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JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

"Integrar um governo da AD? Partidos existem para exercer poder. Se não, éramos um think tank"

Em entrevista ao Observador, Bernardo Blanco assume que a Iniciativa Liberal tem vontade de integrar uma coligação governamental no futuro. Para já, é tempo de oposição e o Orçamento não convence.

Assume que é “praticamente impossível” votar a favor do Orçamento do Estado para 2025 e sugere que a Iniciativa Liberal está mais inclinada a votar contra o documento. A decisão, sugere, está muito dependente do grau de influência que Pedro Nuno Santos vier a ter no desenho final do documento, sendo que, no limite, os liberais estarão dispostos a optar pela abstenção. Nada mais. “É praticamente impossível votarmos a favor de um Orçamento que mantém a despesa pública do Estado no nível em que o PS deixou e em que praticamente a carga fiscal fica igual. Não foi nisso que a maioria dos portugueses votou”, diz.

Em entrevista ao Observador, no programa “Vichyssoise”, Bernardo Blanco, deputado e vice-presidente da Iniciativa Liberal, não tem grandes dúvidas sobre o que deve acontecer se as negociações entre Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos falharem: “Se não houver Orçamento, tem de haver eleições”, antecipa, mesmo que isso implique um risco eleitoral para a Iniciativa Liberal, que ficaria ainda mais pressionada pelo peso do voto útil à direita. “É a vida democrática normal. Fazemos o nosso melhor, apresentamos as nossas ideias, não vamos por calculismos”, nota.

Quanto à evolução natural do partido, com eleições agora ou mais tarde, Blanco acredita que passará, preferencialmente, por integrar um governo da Aliança Democrática. “Os partidos existem também para exercer poder, não é só para fazer oposição ou só para lançar ideias. Se não, éramos um think tank. Se o partido não existe para depois tentar implementar as suas ideias, então não existe para nada.”

"Críticas de Mayan Gonçalves? Não vejo qual é o culto da personalidade que existe. Mas percebo: às vezes é preciso ter notícias e por isso dizem-se coisas, diria que não muito honestas. Não parecem muito refletidas, mas percebo que é preciso. Acha que estava apenas à procura de atenção. Não vejo nenhum fundamento"

“É praticamente impossível votarmos a favor deste Orçamento”

A semana política fica naturalmente marcada pela reunião entre Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos. Acredita que o Governo chegará a acordo com o Partido Socialista?
Bem, se acredito ou não, também implicava que tivesse alguma intenção. A minha intenção é mesmo que o Orçamento passe, se for sem o PS lá metido pelo meio e com alterações muito profundas, melhor. Considero mesmo que para o país era positivo não haver eleições agora, deixar que as medidas do Governo — algumas delas com as quais nós concordamos — tenham e produzam algum efeito, porque também estarmos aqui de eleições em eleições de seis em seis meses… e já sabemos também que parte da administração pública durante esse período de eleições, de certa forma, pára um pouco. Parece-me que não traz nada de positivo ao país. A única coisa positiva se calhar é não poderem passar algumas leis no Parlamento, que eu acho que até afetam mais a economia do que outra coisa. Às vezes até vale mais estarmos quietos, mas de qualquer forma penso que seria positivo o Orçamento passar.

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Mas esse cenário que traçou de preferir que o PS não esteja metido lá no meio, implica que o Orçamento do Estado seja aprovado com um voto a favor do Chega. A IL ficava mais confortável se o Orçamento fosse aprovado com um voto do Chega do que com um voto do Partido Socialista?
A mim é totalmente indiferente quem é que vota a favor de um documento com o qual eu concordo, se for esse o caso. Isto é o mesmo para as iniciativas legislativas que são lá votadas. Se um projeto tiver o voto do PCP e do Chega, se eu concordar com o conteúdo, é totalmente indiferente quem é que vota. Aqui o que me preocupa mais é exatamente o conteúdo com o qual nós, obviamente, ainda não tendo visto o documento, pelos números que o Governo já nos deu, estamos bastante preocupados. E isto porque são números de contas públicas, em termos de despesa pública e de receita fiscal, muito parecidos com aqueles que têm sido os números do Partido Socialista. E, tendo em boa consciência, votado contra esses orçamentos do PS, não podemos agora ter um sentido de voto favorável. Vamos ver o que é que o Governo nestes 15 dias também faz.

