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Yuri Arcurs

Yuri Arcurs

Aqui quem fica em casa é o pai

No Dia do Pai, o Observador ouviu três testemunhos de homens com três coisas em comum: horários de trabalho flexíveis, o que lhes permite estar em casa e tomar conta dos filhos.

Estão felizes e não trocavam a rotina por nada, mesmo sabendo que, por norma, quem fica em casa com os filhos são as mães. Chegam mesmo a ter saudades por antecipação, temendo o dia em que já não terão tanta disponibilidade para tomar conta dos miúdos e vê-los crescer.

Falamos de pais que, por diferentes motivos, ficaram em casa encarregues das tarefas diárias que os filhos exigem — desde ir buscá-los à escola a preparar-lhes as refeições e até ver desenhos animados na sua companhia. No Dia do Pai, fomos conhecer três casos semelhantes para encontrar uma só resposta: que é um privilégio ter mais tempo para viver a infância dos filhos.

“Hoje tenho tempo para jogar ao Monopólio com os meus filhos”

João Ricardo Pedro viu-se obrigado a reconstruir a vida pessoal e profissional quando, em 2009, caiu na teia do desemprego. O engenheiro eletrotécnico, com mais de dez anos de serviço numa empresa de telecomunicações, passou a ficar em casa — não foi uma opção, antes uma obrigação. Hoje, cinco anos depois, consegue ver a dupla oportunidade que a vida lhe deu: “Fiquei desempregado e fiquei em casa. Foi quando comecei a escrever e a acompanhar de perto os meus filhos”, conta ao Observador.

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A história do escritor que em 2011 ganhou o prémio Leya pela obra O Teu Rosto Será o Último já é conhecida do público em geral. Sem trabalho, confinado a quatro paredes e sentado durante horas à secretária, encontrou-se a meio caminho com a literatura. Os resultados estão à vista: recebeu um prémio de 100 mil euros pelo primeiro romance e um segundo vai chegar às livrarias até ao final do ano. Mas, sobre isso, João Ricardo Pedro não fala mais.

O mesmo não se pode dizer dos dois filhos, de 11 e 8 anos, com quem passou a estar mais tempo. São as personagens principais de um romance que explora o dia-a-dia em família, com o escritor no papel de narrador. Desde 2009 que os dias regem-se segundo o horário dos filhos: todos os dias ele e a mulher acordam pelas 07h30 — ela para se lançar ao trabalho e ele para levar os miúdos à escola. Entregues às respetivas salas de aula, o escritor senta-se à secretária de casa e agarra-se ao computador entre as 08h30 e as 16h30; pelo meio faz uma pausa de apenas uma hora para almoçar.

Ainda a tarde vai a meio para muitos portugueses quando o tempo de antena volta a pertencer aos mais pequenos. “No meio do problema [o desemprego], este foi um dos aspetos mais positivos, isto é, ir buscá-los mais cedo à escola”, partilha com o Observador. Passar pelo café findas as aulas, levá-los ao parque e ajudá-los com os trabalhos de casa são tarefas que já fazem parte de uma rotina que se estabeleceu como habitual: “Hoje tenho tempo para jogar Monopólio com os meus filhos”, diz o escritor, como se este fosse um feito histórico. E talvez seja.

"É sempre difícil comparar gerações, mas eu com 11 anos partilhava muito menos com o meu pai. Agora, há tempo para o meu filho me contar o que se passa na escola e para me fazer perguntas que, muitas vezes, eram feitas aos avós, da religião à sexualidade, passando pelo futebol."
João Ricardo Pedro

O ato de brincar com os dois filhos é tido como um fugaz, mas recorrente, regresso à infância. “Os pais voltam a ser crianças. Isto acontece-me todos os dias, seja nos disparates feitos à mesa ou a dizer parvoíces.” E, a propósito de parvoíces, João Ricardo Pedro conta que o trio — pai e filhos — tem segredos entre si e desvenda um: “Iniciei os meus filhos no conhecimento aprofundado do calão português”, diz, mas sem querer dar exemplos com medo que a mãe se zangue quando descobrir (esperemos que não leia este artigo).

