A competição Innovation Station 2019 chegou ao fim, mas Solange Farinha, diretora de Cliente & Inovação da Auchan Retail Portugal, prefere dizer que “acabámos de começar”. E, de facto, é mesmo isso que se percebe que vai acontecer, depois de ouvirmos os seis vencedores deste programa de inovação e empreendedorismo promovido pelas subsidiárias portuguesas da Auchan Retail, Ceetrus e Oney Bank, em parceria com o Centro para a Inovação e Empreendedorismo da Nova School of Business and Economics (Nova SBE). Reunidos no dia 24 de junho no campus desta faculdade, em Carcavelos, para assinalar o encerramento da iniciativa, todos – startups e parceiros – foram unânimes em fazer um balanço “muito positivo” do programa iniciado em novembro do ano passado. Neste momento, deixaram antever o que aí vem – ou pode vir, caso os projetos avancem mesmo depois da fase piloto – com a aplicação prática das soluções aos contextos reais e às necessidades concretas sentidas pelas empresas promotoras.
Soluções reais para necessidades reais
Uma das características diferenciadoras desta iniciativa reside precisamente no facto de terem sido previamente identificadas questões específicas que a Ceetrus, a Auchan Retail e o Oney Bank (empresas do grupo Auchan em Portugal) pretendiam responder recorrendo à inovação. Melhorar a relação com o consumidor, desenvolver a banca de retalho ou oferecer uma experiência integrada ao cliente estavam entre as necessidades sentidas e colocadas como critério de seleção. Apresentaram-se a concurso 94 startups de diversos países, das quais 36 fizeram pitches em Carcavelos. Seguiu-se uma fase de matchmaking, selecionando-se as soluções e emparelhando-as com a empresa mais adequada. Às startups escolhidas foi atribuída uma bolsa no valor de 10 mil euros, destinada a cobrir os custos e tempo dedicado ao projeto.
Foram seis as empresas vencedoras, as quais se lançaram de imediato num trabalho de codesenvolvimento ao longo de dez semanas. O objetivo? Tornar as soluções o mais adequadas possível ao cliente, à cultura da organização em causa e à realidade no terreno. Para tal, foram envolvidas equipas das próprias empresas promotoras, resultando numa experiência inovadora para todos. Isso mesmo é-nos dito por Christophe de Pompignan, diretor-geral do Oney Bank em Portugal, que destaca o impulso que a iniciativa levou para dentro da própria instituição que dirige: “Foi fundamental a dedicação das equipas a este projeto e tal refletiu-se no sucesso do Innovation Station. Os colaboradores do Oney Bank estão muito contentes, a nível pessoal e profissional, pois este desafio ajudou-nos a todos a refletir e a crescer. Aqui falámos verdadeiramente de inovação e este é o nosso mote no Oney em Portugal, onde estamos presentes há 25 anos. É um privilégio podermos acompanhar o crescimento destas ideias e impulsionarmos o desenvolvimento das startups.”
Iniciativa ganhadora
“Iniciativa extremamente ganhadora” é como Solange Farinha encara o Innovation Station 2019. “A inovação tem sido uma constante no nosso percurso. Para isso, é imprescindível permanecermos em contacto com aqueles que vão fazendo coisas diferentes e novas. O próprio facto de virmos para este campus da Nova SBE inspira-nos, porque voltamos a sentir-nos nesta fase de estudante, cheios de curiosidade e abertura”, afirma a responsável.
Da mesma forma, Filomena Conceição, diretora de Marketing, Inovação & Digital da Ceetrus, avalia de forma “muito positiva” a iniciativa e destaca a “lógica de aceleração do ecossistema de inovação, bem como o mentorship”. “Trabalhamos juntamente com as startups no desenvolvimento destas suas soluções, contribuindo para a sua própria evolução. Neste seguimento estamos a acrescentar valor à sua atividade, pois é quase o passar da teoria à prática”, reforça. Esta relação de permuta é igualmente identificada como uma vantagem por Solange Farinha: “É muito interessante ver pessoas, que são completamente exteriores ao nosso mundo, de repente falarem a mesma linguagem que nós e nós também já estarmos a falar a linguagem delas. Esta troca de experiências é também algo que me parece um ganho.”
Concentrar valências e acelerar implementação
A acompanhar o processo desde o primeiro dia esteve o Centro para a Inovação e Empreendedorismo da Nova SBE, Venture Lab. Joana Geraldes Barba, project manager, reconhece que o programa “foi realmente muito benéfico tanto para a Ceetrus, Auchan e Oney Bank como para as startups”. Porquê? “Porque houve aqui uma possibilidade de concentrarmos várias valências e podermos acelerar a implementação dos pilotos”, diz.
Desempenhando sobretudo um papel agregador ao longo de todo o programa, a Nova SBE vai ainda acompanhar a fase de transição entre os projetos-piloto e a sua implementação posterior, deixando depois startups e empresas entregues à relação estabelecida ao longo destes meses todos.