Voltando ao cenário A, aquele em que imaginamos que Luís Montenegro está a trabalhar, o acordo com o PS. A Iniciativa Liberal já ameaçou chumbar o Orçamento do Estado se o Governo ceder em determinadas matérias ao Partido Socialista. Portanto, daqui se depreende que se Luís Montenegro e Pedro Nuno Santos chegarem a acordo, a IL votará contra o Orçamento, é isso?
Não é tanto pelo acordo em si ter uma assinatura do PS, é mais uma vez pelo conteúdo. Se a mim já me parece difícil, muito difícil, nós podermos aceitar um orçamento ainda sem alterações do PS, tendo as contas públicas a níveis muito parecidos com aqueles dos últimos anos do Partido Socialista… Se em cima disso ainda vêm alterações efetuadas pelo PS, que certamente não serão para o lado que nós queremos, de menos despesa do Estado e de menos impostos, parece-me ainda mais difícil, obviamente, ter essa aprovação.

Falando das duas questões que mais polémica têm levantado, ou pelo menos têm sido mais debatidas, o IRS Jovem e o IRC — bem sei que no caso do IRS Jovem a IL também está contra — ainda assim, se o acordo entre o Governo e o PS existir e houver cedências do Governo nestas duas matérias, a IL vota ou não contra o Orçamento?
Não consigo dar essa resposta sem saber se o IRC e o IRS Jovem estarão no Orçamento ou fora dele. Inicialmente iriam ser votados antes e fora dele, pelo menos foi isso que se tinha dado a entender. Agora o tempo está a passar, os agendamentos possíveis estão a acabar e por isso já  podem vir dentro do Orçamento. E isso obviamente também condiciona a discussão, porque vamos imaginar que a descida de IRC não é tão grande como inicialmente prevista, mas mesmo assim há uma descida. Nós obviamente somos favoráveis a essa descida mesmo, que não seja o nível tão ambicioso como nós queremos. Não a vamos impedir, vamos
aprová-la. Mas isso é se for votado à parte, se for dentro de um orçamento com o qual nós genericamente discordamos, onde a medida também depois não pode ser votada ponta a ponta…

Há uma garantia que podem dar: a favor não vão votar. Ou há essa possibilidade aberta?
Obviamente, faltam ainda cerca de 15 dias e esperemos que o Governo ainda mude as suas intenções. Mas tendo em conta os números que o Governo nos deu há duas semanas, vejo com muita dificuldade, praticamente impossível, votarmos a favor de um orçamento que mantém a despesa pública do Estado no nível em que o PS deixou e em que praticamente a carga fiscal fica igual. Não foi nisso que a maioria dos portugueses votou, a maioria dos portugueses votou numa mudança. E nós, não tendo aprovado os orçamentos do Partido Socialista, não podemos agora aprovar um orçamento em que o nível de contas públicas é exatamente igual.´

A Iniciativa Liberal apresentou um conjunto de propostas esta semana, o Governo deu sinal de estar disposto a aprovar alguma?
Sim, posso anunciar que a nossa intenção é apresentarmos este primeiro pacote, no início da próxima semana apresentaremos um segundo que enviaremos também ao Governo, depois o Governo apresentará o Orçamento e nós apresentaremos um terceiro e último pacote durante a especialidade, que já serão propostas de alteração ao documento em si. Em relação a este primeiro pacote, a parte dos profissionais liberais e dos trabalhadores independentes, por aquilo que fomos falando com o Governo, estão bem encaminhadas. São medidas que, obviamente, têm menos impacto nas contas públicas, mas diria que boa parte delas têm impacto na vida de milhares de pessoas. São importantes. Em relação às medidas a nível do IRS, por exemplo, essas, como é óbvio, vejo com muito mais dificuldade e também tivemos esse feedback.

