O novo simplex urbanístico, que entrou em vigor com o objetivo de acelerar a construção e aumentar a oferta de casas no mercado imobiliário, trouxe o fim das chamadas “licenças de utilização” – um documento que até agora era essencial para se poder transacionar uma casa. Para quem compra um imóvel, era “mais um papelito” na lista dos documentos necessários para fechar o negócio, mas Jorge Batista da Silva, bastonário da Ordem dos Notários, acredita que era “um papelito” que dava importantes garantias de proteção a quem compra uma casa.
Em entrevista ao Observador, o bastonário acredita que era esse documento, emitido pelas câmaras, que garantia que não se estava a “comprar gato por lebre”. Agora, sem ele, quem compra uma casa arrisca ver-se a braços com “um mar de problemas”.
Jorge Batista da Silva diz-se “desconfortável” por não compreender porque é que o legislador decidiu “desproteger o cidadão comum” com uma alteração que, na prática, apenas irá beneficiar quem quer desfazer-se de casas sem que esteja tudo em ordem no licenciamento – designadamente os grandes fundos estrangeiros que compraram, a preços baixos, carteiras de ativos dos bancos e, agora, estão a despejar essas casas no mercado.
Quando entrou em vigor o simplex urbanístico, a Ordem dos Notários disse que aquele diploma permitiria a colocação de mais casas no mercado, mas que traria sérios riscos para os consumidores. Que riscos são esses?
Os riscos são claramente os de adquirirem um produto defeituoso. Todos nós sabemos, quando vamos comprar alguma coisa, como consumidores, como uma torradeira, que aquilo tem uma garantia que é determinada por lei. E, portanto, nós podemos reclamar do objeto que estamos a comprar. O legislador, com o simplex urbanístico, fez uma coisa bastante estranha, que foi regredir no tempo, aos anos 80 ou 90, quando se vendiam casas sem licença de utilização, sem sabermos se a construção estava autorizada pela câmara municipal e, portanto, sem saber se a casa não irá ser demolida caso a Câmara Municipal assim o entenda. E, também, sem saber se se tinha cumprido as normas urbanísticas, portanto que o telhado não me vai cair em cima a uma dada altura.
É isso que está em causa?
É isso que está em causa. Neste caso, o governo anterior e o legislador, com este diploma, uma das coisas que fez foi dispensar, no momento da compra da casa, a verificação da existência da licença de utilização ou a existência do cumprimento das normas urbanísticas – que era o que era feito pelo notário no momento da escritura pública. Todos aqueles que já compraram uma casa sabem perfeitamente que é necessário um conjunto de documentos. E é o notário que pede um papelito – que até já não devia ser um papel, devia ser um documento desmaterializado em formato digital – e verifica, em nome do comprador, se aquele móvel está ou não licenciado, ou se não está sujeito a qualquer licenciamento por ser antigo ou por ter qualquer uma destas condições. O legislador mudou as regras em nome de uma dita simplificação, mas não foi simplificação alguma porque não era a emissão daquele documento, que levava um dia útil, que atrasava a realização da escritura pública. O legislador, ao acabar com este controlo adicional, que era feito por um notário, retirou um direito aos cidadãos. É isto está em causa.
Dê-nos um exemplo prático de como é que isto pode correr mal.
É muito simples. Imagine que alguém compra uma casa, com dois andares, por exemplo, e, já depois de a comprar, a câmara um dia bate-lhe à porta ou envia-lhe uma carta a dizer ‘o senhor tem trinta dias para demolir o segundo andar, porque o segundo andar foi construído de forma ilegal e, portanto, tem 30 dias para o mandar abaixo’. E mesmo que a pessoa o queira legalizar, muitas vezes não é possível. Toda a gente sabe que existem umas regras municipais ou os planos diretores municipais que ditam aquilo que pode ser construído. Ou, pior ainda, a casa pode estar, por exemplo, num terreno de zona ecológica que tem de ser totalmente demolido e, portanto, a pessoa perde o dinheiro que gastou na compra da casa, porque não pode legalizá-la de maneira alguma, e ainda tem um prejuízo adicional porque tem de pagar a sua demolição.
Qual é a alternativa a isto? O que é que as pessoas podem fazer?
