Em menos de uma semana, a PSP conseguiu encontrar o suspeito de ter assaltado a Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna (MAI) – que foi detido esta segunda-feira em Lisboa e começou a ser ouvido esta terça-feira por um juiz de instrução criminal e ficou esta quarta-feira a saber que o Tribunal Central de Instrução Criminal determinou prisão preventiva como medida de coação. Neste momento, as autoridades continuam a tentar recuperar os oito computadores roubados e que, entretanto, o suspeito já tinha vendido. Ainda assim, a investigação que está a cargo da Divisão de Investigação Criminal foi dificultada pelo facto de o sistema de videovigilância instalado no edifício da Secretaria-Geral do MAI, na rua de São Mamede, não estar a funcionar de forma efetiva na passada quarta-feira — o MAI diz que a falha era na gravação das imagens.
Foi, por isso, aliás, que a PSP não conseguiu ter imagens da chegada e da fuga do assaltante, o que poderia ter permitido uma identificação mais rápida do suspeito. Este terá, tal como o Observador avançou na semana passada, utilizado os andaimes do prédio contíguo que estava em obras e, a partir daí, terá conseguido entrar dentro da Secretaria-Geral do MAI através de uma das janelas do último andar. Sem imagens, apurou o Observador junto de fonte próxima do processo, a PSP teve de pedir imagens de câmaras de vigilância de vários edifícios que ficam perto daquela secretaria-geral. Aconteceu, por exemplo, com restaurantes.
E foi graças a estas imagens, algumas captadas a largos metros do local assaltado, que a investigação da PSP conseguiu ver o homem de 39 anos que está neste momento detido. Além disso, fonte ligada ao processo admite ainda que o suspeito possa ter deixado para trás algum objeto que o identificava, o que poderá ter também facilitado a sua identificação. Certo é que o homem de 39 anos, depois de ter conseguido entrar no edifício – tudo indica que tenha sido pelas 5h da passada quarta-feira –, remexeu vários gabinetes, incluindo os dos principais responsáveis, acabando por levar oito computadores, sendo um deles utilizado por Teresa Costa, secretária-geral adjunta, e outro pelo responsável pela área informática.
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Durante cinco dias, a PSP analisou as imagens das câmaras das proximidades, o rasto deixado pelo assaltante e chegou então à identidade de um português, com antecedentes criminais e que, segundo apurou o Observador, não tem morada fixa. “Foi detido na rua”, acrescentou a mesma fonte. E, a somar ao facto de ser uma pessoa em situação de sem-abrigo, a PSP confirmou um histórico de consumo de droga e acredita que este foi um crime de oportunidade, afastando cada vez mais a hipótese de existir intenção de obter informação sensível e confidencial do Estado.
Vendeu os computadores no dia do assalto
O suspeito terá levado os oito computadores da secretaria-geral do MAI durante a madrugada de quarta-feira e, durante esse mesmo dia, terá vendido todos os equipamentos na rua, no centro de Lisboa, a um grupo seu conhecido. A zona onde foram vendidos os equipamentos — o Largo de São Domingos — é, aliás, conhecida pelo comércio ilegal de vários produtos – incluindo a compra e venda de droga, roupa e equipamentos eletrónicos.
Depois de identificado o suspeito, a PSP rapidamente chegou ao local onde foram vendidos os computadores que, segundo explicou o Ministério da Administração Interna em comunicado na semana passada, não estariam todos a ser utilizados, já que alguns serviam apenas de reserva. Já estará também identificado o comprador, sendo esta a fase atual da investigação: a de recuperação dos computadores.
Apesar de todas as dúvidas levantadas ao longo dos últimos dias, o ministério liderado por Margarida Blasco só se pronunciou esta quarta-feira de manhã, já depois da publicação deste artigo, garantindo que os computadores não tinham informação sigilosa ou confidencial. Nada foi referido sobre um eventual reforço de segurança naquelas instalações.
