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epa08258870 Opposition supporters holding a large Russian flag take part in a memorial march for Boris Nemtsov to mark the fifth anniversary of his assassination in Moscow, Russia, 29 February 2020. Nemtsov was a liberal politician and prominent critic of Russian President Vladimir Putin who was assassinated on 27 February 2015 in Moscow.  EPA/YURI KOCHETKOV
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Depois da forte redução durante a pandemia, e no início da guerra, dormidas de russos em Portugal estão a chegar aos valores do pré-Covid

YURI KOCHETKOV/EPA

Depois da forte redução durante a pandemia, e no início da guerra, dormidas de russos em Portugal estão a chegar aos valores do pré-Covid

YURI KOCHETKOV/EPA

Cidadãos russos estão a voltar a Portugal. Entradas dispararam após anúncio da mobilização parcial de setembro

Em outubro, entradas de russos em Portugal subiram 23% face a setembro, data da mobilização militar parcial. Plataforma de arrendamento europeia diz que 94% das reservas de russos são para Portugal.

Carla Costa Reis carateriza-os como “discretos”. Os cidadãos russos que tem recebido nos alojamentos locais que gere em Lisboa”não regateiam” e fazem reservas “muito em cima da hora”, “sem grandes conversas”. Muitos serão trabalhadores remotos, arrisca dizer, por causa de uma pergunta que lhe fazem com que frequência: “Qual a velocidade da internet?”

A gestora de alojamento local tem notado “estadas mais prolongadas do que era habitual”. “Sobretudo porque sempre foram mais de ficar em hotéis do que em alojamento local”, atira. Desde que a guerra começou e até final de dezembro ia nos 13 (em 2021, ainda fortemente afetado pela pandemia, teve apenas uma reserva de hóspedes russos). E há de tudo: desde estadas de três dias, até de um mês (aconteceu, para o final de março, marcada com um par de dias de antecedência). “Muitos deles vêm à procura de opções mais de médio termo”, diz, tendo em conta os pedidos de prolongamento de estadas que lhe fazem, aos quais muitas vezes não consegue responder por já ter outras reservas.

Noto que começaram a vir porque o tipo de alojamento de que começaram a precisar, com este tipo de imigração, implica passarem aqui mais tempo, terem uma sala, uma cozinha, fazerem uma vida mais doméstica”, afirma Carla Costa Reis, ao Observador.

A perceção da gestora de alojamento local é que essa chegada de cidadãos com passaporte russo aumentou mais nos últimos meses. E os números do Serviço de Estrangeiros (SEF) corroboram essa visão. O número de cidadãos russos a chegar a Portugal caiu muito nos primeiros meses da guerra — em março, face a fevereiro (mês em que começou a guerra), a queda foi de 42%, de 1.351 para 777 entradas.

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Nos meses seguintes, o número foi recuperando, sobretudo no verão, chegando aos 15 mil em julho e em setembro. Mas o máximo do ano foi atingido em outubro, depois de, a 21 de setembro, Vladimir Putin ter anunciado oficialmente a mobilização parcial militar de 300.000 militares para reforçar o contingente da guerra: 1.881 em outubro, ou seja, um aumento mensal de 23%. Em novembro, as chegadas voltaram a ficar acima das 1.800.

Mas, embora a recuperar francamente, os números estão ainda muito longe do pré-pandemia. Em fevereiro de 2020, deram entrada 4.657 cidadãos russos em Portugal e, em outubro de 2019, foram 7.371.

Segundo informação do SEF ao Observador, os cidadãos russos que queiram vir para Portugal têm de ter um visto de entrada no espaço Schengen, sendo a atribuição da competência dos serviços do Ministério dos Negócios Estrangeiros, como embaixadas e postos consulares portugueses no estrangeiro. Isso não inclui os vistos gold que foram suspensos para cidadãos russos como sanção por causa da guerra.