A alternativa é, no momento da compra, contratar alguém para ir à Câmara Municipal verificar se a casa cumpre com os requisitos urbanísticos ou não, depois contratar um advogado ou solicitador ou até pagar um notário para o fazer, para estar a verificar todo um conjunto de documentação que estava de forma sumária indicada na licença de utilização. Nós passamos de um processo extremamente simples, em que se requeria um simples comprovativo da existência de licença de utilização para um processo altamente complexo para o cidadão comum, e caro, que é o de, para verificar se aquela casa está licenciada e se não estou a comprar gato por lebre, tenho de contratar profissionais que o façam ou ir para uma câmara municipal pedir plantas e projetos urbanísticos, isto é completamente absurdo nos dias de hoje.
Mas disse que a licença de utilização é uma coisa que se obtém num dia útil. Isso é mesmo assim? Ou seja, não era mais um requisito burocrático que estava a atrasar a chegada de casas ao mercado de habitação?
Era mesmo assim. Aliás, posteriormente ao período da pandemia, muitas câmaras municipais começaram a adotar a desmaterialização desses documentos, ou seja, começaram a emiti-los em formato digital, portanto, nós até podíamos pedi-los eletronicamente e obtê-los imediatamente – em alguns casos, até eram de emissão automática. E os que não são de emissão automática, o que o legislador devia ter feito era ter dito: “Meus senhores presidentes de câmara, os senhores têm, por exemplo, 90 dias para fazer a desmaterialização, a pedido, dos documentos”.
Não eliminar a necessidade do documento em si…
Exato, porque isso é que é absurdo. É seguir pelo caminho mais fácil. É o legislador que, por estar pressionado pela questão da habitação, de repente, encontra a solução mágica e a solução mágica é desproteger os cidadãos. Seria a mesma coisa que o Estado chegar e, por exemplo, se não existissem estradas suficientes no país, permitir que todos pudéssemos conduzir de forma aleatória, sem respeitar os sentidos de trânsito para tentarmos chegar mais depressa aonde pretendemos ir, é exatamente a mesma coisa. O Estado, simplesmente, eliminou uma regra fundamental e que protegia os cidadãos apenas em nome de uma certa simplicidade ou facilidade, quando isso nem sequer era verdade.
Como é que explica ter sido tomada essa decisão?
Eu defendo que pode dever-se a desconhecimento do ponto de vista técnico. Porque o mesmo legislador manteve, por exemplo, nos contratos de promessa de compra e venda de casas a obrigatoriedade de exigirmos [os notários] a licença de utilização, isso continua na lei. Eu acho que existiu aqui não uma reforma sistematizada por parte do legislador, mas sim uma medida errada – errada quer nos seus fundamentos e mais errada ainda nos resultados que poderá ter, que são gravosos para todos os cidadãos.
É só esse o problema que vê no simplex urbanístico, é só essa questão da licença de utilização que vos preocupa?
Há aqui outros problemas que vão estar relacionados com o facto de a lei atual o que prevê é que, de alguma forma, tudo se baseia no princípio da comunicação às câmaras municipais e na responsabilidade do engenheiro responsável do projeto. E até aqui tudo bem, a Ordem é a favor disto, ou seja, a favor da responsabilização individual dos técnicos envolvidos. Isso faz parte de qualquer sociedade moderna. O que já está a ser discutido nas câmaras municipais – que, muitas delas, estão em pânico porque não sabem o que hão de fazer – é que, depois de ter saído o diploma legal, passado um pouco mais de um mês, saiu uma portaria regulamentar que vem dizer que as câmaras municipais, que até hoje apenas eram recetoras do documento, agora estão obrigadas a responder a todos esses pedidos.
É exequível?
Ninguém acredita verdadeiramente que as câmaras municipais vão responder em tempo útil e estamos a criar um vazio, em que se comunica às câmaras municipais e se dispensam os procedimentos, em nome da celeridade. Ou seja, se eu só tenho de comunicar e a câmara tem 10 dias para me responder, isto parece tudo bem numa ótica de princípio. Mas depois o legislador, como ficou um bocado em pânico com as críticas que lhe foram feitas, criou, através de uma portaria regulamentar, uma obrigação de respostas das câmaras, câmaras essas que não têm recursos humanos para o fazer.