Mas em que é que as seis startups vencedoras se distinguiram das outras dezenas que não foram selecionadas? Segundo a project manager, “foi, além do valor acrescentado e da inovação trazida, a possibilidade de conseguirem obedecer à regra de se fazer um piloto em tão pouco tempo, por isso, tinham de ser empresas que estivessem mesmo preparadas”. Além disso, “também era importante responderem a desafios reais e atuais destas três empresas”, conclui. Fomos, pois, falar com cada uma das startups para percebermos a inovação ganhadora que propuseram ao Oney Bank, Ceetrus e Auchan Retail.
Um assistente virtual ao dispor de cada cliente
A Visor.ai candidatou-se com “uma plataforma que permite às empresas criarem e gerirem os seus próprios chatbots, isto é, assistentes virtuais ou sistemas de automatização de conversas de chat”. Quem o explica é Gonçalo Consiglieri, um dos três sócios da startup lisboeta criada em 2015. A codesenvolver a solução com o Oney Bank, refere que “o objetivo principal é implementar em empresas que tenham um grande volume de contactos e tentar assim automatizar as ações que são mais simples e repetíveis”, como o apoio ao cliente. “A ideia é que o mesmo canal terminal de chat faça inicialmente uma triagem automática. Se conseguir responder e tratar de tudo, ótimo. Se não conseguir, então passa para um humano. Em termos estatísticos, ao fim de algum tempo de trabalho é possível chegar a valores de cerca de 70% de automatização, ou seja, sete em cada dez atendimentos serão automatizados e os outros três passam para humano”, pormenoriza.
Quanto à importância de terem sido selecionados, Gonçalo Consiglieri salienta o facto de trabalharem com o Oney Bank “num ambiente que é win-win”. “O Oney Bank tem a possibilidade de experimentar e testar o nosso sistema e perceber se terá interesse em ser nosso cliente e nós acabamos por estar a fazer um trabalho muito próximo e muito direto com o Oney”, sintetiza. Atualmente, a Visor.ai já trabalha com 26 clientes aos quais disponibiliza a sua plataforma que funciona por módulos.
Compreender o comportamento do consumidor
A proposta da Heptasense, outra das startups vencedoras do Innovation Station 2019, passa por “disponibilizar um software para câmaras de segurança que consegue perceber o comportamento das pessoas, os fluxos e fazer uma análise daquilo que as câmaras de segurança estão a ver”. De acordo com Ricardo Santos, um dos responsáveis da empresa criada em 2017, o projeto-piloto está a ser implementado no Centro Comercial Alegro Setúbal e daqui a três meses será levado para o Alegro Alfragide. Com a Auchan Retail será desenvolvido um projeto-piloto nos supermercados para perceber o comportamento dos clientes e detetar roubos.
Ricardo Santos destaca as vantagens da participação no programa, apesar de já terem diversos clientes, em Portugal e no estrangeiro: “Foi bastante bom, deu para aprender imenso sobre este tema. É uma oportunidade imensa, porque eles estão preparados para gastar e para resolver o problema. É muito mais rápido assim”, admite, realçando a interação mantida não só com os outros participantes, mas também com a Nova SBE e com os vários departamentos da Ceetrus, empresa que atua como investidora, promotora e gestora imobiliária de projetos mistos, ocupando o segundo lugar no ranking nacional das empresas proprietárias e gestoras de centros comerciais de média/grande dimensão.
E se a vida real fosse um jogo?
Esta poderia ser uma das premissas da Fractal Mind, a startup portuguesa criada em 2015 especializada em gamification. “Usamos as ferramentas e as aprendizagens dos jogos para incentivar comportamentos e transformar ambientes de trabalho”, esclarece Manuel Pimenta, Human Experience Sherpa & CXO da Fractal Mind. “Levamos isto às organizações para as ajudar a transformar a experiência do colaborador”, acrescenta, referindo que no caso deste programa de empreendedorismo o objetivo é incentivar os colaboradores da Auchan Retail e Oney Bank a angariarem mais clientes para o Cartão Jumbo. O produto que desenvolveram chama-se Outliers e a intenção é exatamente “trazer à tona aqueles que fogem à média, reconhecê-los e recompensá-los”.
Embora já tenham participado noutras iniciativas do género, afirma que “este foi o primeiro programa em que o acompanhamento e a abertura das organizações foram totais”. Além disso, aponta como mais-valias a “imposição do ritmo” e ainda o acesso a “duas grandes organizações” que trabalham em negócios que conhecem bem. O projeto-piloto está a decorrer durante este mês e no próximo, esperando-se depois a avaliação dos resultados para se saber se as empresas irão, ou não, adotar a tecnologia.
