualidade jurisdicional contra os diferentes países.

Por exemplo, o Supremo Tribunal dos Países Baixos já condenou o Estado holandês por não cumprir as suas obrigações de combater o aquecimento global com o argumento de que não está a cumprir as suas obrigações enquanto Estado defensor dos direitos humanos — no que ficou conhecido como o caso Urgenda Foundation vs Holanda.

Os Acordos de Paris foram um marco mas também têm sido em certa medida um falhanço histórico porque os Estados aplicam as medidas de combate às alterações climáticas de forma descoordenada e fora dos prazos estabelecidos.

O Supremo Tribunal dos Países Baixos já condenou o Estado holandês por não cumprir as suas obrigações de combater o aquecimento global com o argumento de que não está a cumprir as suas obrigações enquanto Estado defensor dos direitos humanos — no que ficou conhecido como o caso Urgenda Foudantion vs Holanda.

Outro exemplo. “Foi iniciado em 2018 um processo no Tribunal de Justiça da União Europeia que ficou conhecido como ‘The People’s Climate Case’ [O Processo Climático do Povo], em que um grupo de cidadãos da União Europeia e fora dela, onde se incluíam agricultores portugueses (que até deram o nome ao processo)”, recorda Leonor Caldeira.

O processo visava o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia, utilizando argumentos muito semelhantes aos que os seis jovens portugueses apresentaram no TEDH sobre o cumprimento dos Acordos de Paris.

Contudo, o Tribunal Europeu da União Europeia indeferiu a queixa, “porque a legitimidade ativa dos cidadãos” perante aquele tribunal “está muito limitada.”

Isto é, a jurisprudência do tribunal é muito sólida no sentido de que a legitimidade para agir depende de consequências individuais e autónomas de um ato da União Europeia para o próprio cidadão queixoso. No caso da emergência climática, as consequências são coletivas, e não individuais, explica Leonor Caldeira.

(Notícia atualizada às 9h40 com a informação de que o grupo de jovens retirou a queixa contra a Ucrânia pelo que o número de países processados passou de 33 para 32)

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