Fundos estão a despejar imóveis no mercado, muitos sem licença de utilização
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O jornal Público noticiou, a 21 de abril, que os grandes fundos internacionais que compraram grandes lotes de imóveis (dados como garantia em execuções de dívidas) estão, agora, a colocá-los no mercado. O problema, alertavam as fontes citadas pelo jornal, é que em muitos casos estão em causa imóveis que não têm licença de utilização – podem ser transacionados livremente porque o novo simplex urbanístico dispensa esse documento que a Ordem dos Notários considera essencial. Jorge Batista da Silva diz não perceber qual é a vantagem para o cidadão de ter desaparecido a licença de utilização – só vê vantagens para estes grandes fundos e é por isso que o bastonário diz, em entrevista ao Observador, estar “desconfortável”.
Para responder aos cidadãos no prazo de 10 dias sobre se aprova um projeto?
Sim e, portanto, infelizmente, o diploma vai ter de ser clarificado, porque estamos numa zona cinzenta porque ninguém sabe muito bem o que acontece quando a câmara municipal não responde rigorosamente nada.
Não há um diferimento tácito?
Foi criada uma figura melhor que a do diferimento tácito, que é uma aprovação automática. Porque o diferimento tácito, do ponto de vista jurídico, é muito mais complexo. O que existe, na prática, é que, se a câmara nada diz, há uma aprovação automática, chamemos-lhe assim. Só que o problema é que a lei diz e continua a dizer a mesma coisa, isto é, que se existir alguma coisa ilegal no projeto, de alguma maneira, a qualquer momento a câmara municipal pode ir lá e dizer “atenção que o senhor tem aqui esta coisa que é ilegal no projeto”. Portanto, o que nós vamos ter é que as câmaras municipais não vão ter capacidade para apreciar rigorosamente nada, mas a qualquer altura o vizinho do lado vai dizer “olhe, o senhor tem ali a janela que está um bocado mais saída para a rua”. E, portanto, vai queixar-se à câmara, a câmara vai fazer uma inspeção, vai dizer que não está de acordo com o projeto, e, mais uma vez, lá vai a janela ou a varanda que vai ter que vir abaixo. É isto o resultado de o legislador fazer leis sem pensar naquilo que é a sua execução.
“Atentas” à crise. Quem são as empresas que ganham milhões com os “calotes” da banca?
Ainda sobre o simplex urbanístico, houve um aviso da Ordem de que esta nova forma de fazer as coisas, nomeadamente perder a licença de utilização, iria criar condições para que os fundos estrangeiros, que compraram muitas carteiras de crédito malparado e as casas muitas vezes inacabadas e empreendimentos inacabados, estão agora a conseguir aproveitar para vender esses imóveis sem a licença.
Já temos no mercado muitos imóveis em que aparece lá no anúncio a menção “sem licença de utilização”. Isso foi, claramente, uma das previsões que eu fiz, logo no dia a seguir a sair a lei – que este novo diploma, acima de tudo, iria salvaguardar não os interesses do cidadão mas, sim, os interesses dos grandes fundos. Os grandes fundos não precisam de ser ajudados pelo Estado, quem precisa de ser protegido normalmente é o cidadão comum, que não tem dinheiro para pagar a juristas e a engenheiros para saber, quando está a comprar um imóvel, o que é que está a comprar. Nós já tivemos este regime em Portugal, nos anos 80 e 90, em que não era obrigatório exibir a licença de utilização no momento em que se comprava ou vendia a casa. E é por isso que nós vemos aqui, por exemplo, nos arredores de Lisboa, tantas casas ilegais. As pessoas não conseguem fazer nada, as casas estão inacabadas, não estão ligadas às rede de esgotos… Todos os problemas que criámos nos anos 80 e 90 e que andámos décadas a legalizar é o que vamos ter novamente.
Por isso é que diz que é um passo atrás?
É um passo atrás porque esses fundos, neste momento, o que estão a fazer é despejar no mercado milhares de imóveis e os cidadãos, pelo problema de não terem casa, perante algo que está ligeiramente mais barato – e às vezes até têm um pé de meia porque emigraram ou porque receberam uma pequena herança – e são iludidos, veem aquele imóvel, ligeiramente mais barato e acabam por comprar aquele imóvel, não sabendo que muitas vezes estão a comprar um mar de problemas, porque é-lhes vendido o imóvel com uma cláusula expressa, em todos os casos, de que a pessoa compra o imóvel no estado em que está.
No estado em que está… Como se fosse aqueles leilões de insolvências…?
