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LNG transfer between "two giant ships"
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Navio de gás natural liquefeito acostado a um terminal flutuante de regaseificação de GNL na Turquia

Getty Images

Navio de gás natural liquefeito acostado a um terminal flutuante de regaseificação de GNL na Turquia

Getty Images

Europa tem soluções para trocar gás russo por GNL, mas fica mais caro e é pior para o ambiente

A Europa está à procura de navios que são também terminais flutuantes de GNL. O gás natural liquefeito é a alternativa ao gás russo que chega de gasoduto. Mas é mais caro e produz mais emissões.

A Lituânia foi o último país a anunciar o divórcio dos fornecimentos russos que abasteciam a quase totalidade das necessidades do país. O governo local está confiante de que consegue cargas de gás natural liquefeito. Mas estamos a falar de um pequeno país com menos de três milhões de habitantes.

A Europa está numa corrida contra o tempo para substituir, o mais depressa possível, os cerca de 40% do gás natural que recebia da Rússia, a maior parte do qual através de gasoduto. O continente importa 155 mil milhões de metros cúbicos (bcm) por ano — cerca de 40% é comprado à Rússia — e, apesar do acordo anunciado com os Estados Unidos para aumentar as compras de gás americano para 50 bcm/ano até 2030, terá de encontrar outros fornecedores para se livrar da dependência do gás russo antes do próximo inverno. Atualmente chega dos EUA cerca de 22 mil milhões, valor que irá aumentar já este ano em 15 mil milhões de metros cúbicos.

Ainda que o gás exista e venha a estar disponível, o maior problema é outro: Como trazê-lo dos países produtores e levá-lo para os grandes consumidores na Europa central. Trocar gás russo é muitas vezes sinónimo de comprar Gás Natural Liquefeito (GNL). E o GNL exige toda uma infraestrutura industrial e logística que não só o torna mais caro que o gás vindo por gasoduto como obriga a investimentos que não são rápidos.

Grande parte do abastecimento à Europa central e do Norte é feito por gasoduto

Ana Martingo/Observador

O gás natural liquefeito, explica ao Observador o professor do ISEL (Instituto Superior de Engenharia de Lisboa), Jorge Sousa, resulta de um processo de arrefecimento a temperaturas muito baixas (mais de 160 graus negativos) para poder ser transportado por barco em estado líquido e ocupando menos espaço. Na descarga, são necessárias unidades de gaseificação que aquecem o GNL, reconvertendo-o em gás a injetar num pipeline. É um processo mais caro e que envolve o consumo de mais energia, gera mais emissões e só está disponível para os países que têm terminais de GNL.

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Com a exceção da Península Ibérica, a Europa, diz Jorge Sousa, está no seu limite e não tem muita capacidade disponível para acomodar todo o GNL que seria necessário. A Alemanha não tem terminais. Apesar de haver capacidade disponível na Península Ibérica — Espanha tem seis e Portugal um — não há infraestrutura em gasoduto para o transportar para além dos Pirinéus. “É um estrangulamento que não é resolúvel no curto prazo porque estas intervenções demoram anos a fazer”, sublinha o professor do departamento de Engenharia Eletrónica de Energia e Automação do ISEL que é coordenador do grupo de investigação em sistemas de energia.

Ainda que exista agora abertura de França para avançar com essa interconexão, o que até poderia justificar um reforço da capacidade para receber e armazenar GNL em Sines, a curto prazo, os grandes importadores como a Alemanha estão a virar-se para um outro tipo de infraestruturas, mais rápidas e baratas de construir e muito mais flexíveis. Os terminais flutuantes são navios de transporte de GNL que dispõem da sua própria unidade de regaseificação e que podem fazer o transporte até ao ponto de descarga, mesmo sem um terminal específico.

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A resposta passa pelos terminais flutuantes. Mas não há muitos

Os FRSU (floating regaseification storage unit) são um mercado de nicho que está a assistir a uma grande dinâmica, afirma Jorge Sousa. Estes navios têm capacidade para importar 5 mil milhões de metros cúbicos (bcm) de gás por ano, quase tanto como Sines (6 mil milhões). A Alemanha está a analisar várias localizações possíveis no mar do Norte e no Báltico. Mas existem outras limitações. São navios muito específicos e não há muitas unidades disponíveis porque no passado existiu sobrecapacidade e houve pouco investimento.

A frota de FSRU é composta por cerca de 50 unidades, de acordo com o diretor executivo da Golar LNG, um dos fabricantes. Em declarações ao Financial Times, Karl Fredrik Staubo, admite que apenas cinco destas unidades estão disponíveis e três poderão ficar livres dos seus contratos este ano. No entanto, nem todos estes navios são adequados para abastecer o centro e o Norte da Europa porque a temperatura da água, abaixo dos 10 graus, é demasiado baixa para o sistema de aquecimento usado. Além de que não são baratos. Os custos de frete subiram 50% e fontes da indústria citadas pelo jornal inglês dizem que contratar um FSRU pode custar 40 a 60 milhões de dólares (54 milhões de euros) por ano. Construir um novo demora três anos, ainda assim menos tempo do que fazer um terminal novo, e também custa menos.