Falar com um robô de voz humanizada
E se quando ligar para uma linha de apoio ao cliente for atendido por um robô? É esta a proposta da startup brasileira 2CX, que participou no Innovation Station 2019 para revolucionar a forma como o atendimento de voz é feito. Rodrigo Grilo, sócio da startup, veio de São Paulo propositadamente para o programa, juntando-se ao colega e também sócio Alexandre Dalmax, que já vive e trabalha em Portugal. “O cliente liga e a gente substitui o IVR [interactive voice response] atual por um robô humanizado, dando um pouco mais de cuidado ao cliente final e fazendo conexão sem necessidade de derivar para o atendimento humano”, revela Rodrigo Grilo. Outra das mais-valias deste produto é notada por Alexandre Dalmax, segundo o qual “é possível ter os dados estatísticos de todo o processo de atendimento”, ou seja, “entender quais são os clientes que estão satisfeitos e os que não estão, para que ações sejam remediadas ou desenvolvidas para melhorar o atendimento e para atrair novos clientes”.
A solução está a ser codesenvolvida com o Oney Bank – banco especialista em produtos e serviços financeiros inovadores, presente em Portugal desde 1994 – mas a Auchan Retail não lhe é alheia, com Solange Farinha a sublinhar a inovação que aqui está em causa: “É bom vermos que em Portugal estamos a trabalhar com tecnologias de topo a nível mundial. Numa altura em que as empresas ainda estão a desenvolver soluções no chat escrito, eles já estão no apoio vocal de uma forma completamente humanizada. E a resolverem problemas que outras grandes tecnológicas ainda não conseguiram solucionar, como termos um vocal assistant em português de Portugal.”
A loja não tem o produto? Não há problema
A plataforma de entregas rápidas YOUSHIP “pretende dar a possibilidade aos lojistas de pedirem um artigo quando este não se encontra em stock na loja”. A codesenvolver a solução para a Ceetrus, o projeto-piloto deverá arrancar nos próximos meses no Centro Comercial Alegro Alfragide e promete, entre outras coisas, ajudar à “retenção do cliente”. Segundo Leonel Simão, sócio da YOUSHIP, “muitas vezes as lojas não têm forma de pedir a outra loja da mesma marca um artigo de forma rápida, mas com esta nova solução podem requerer que um determinado artigo chegue à loja dentro de uma hora, por exemplo”. “Outra vantagem é que os clientes podem escolher receber em casa a uma hora previamente marcada”, explica, reforçando que “assim há um aumento da satisfação dos clientes”.
Embora a YOUSHIP já se encontre a desenvolver esta solução há dois anos, tendo-a já implementada noutros clientes de grande dimensão, Leonel Simão frisa a importância de terem tido a oportunidade de “trabalhar com um novo cliente, que tem uma forma de relacionamento totalmente distinta”.
O GPS como ajudante de localização de produtos
Tendo participado na sessão de encerramento via Skype, Mickael Carvalho, CEO da Find & Order, deixa clara a importância da solução com que se apresentou a concurso. “Oferece uma solução de mapeamento 3D para lojas e centros comerciais”, diz-nos, referindo que o produto “integra uma solução GPS de interior baseada no campo magnético natural da Terra sem infraestrutura, sem ser necessário ativar nada no smartphone e com uma precisão de 30 centímetros”. “O objetivo é orientar os visitantes, aumentar a produtividade dos colaboradores, por exemplo, na recuperação de produtos, e permitir que os retalhistas saibam exatamente onde os seus produtos estão localizados nas lojas”, detalha. O projeto-piloto arrancou no Jumbo da Amadora há três meses, encontrando-se agora em fase de finalização.
Criada em Paris há quatro anos, a Find & Order tem aqui o seu primeiro projeto internacional. “Trabalhar com a Auchan na coconstrução de uma inovação ao serviço do retalho é para nós um forte compromisso, porque nos permitirá propor uma solução o mais adequada possível aos desafios do retalho”, afirma Mickael Carvalho.
Iniciativa para continuar
Da parte dos parceiros envolvidos no Innovation Station 2019, a iniciativa tem tudo para se repetir. “O nosso objetivo é continuar a apostar em programas de inovação como este”, avança Filomena Conceição que, ainda assim, admite que “há sempre espaço para melhoria”. Também Solange Farinha acredita na continuidade do programa, mas defende a necessidade de concluir os processos: “Terminar o que iniciámos para depois iniciar um novo ciclo, porque é também importante sermos consequentes com estas ideias e depois integrá-las no nosso negócio.” “Acreditamos que iniciativas destas trazem benefícios para todos: jovens empreendedores, empresas e sociedade civil, pelo que continuaremos a apostar na inovação e no empreendedorismo”, sublinha Christophe de Pompignan.
Para a Nova SBE, o objetivo passa por continuar a replicar a iniciativa. “Esta foi a primeira edição daquilo que podem vir a ser também outras edições no futuro”, considera Joana Geraldes Barba, antecipando que a experiência entretanto vivida será vertida em valor. “Há muitas coisas que aprendemos, muita coisa que queremos melhorar e fazer diferente”, diz, salientando que “para edições futuras poderíamos pensar em também introduzir alunos, que é um valor muito importante e faria todo o sentido”.
Recorde-se que o Innovation Station surge na sequência de um outro programa – o Startup Scan, realizado entre 2016 e 2017. Esse foi o primeiro projeto deste tipo desenvolvido pelas empresas da Auchan Holding, tendo sido avaliados 150 projetos e ouvidas mais de 90 apresentações de startups.