Sim, das insolvências ou das execuções de dívida… A pessoa compra aquilo como está. E quando se compra como está, volto a dizer a mesma coisa, pode vir abaixo no dia seguinte. Esses fundos, neste momento, estão a vender os imóveis com um ligeiro desconto. É legítimo, eles são operadores de mercado, compraram muito barato – toda a gente sabe o preço a que compraram aquilo, bastante baixo – e agora estão a vender quase a preço de mercado, com ligeiro desconto, ao abrigo deste diploma. Isto não faz sentido.
É preciso alertar as pessoas de que podem ser enganadas?
Sim, e estamos por exemplo a falar dos emigrantes. Desde há umas décadas para cá, o emigrante chegava e, quando se queria reformar, vinha a Portugal no mês de agosto, escolhia lá a sua casinha e pegava nas suas poupanças e comprava a sua casinha em Portugal. E sabia, como sabe em Espanha ou em França ou na Alemanha, que havia um notário que fazia uma escritura e que o notário via se os papéis correspondiam à casinha que estava a comprar. E estava sossegado. Mas deixou de estar. E porque é que deixou de estar? Até hoje ninguém do anterior governo me conseguiu responder a esta pergunta. O que é que se pretende ganhar quando se retira esta vantagem para o cidadão? E eu não vejo nenhuma vantagem numa lei para os cidadãos. E quando vejo que os únicos a lucrar com isto são os grandes fundos imobiliários, eu fico sempre desconfortável.
Como é que os notários têm lidado com isto?
Apesar destas leis, nós emitimos uma instrução de que os notários devem informar, no momento da compra e venda, se o imóvel está ou não licenciado. Pelo menos para que aquela pessoa tenha uma noção mínima daquilo que lhe pode acontecer se comprar aquela casa.
Mas a Ordem dos Notários participou na comissão que foi criada e que, no fundo, levou à elaboração desta legislação? Não alertou para estes problemas? Ou não foram ouvidos?
Nós participámos na audição pública, participámos e tivemos medidas acolhidas, do ponto de vista da simplificação administrativa. Eu não sou daqueles que dizem que o diploma tem de ser totalmente revogado. Isso é um defeito dos políticos portugueses, por vezes, que é desfazer tudo o que foi feito pelo governo anterior. Esse não é o caminho. O caminho é nós detetarmos aquilo que está errado e aperfeiçoarmos os diplomas legais. Então, tudo que seja a componente de desmaterialização – por exemplo, a criação de uma plataforma em todos os procedimentos urbanísticos que estão lá incluídos…
A nível nacional…
Nacional, sim. Que está lá prevista só para daqui a uns anos…
2026…
Mas não devia ser para 2026, devia ser para o final do 2024. Nós temos de parar de pensar em projetos, já nem falo no facto de a portaria regulamentar atirar partes da execução do projeto para 2030… No mundo em que vivemos, em que temos um conflito militar na Europa, nós estamos a tentar adivinhar o que é que vamos fazer em 2030… Tudo o que seja a simplificação e desmaterialização, a Ordem dos Notários está a favor.
Por exemplo…
Por exemplo, uma das medidas que é simples e que está a favor e que já está a ter um impacto positivo é que se eu tenho um imóvel comercial, uma loja, no rés do chão, e, antigamente, para a poder transformar em habitação estava dependente de chegar a acordo com todos os meus vizinhos. E todos nós sabemos que nessa coisa de chegar a acordo com todos os nossos vizinhos… há sempre algum vizinho em que um dia estávamos os dois maldispostos e cruzámo-nos lá no corredor e aquilo correu um pouco mal… E portanto, muitas vezes, por causa disso os imóveis deixavam de servir para habitação – e hoje em dia podem.
Como?
Agora eu posso requerer à câmara municipal e, depois, converter aquilo num imóvel para habitação. Isto é extremamente positivo e a Ordem propôs isso. Há outras medidas, no âmbito do Mais Habitação, que não foram acolhidas, sobretudo na vertente fiscal.
Tais como?
Nós defendíamos, principalmente na aquisição da habitação própria permanente, para os jovens, que existisse uma redução acentuada do IMT – e, também, porque não do próprio imposto de selo – porque considerámos que muitas vezes o valor que o jovem precisa para dar de entrada para a casa (porque os bancos, como sabe, exigem uma parte do dinheiro) comparando com aquilo que as pessoas estão a pagar neste momento em IMT…
É mais do que a entrada…
É mais de que entrada. E estão a adiar a compra da casa, para um casal jovem, em cinco anos.