Ucrânia alerta russos que 2023 vai começar com nova mobilização do Kremlin

Radim Rezek, co-fundador e CEO da Flatio, plataforma de arrendamento focada no segmento dos nómadas digitais, também notou um aumento do destino Portugal nas preferências dos russos que reservam com a Flatio. De acordo com dados enviados a pedido do Observador, as reservas de cidadãos russos na plataforma para Portugal mais do que triplicaram nos últimos três meses: a subida foi de 272% face ao mesmo período do ano anterior, ainda marcado pela pandemia. Um valor significativo se tivermos em conta que, entre setembro e dezembro, as reservas globais da plataforma em Portugal subiram 7% em comparação com o período homólogo de 2021 (e 40% só em dezembro).

Noutros números: entre fevereiro e agosto, a plataforma recebeu 190 reservas de cidadãos russos para Portugal. De setembro a dezembro, o número mais do que duplicou, para 404. A mobilização parcial da Rússia “foi o gatilho”, acredita Radim Rezek.

Radim Rezek diz que nos últimos meses o mercado vindo da Rússia para Portugal aumentou muito e teve um "impacto significativo" nos números da empresa

Entradas disparam depois do anúncio da mobilização parcial

Os rumores já se vinham fazendo ouvir e foram confirmados a 21 de setembro, quando Vladimir Putin anunciou a mobilização parcial — e não geral, como se chegou a dizer — de 300 mil reservistas para combater na guerra na Ucrânia, numa altura em que o conflito se prolongava há sete meses e sem fim à vista. Alguns dias depois, revelou algumas exceções: trabalhadores especializados em tecnologias de informação, banqueiros e jornalistas que trabalhem para empresas estatais.

Rússia revela exceções à mobilização parcial: banqueiros, jornalistas estatais e trabalhadores de TI

Numa publicação de 27 de setembro, a Agência Europeia de Fronteiras e Guarda Costeira (Frontex) mostrava os efeitos da mobilização nas entradas de cidadãos russos Rússia na Europa: na semana de 19 a 25 de setembro, 66 mil russos passaram a fronteira em direção a território europeu, um aumento de 30% face à semana anterior. As portas de entrada foram sobretudo a Finlândia e a Estónia, onde puderam entrar, sobretudo, com autorizações de residências e vistos, ou por terem dupla nacionalidade. Mas os dados apenas revelam por onde entraram e não em que países se fixaram.

Na semana seguinte, foram mais 53 mil a cruzar a fronteira e, na que se seguiu, mais 25.600. “A mobilização parcial russa levou até agora a um aumento das travessias fronteiriças de cidadãos russos sobretudo para países que não necessitam de visto e outros países de fácil acesso (Geórgia, Turquia, Cazaquistão, Uzbequistão, Mongólia) à medida que a União Europeia aumenta as restrições de entrada”, lia-se num comunicado da agência.

Segundo a Reuters, num artigo de outubro, países como o Cazaquistão e a Geórgia são portas de entrada, ambos locais onde podem chegar sem um passaporte ou um visto. No início de outubro, mais de 200.000 russos tinham entrado desde 21 de setembro no Cazaquistão, enquanto cerca de 147 mil tinham saído; na Geórgia, entraram mais de 68 mil e saíram mais de 45 mil.

De acordo com a Frontex, os números só não foram superiores pelas restrições que muitos países europeus implementaram à entrada de russos que viajassem por motivos de turismo e lazer: foi o caso da Polónia, da Lituânia, da Letónia e da Estónia. Mas não só: a Rússia também dificultou as saídas e, segundo a agência, “as autoridades russas estabeleceram gabinetes de alistamento perto dos pontos de travessia na fronteira”.

O fim da mobilização parcial foi anunciado nos últimos dias de outubro, com o governo russo a assegurar que não estava prevista qualquer outra decisão do género.