Desde que perdeu o emprego que o pai de 41 anos vive a infância dos filhos (um menino e uma menina) de forma diferente: “É sempre difícil comparar gerações, mas eu com 11 anos partilhava muito menos com o meu pai. Agora, há tempo para o meu filho me contar o que se passa na escola e para me fazer perguntas que, muitas vezes, eram feitas aos avós, sobre religião, sexualidade e até futebol.” Acrescenta ainda que “é inevitável o afastamento entre pais e filhos, mas sinto que, no meu caso, esse vai ser um processo mais lento.”

O facto de o escritor estar em casa com os filhos, por oposição à mãe, não gera qualquer tipo de controvérsia entre familiares e amigos, apesar de a mulher desejar estar na situação inversa: “Tenho a certeza que ela preferia ficar em casa, mas ela percebe que a situação atual é boa para a família e para todos.” Desejos à parte, há também vantagens: quando a mãe chega a casa depara-se com um ambiente familiar diferente, em vez do habitual stress de fim de dia, porque já não é preciso montar o puzzle de tarefas infantis que antecede a hora de as crianças irem para a cama.

O cenário proposto faz de João Ricardo Pedro um homem e um pai preenchido. “Digo, por brincadeira, que devo ser um dos poucos portugueses que se sente mesmo feliz. Não alteraria por nada este momento. Sinto-me bem e quero continuar assim.”

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“Ainda bem que ninguém está em casa, porque nós os dois é só figuras”

Com 18 meses, Margarida já acorda com a mania da bolacha. Assim que pode pede “bua, bua”, na tentativa de comunicar com o pai, Renato Dias. O hábito instalou-se lá em casa e já não há volta a dar: “Já nem aceita metades, agora são só bolachas inteiras”, comenta o progenitor divertido. Assim que a mãe sai porta fora para ir trabalhar, impera uma relação a dois, bem como uma rotina que a família pretende manter até a filha completar os três anos de idade, altura em que está previsto entrar num infantário.

“Acordar, dar o lanche da manhã, dar o banho e fazer a tradicional voltinha ao parque”, é assim que começam quase todos os dias de Renato e Margarida. Desde manhã até meio da tarde, pai e filha são exclusivamente um do outro. Isto porque ele trabalha aos fins de semana (dá assistência a espetáculos musicais) e todos os dias a partir das 16h00, quando vai para o estúdio “gravar a música que os outros fazem”. É também por volta dessa hora que a namorada chega a casa e os dois invertem os papéis — “Vou a descer as escadas e ela a subir, é quase uma passagem de testemunho”, brinca.

De tanta convivência com o pai, a pequena Margarida vai adquirindo os seus hábitos e manias. Como daquela vez em que o viu a comer uma fatia de pão com queijo e, desde então, não quer outra coisa — volta e meia grita pelo “pa” que não é pai, mas sim pão. Renato recorda-se também do momento em que posou com a filha para uma fotografia com a língua de fora: foi a deixa para que Margarida trocasse, desde então, os sorrisos pela língua perante uma câmara fotográfica.

O pai garante que os dois estão sempre na palhaçada, a fizer figurinhas, a tirar fotografias para enviar à mãe e a ver desenhos animados juntos. Mas são as músicas do canal Panda de que Margarida gosta mais. “Ainda bem que ninguém está em casa, porque nós os dois é só figuras”, desabafa.

Aos 32 anos, Renato rodeia-se de amigos que foram pais há pouco tempo, mas que, ao contrário dele, não conseguiram ficar em casa com os filhos: “Ao início, a malta diz sempre que quer fazer isso mas depois queixa-se que não tem tempo”. Renato é, por isso, um caso de sucesso e alega que o segredo passa por ter muita paciência e força de vontade. E se há momentos em que fica farto de ter apenas como companhia uma bebé que lhe limita os movimentos e os horários, admite que, mal mete os pés fora de casa, é invadido pela saudade e pela preocupação.