Suspeito tem longa lista de crimes no cadastro, incluindo em França
Assim que foi identificado pela Divisão de Investigação Criminal, a PSP percebeu que este homem já conta com uma longa lista de crimes no seu cadastro. E todos são da mesma natureza que aquele que foi praticado na passada quarta-feira na Secretaria-Geral do MAI. Segundo apurou o Observador, estão na lista crimes de furto de carros, furto simples, furto qualificado, extorsão e violação de domicílio — muitos praticados no ano passado e este ano.
Mas os crimes não ficam só pela cidade de Lisboa. Como também adiantou ao Observador outra fonte próxima do processo, este homem de 39 anos esteve detido em França e chegou mesmo a fugir da cadeia onde estava a cumprir pena pelo mesmo tipo de crimes. Apesar da fuga, o suspeito terá acabado por cumprir as penas a que foi condenado pela justiça francesa, não existindo neste momento nenhum mandado internacional de detenção, sabe o Observador.
Possivelmente antes de ter decidido ir para França, este homem também foi constituído arguido pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado no Fundão. Segundo apurou o Observador, foi publicado um aviso de contumácia em 2004 em seu nome — há 20 anos –, altura em que o agora suspeito do assalto à Secretaria-Geral tinha 19 anos. Estes avisos são emitidos pelo juiz responsável pelo caso quando não é possível notificar o arguido ou proceder à sua detenção, precisamente por não ser conhecido o seu paradeiro.
Ministério assume “falha na gravação de imagens” de videovigilância
O Ministério da Administração Interna confirmou na manhã desta quarta-feira, depois da publicação desta notícia, a detenção do suspeito, esclarecendo que tal, como o Observador tem noticiado sempre, o assalto foi à Secretaria-Geral do MAI, na rua de São Mamede, e não ao Ministério da Administração Interna, no Terreiro do Paço.
No comunicado, ainda que comece por dizer que “contrariamente ao que vem sendo propalado, não corresponde à verdade que as câmaras de videovigilância, do edifício que sofreu a intrusão, estivessem avariadas ou desligadas, na altura da intrusão, já que estavam a funcionar normalmente e as imagens eram visíveis no respetivo posto de controlo”, o MAI assume ser verdade que havia “uma falha na gravação de imagens”. Ainda que o MAI garanta que se trate de uma situação distinta, o certo é que a avaria que impossibilitou a gravação das imagens do momento em que se deu a intrusão dificultou a investigação da PSP, que teve de se socorrer de imagens captadas por circuitos de videovigilância de estabelecimentos próximos. O comunicado defende, no entanto, que a falha verificada não impediu “a identificação do suspeito e a sua, agora, detenção”.
Quanto aos computadores roubados e que não foram ainda recuperados, a tutela — que diz não ter reagido mais cedo para não comprometer a investigação — afirma que “dos oito computadores furtados, só dois estavam a uso e os restantes eram computadores de reserva/substituição” e que não tinham informação relevante ou sigilosa: “Em ambos os casos, seja nos computadores de reserva/substituição, seja no caso dos dois computadores que estavam a uso, não existiu, nem existe, qualquer risco de acesso a qualquer informação e ou documentos, confidenciais ou não. Mais se esclarece que os computadores furtados eram meros terminais de acesso a informação sediada em servidor e, logo, não acessível apenas com o computador, sem acesso à mesma. Ainda, assim, estes computadores não estavam, nem estiveram, ligados, nem tem acesso, a informação “classificada ou de relevância.
O ministério liderado por Margarida Blasco confirma ainda neste comunicado que o suspeito tem um longo cadastro e que “cumpriu pena de prisão em França, por crimes de igual natureza, evadindo-se daqueles estabelecimentos prisionais e terá regressado a Portugal no início do presente ano, vindo, desde então, segundo está a apurar-se, a praticar ilícitos da mesma natureza”.
Artigo atualizado às 10h desta quarta-feira com informação do comunicado do Ministério da Administração Interna publicado já após a publicação deste artigo.