Mas isso está no programa de governo.
Está no programa deste governo. Mas não foi acolhido como uma proposta pelo anterior governo. No simplex urbanístico nós achamos que devemos pegar nele, reintroduzir a obrigatoriedade de verificação de cumprimentos das normas urbanísticas, com relativa facilidade, mas colocar a obrigação de ser feito de forma desmaterializada. O que tem de ser feito neste momento é exatamente isto: pegar nos diplomas atuais e tentar encontrar soluções melhores para os cidadãos do ponto de vista da aquisição de casa.
"Na pandemia houve gente que esperou seis meses para se conseguir divorciar"
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A Ordem dos Notários quer que os casamentos e divórcios passem a poder ser feitos fora das conservatórias, isto é, num notário. “Há uma série de países onde isso acontece e não é propriamente algo que nós defendemos como corporativo, quem nos pede isto são os cidadãos”, diz Jorge Batista da Silva.
“Nós atendemos mais de dois milhões de pessoas por ano e já vamos passar os 500 cartórios este ano. Somos uma das maiores redes jurídicas de serviços de proximidade e somos serviços público”, diz o bastonário da Ordem dos Notários, lembrando que, “durante a pandemia, os cartórios notariais fecharam dois dias. Dois dias só”.
“Nós fomos fazer testamentos aos hospitais porque o país não podia parar e nós ajudámos a que o país não parasse”, diz Jorge Batista da Silva. “E nós queremos fazer casamentos e divórcios, porque as pessoas na pequena localidade não se podem casar ou divorciar só quando têm alguém para fazer o serviço”.
“Durante a pandemia houve pessoas que tiveram de esperar seis meses” para se divorciarem. “Imagine-se alguém que se quer divorciar, marido e mulher, porque não se entendem, às vezes até em casos com violência doméstica, e que estão na mesma casa, porque não podem sair enquanto não houver divórcio – até para fazerem partilhas e ver as questões da casa com o banco, etc., e são obrigados a conviver seis meses porque não conseguem fazer um divórcio”.
“Isto tem de acabar, e tem de acabar em nome dos cidadãos”, atira.
Já falou com o novo governo para sugerir alterações no simplex urbanístico?
Nós vamos, durante o mês de maio, enviar as nossas propostas ao senhor ministro da Habitação. Muitas vezes há uma espécie de corrida de 100 metros, quando um governo toma posse, por parte das várias instituições, no sentido de ver quem é o primeiro a apresentar as propostas. E eu, cada vez mais, porque já sou bastonário desde 2017, acho que nós devemos deixar os governos conhecerem os cantos à casa e só depois apresentar as propostas.
Mas que propostas vai apresentar, pode revelar algumas?
Nós temos alguns pontos que são extremamente claros. Um deles é a questão da interoperabilidade. Nós defendemos, no âmbito da habitação e de forma transversal no governo, que toda a informação que está depositada em entidades públicas possa circular, com o consentimento do cidadão. Eu dou rapidamente um exemplo. Se eu quero uma licença de utilização para comprar uma casa ou se preciso de certidão de nascimento do vendedor, eu consigo com um mero consentimento eletrónico dele receber uma autorização. E não tem de pedir certidões nenhumas. Isso é uma questão fundamental para desburocratizar não só a parte da habitação e do urbanismo e do notariado, mas todo e qualquer setor.
E, dizia há pouco, também propostas na área fiscal…
Na vertente fiscal, nós temos dois pontos fundamentais. Um é a questão da aquisição própria e permanente, em que nós defendemos isenções e reduções acentuadas na aquisição da primeira habitação. É fundamental para os jovens poderem aceder à sua habitação e conseguirem ser financiados através de créditos hipotecários. E, uma segunda questão, que também achamos muito importante, que as pessoas às vezes não têm noção, é abordar a enorme discriminação relativamente ao interior do país. No interior do país, onde as pessoas continuam a construir a sua casinha no seu terreno, quando vão comprar o seu terreno, às vezes terreno barato, a taxa que se paga é de 6,5% de IMT, mais 0,8% de imposto de selo. Ou seja, 7,3% do preço da aquisição de um terreno, nem que ele só custe 50 mil euros – que não é um terreno para a casa de uma pessoa rica – 7,3% do preço de imposto… E é discriminado face a alguém que, compra, por exemplo, um apartamento. Esta discriminação não faz sentido nenhum.