Mas nunca é o mesmo tipo de preocupação que as mulheres experienciam, esclarece. “Acho que é diferente para as mães, elas têm outra maneira de ver as coisas. As mulheres são mais stressadas, mais preocupadas, e eu tento facilitar as coisas.” E dá o exemplo: “Quando está frio, a minha namorada mete a garota a parecer-se com um chouriço. Eu não o faço, a não ser que seja realmente necessário”, brinca.

Até então, a experiência de ter uma bebé em casa, totalmente dependente de si, está a ser do agrado de Renato que, aproveitando a deixa, faz um reparo. Tem pena que o sistema “esteja assim montado”, no sentido em que “os pais têm de despachar os garotos para a creche”. “Não trocava por nada estes momentos, são coisas das quais me vou lembrar mais tarde. Até me sinto privilegiado por poder estar com ela.”

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“Foi uma sorte conseguir dar apoio à minha mulher e à minha filha”

Aos 32 anos, Nuno Campos rendeu-se à paternidade e converteu-se num pai empreendedor que, sempre que necessário, muda as fraldas ao bebé lá de casa. O seu local de trabalho é em casa, à semelhança do que acontece com o escritor João Ricardo Pedro, pelo que tem mais tempo para estar com a pequena Olívia, de 18 meses. Porque se noutra vida foi enólogo, agora gere uma marca própria apostada em acessórios de moda a partir do escritório.

Mas vamos por partes. Tatiana, a mãe, aproveitou a licença de maternidade durante três meses, sendo que o companheiro de longa data estava a arrancar com a respetiva marca quando a filha nasceu. Esses foram os motivos por que a decisão surgiu de forma natural: dos três aos 11 meses de idade, Olívia ficou com Nuno, um pai (quase) a tempo inteiro. Ao 12º mês, a menina entrou na creche.

As lides domésticas relacionadas com a pequena passaram a ser acrescentadas à lista de tarefas de Nuno Campos, que ficou encarregue de preparar os pequenos-almoços de mãe e filha, de tratar da roupinha e dos banhos de Olívia, entre outras atividades. “Antes de mais, foi um privilégio ter esta oportunidade. Foi uma sorte conseguir dar apoio à minha mulher e à minha filha”, conta. A dificuldade maior pendeu para o lado da mãe: “Não é fácil ir trabalhar depois de apenas três meses. A minha mulher ainda hoje tem pena. Acho que a ligação que as mulheres têm às crianças é incrível.”

Ver a filha crescer foi uma surpresa diária e cada novidade era vivida com euforia, com Nuno Campos a enviar os relatos via SMS à namorada de há sete anos. A única coisa que representou um desafio maior, quando no papel de pai doméstico, foi o facto de Olívia não conseguir alimentar-se através do biberão — apenas o fez aos quatros meses. “Eram os tempos mais angustiantes, ficava muito stressado e tentava não dar nas vistas por causa dela.” De resto, Nuno fala com à vontade sobre os tempos em que era só ele e uma menina pequena e de pele enrugada.

“Quando ela foi para a creche senti falta dela mas, ao mesmo tempo, foi bom porque estava na altura de começar a trabalhar mais a sério”, recorda o pai com um misto de tristeza e alegria. Mas nem por isso deixou de se adaptar à rotina que entretanto se instalou: de manhã a bebé passa algum tempo com a mãe, que agora consegue chegar mais tarde ao trabalho, e depois vai para a escola. E é o pai quem a vai buscar todos os dias por volta das 16h00.

Volta e meia, quando o tempo o permite, pai e filha vão diretamente da escola para o paredão de Cascais, passear sob um ameno sol de inverno. “A Olívia já anda imenso de um lado para o outro. Quer ir mexer e brincar com os cães. Praticamente já não anda no carrinho”, conta o pai orgulhoso. Quem o vê passar, com uma menina numa mão e um carrinho na outra, num dia de semana à tarde, muito provavelmente fica a olhar. Nada que o incomode até porque, diz Nuno Campos, o importante é aproveitar uma fase que daqui a nada já passou.

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