Rússia anuncia fim da “mobilização parcial” de 300 mil reservistas

Sabe-se, portanto, por onde entram, mas não é tão claro qual o destino final. Carla Costa Reis, gestora de alojamento turístico em Portugal, diz que os cidadãos de passaporte russo que recebe são de poucas conversas. Mas, pelo histórico de viagens numa conhecida plataforma de alojamento que a gestora usa, sabe que muitos dos que chegam às casas que gere não vieram diretamente da Rússia: já andavam a saltitar pela Europa, ou mesmo por Portugal. “Procuram sítios para trabalhar. Vê-se que andam à procura de um sítio para ficar. A sensação que tenho é que vão ficando em Airbnbs até conseguirem uma localização e um preço para um contrato de arrendamento. Mas também estão a tentar perceber a cidade”, interpreta.

"Procuram sítios para trabalho. Vê-se que andam à procura de um sítio para ficar. A sensação que tenho é que vão ficando em Airbnbs até conseguirem uma localização e um preço para um contrato de arrendamento. Mas também estão a tentar perceber a cidade."
Carla Costa Reis, gestora de alojamento local

Os dados do SEF mostram como a guerra na Ucrânia fez diminuir o número de chegadas de russos logo no início do conflito, com uma queda de 42% entre fevereiro e março de 2022. Disparou depois com o verão e, mais recentemente, com a mobilização parcial de setembro: em outubro subiu 23% face a setembro, para um total de 1.881 entradas.

A rota dos russos mudou e Portugal é o destino. “Não vão para Praga ou Budapeste, como era comum”

Radim Rezek, co-fundador e CEO da Flatio, plataforma de arrendamento nascida na República Checa e que em 2020 chegou a Portugal, diz que nos últimos meses o mercado vindo da Rússia para Portugal aumentou muito e teve um “impacto significativo” nos números da empresa. “Não vão para Praga ou Budapeste, como era comum. Estão a ir diretamente para Lisboa“, acrescenta em declarações ao Observador. A Madeira, onde há uma comunidade ativa de nómadas digitais, também é um destino comum. A mobilização parcial da Rússia, em setembro, “foi o gatilho”, acredita.

Segundo dados enviados a pedido do Observador, as reservas de cidadãos russos na plataforma para Portugal mais do que triplicaram nos últimos três meses: a subida foi de 272% face ao mesmo período do ano anterior, ainda marcado pela pandemia. Só nos últimos 30 dias, o crescimento homólogo de reservas feitas por russos foi de 257%. Atualmente, 94% reservas feitas por cidadãos da Rússia são para Portugal.

Os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), enviados a pedido do Observador, também mostram um aumento nas reservas e nas estadas. Depois de dois anos de pandemia em que as dormidas de cidadãos russos caíram a pique — como aconteceu com todas as nacionalidades, fruto das restrições da Covid-19 — a vinda de residentes na Rússia para Portugal está a recuperar. Mas ainda abaixo do pré-pandemia, em fevereiro de 2020.

Em outubro deste ano foram registadas 18.480 dormidas de residentes na Rússia, um valor ainda abaixo de fevereiro de 2020 (25.628), o mês imediatamente anterior aos primeiros casos detetados de Covid-19 em Portugal que levou ao primeiro confinamento em março desse ano. Os números do INE têm por base o Inquérito à Permanência de Hóspedes na Hotelaria e Outros Alojamentos, que é mensal, mas são estatísticas, e relativos aos alojamentos em estabelecimentos turísticos, incluindo alojamento local. Não são bases administrativas como as do SEF e não contabilizam os cidadãos que podem vir e ficar numa casa própria ou arrendada, por exemplo.

As dormidas de cidadãos russos estavam a recuperar até ao início da guerra na Ucrânia, a 24 de fevereiro. Depois de uma queda em dezembro de 2021, já estavam acima dos 10 mil nos dois primeiros meses de 2022. Em março, o primeiro mês completo de conflito, a queda foi de 27%, de 12.563 para 9.144, face ao mês anterior. Depois de um verão em que os números se mantiveram acima dos 11 mil, chegando mesmo aos 18 mil de agosto, voltaram a cair em setembro.

Mas em outubro, ao contrário do que aconteceu em 2019 face a setembro, o número de dormidas subiu em Portugal, para 18.480. Ainda longe, muito longe, é certo, dos 49 mil do pré-pandemia, mas já o início de uma provável recuperação.

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