O mercado de gás natural liquefeito está em grande ebulição com a Europa a estabelecer novos contratos com o Qatar e os Estados Unidos para cortar o cordão umbilical à Rússia. O plano europeu inicial era reduzir em dois terços as compras até ao próximo inverno, mas com a escalada do conflito e as recentes denúncias de crimes de guerra cresce a pressão para ganhar independência.

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Mas, no imediato, muitos países europeus ainda se encontram energeticamente reféns, como se viu na semana passada com a ameaça russa de aceitar pagamentos apenas em rublos. O impasse parece ter sido ultrapassado com uma habilidade financeira russa, mas vários países ativaram planos de emergência que previam racionamento se o fluxo de gás fosse interrompido.

O GNL é mais caro e tem mais emissões

Jorge Sousa considera que se está a viver uma reorganização mundial dos fluxos de compra e venda de gás. Os Estados Unidos, por exemplo, estão a reorientar cargas de GNL para a Europa que antes estavam a ir para a Ásia, mas ao mesmo tempo espera-se que a China reforce as suas compras à Rússia, libertando outros fornecedores. Ainda que haja gás suficiente no mundo, e a escalada das cotações se deva a este reequilíbrio entre fluxos de compras e vendas, a solução europeia para se libertar da energia russa traz custos acrescidos para a própria Europa.

“O GNL é mais caro e vai manter essa diferença de preço”, defende o professor do ISEL. O preço do gás está indexado ao petróleo que, por sua vez, está nas mãos da OPEP e eles “já perceberam que há um prazo para os combustíveis fósseis desaparecerem. Vão vender caro enquanto puderem”.

Estamos reféns da energia russa?

Mas o plano de libertação do gás russo tem outras implicações das quais pouco se fala, alerta o professor do ISEL, e que são ao nível ambiental. Não está em causa apenas uma maior pegada ecológica trazida pelo transporte marítimo, mas há perdas associadas a todo o processo que libertam metano, um gás cujo efeito de estufa é pior do que o CO2.

O gás natural é, essencialmente, molécula de metano (CH4). Uma central a carvão liberta três vezes mais CO2 do que uma central de ciclo combinado. Mas se se analisar todo o circuito do gás, as fugas de metano podem gerar um efeito de estufa superior ao CO2, diz Jorge Sousa. Essas perdas ocorrem quando o gás é liquefeito, o que implica temperaturas muito negativas. Depois para reaquecer entra em ebulição o que gera evaporação.

O gás natural liquefeito "é muito menos eficiente do ponto de vista energético e mais danoso do ponto de vista ambiental" do que o gás de gasoduto.
Jorge Sousa, professor do Departamento de Engenharia Eletrónica de Energia e Automação do ISEL

Todo o processo, acrescenta, produz muito mais emissões do que o gasoduto que usa a energia da compressão e não requer mudanças acentuadas de temperatura. A energia é inferior à que é necessária para baixar a temperatura, mantê-la negativa no transporte, e aquecer para regaseificar. “É muito menos eficiente do ponto de vista energético e mais danoso do ponto de vista ambiental”, conclui o especialista do ISEL. Logo, estas decisões que estão a ser tomadas no curto prazo, para resolver um problema de segurança de abastecimento, podem comprometer decisões de longo prazo que são exigidas pela transição energética.

“Não vejo como é que a Europa pode sair bem disto”, numa alusão à grande bandeira climática que deu uma supremacia à política europeia e que agora corre o risco de se perder.

A Europa tem “particularidades” que a colocam em desvantagem face à América. A revolução do shale gas (gás de xisto) transformou os Estados Unidos no maior produtor mundial e num grande exportador de gás natural, ao mesmo tempo que lhe permitiu reduzir as emissões de CO2, reconvertendo as centrais a carvão. A Europa não aceita explorar o shale gas por razões ambientais e apesar de ter vários países ricos em carvão — como a Alemanha e a Polónia —, não está a ser explorado para a produção elétrica por causa da transição energética, deixando o continente refém do gás natural, ainda que com a perspetiva de que venha a ser substituído por gases renováveis (verdes).

Tal como a Europa, a China também é importadora de energia, mas adotou outra estratégia. Desenvolveu parcerias com países na África e na América Latina que são ricos em petróleo, gás, mas também em minérios que são fundamentais para a transição energética como o lítio. E investiu em minas e em portos e infraestruturas fundamentais para as suas importações. A Europa não tem nada disto, daí a dependência energética. E vai continuar dependente. Vai substituir uma dependência por outra. Foi o que aconteceu com a Alemanha que quis acabar com o nuclear e com o carvão e acabou por aumentar a sua dependência do gás natural.

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