Não há algumas propostas que sejam um mínimo para que a IL possa abster-se no Orçamento?
Não fizemos essa conta. Há obviamente medidas que são muito mais estruturais e que se fossem aprovadas o nosso sentido de voto mudaria. Mas dando o exemplo claro do modelo de IRS: sabemos que o Governo não o aprovará. Mesmo assim, se conseguimos aprovar algumas medidas — ainda que poucas — nos Orçamentos do PS, ficaria muito admirado se não conseguíssemos agora com o Governo do PSD.

"Não tenho qualquer intenção, pelo menos por agora, a curto prazo, de me candidatar a presidente. Já disse várias vezes que no futuro me parece que seria um desejo, mas agora não tenho qualquer intenção de o fazer"

“Se não houver Orçamento, tem de haver eleições”

O cenário das eleições antecipadas não está afastado. A IL, aliás, tem cartazes em que sugere que o PSD é um partido “toranja” e, portanto, muito parecido com o PS. Luís Montenegro tem sido igual ou pior do que António Costa?
Acho que não tem sido o pior. Mas a questão é outra. Bem sei que o Governo não tem maioria, mas não se viu ainda nenhuma intenção de fazer nenhuma reforma estrutural. Em nada. Quer dizer, o IRS, houve esta invenção do IRS Jovem, é certo, mas a nível de IRS para todos os portugueses praticamente não muda. O país vai continuar a ter um recorde de número de escalões. A nível de carga fiscal vai ficar mais ou menos igual. A nível de despesa pública vai ficar mais ou menos igual. Temos 400 e tal entidades nos órgãos consultivos do Estado e não se vê nenhuma intenção de reformar isso. A nível do setor empresarial do Estado não há nenhum plano, nenhuma lista de privatizações a fazer. A nível de Segurança Social não há nenhuma intenção de reformar um modelo num país extremamente envelhecido, onde os jovens vão ter, se calhar, metade do seu último salário na primeira pensão.

Mesmo assim, consegue dizer que Luís Montenegro está a ser melhor primeiro-ministro que António Costa. Ou não consegue?
Consigo, porque há algumas medidas que, embora não sejam reformas como gostaríamos, são medidas que achamos que vão no bom caminho. Por exemplo, na Saúde: não há nenhuma intenção de mudar o sistema como gostaríamos, mas pelo menos há pequenas melhorias no sistema, como, por exemplo, as USF tipo C, de que andamos a falar há anos. Na Habitação, houve alguns anúncios de que se iria usar devolutos do Estado, por exemplo, que é uma medida que também andamos a defender há muito tempo. Não são as reformas que gostaríamos, mas há uma ou outra medida que vão num sentido que nos parece positivo.

Se este impasse político se mantiver não seria benéfica uma clarificação eleitoral?
Se não houver Orçamento, tem de haver eleições. Não pomos outros cenários em cima da mesa.

E o partido não seria vítima do voto útil, como aconteceu, por exemplo, nas últimas eleições?
Podia ser, mas há duas coisas que acho que são muito importantes: não me parece que haja condições para governar um país em duodécimos no contexto de um governo minoritário. Por isso, é melhor haver eleições. Em segundo lugar, em relação ao voto útil, temos o sistema eleitoral que temos — mais uma vez, PSD e o PS não o querem reformar porque são beneficiados por ele –, e agora não há nada a fazer. Respeitamos as regras, não as querem mudar e têm a maioria, temos de as aceitar. Se em eleições perdermos com isso, é a vida democrática normal. Fazemos o nosso melhor, apresentamos as nossas ideias, não vamos por calculismos. Se fôssemos pelo calculismo, mais valia não existirmos ou irmos sempre coligados como outros vão. Prefiro ir sozinho e vender as minhas ideias ao máximo. Se perdermos votos devido ao sistema que temos, temos de aceitar e trabalhar mais para ter mais resultados e mudar essa regra.

Existe quem defenda que uma solução para o impasse seria a Aliança Democrática e a IL conseguirem um resultado em futuras eleições que permita uma maioria parlamentar. Essa seria uma solução a considerar pela Iniciativa Liberal? E em que termos? Integrar o governo?
Claro que acho que o objetivo principal é esse. Se a AD e a Iniciativa Liberal tiverem uma maioria parlamentar, acho que há condições para governar muito melhor e para o país poder fazer as reformas de que tanto precisa. Acho que esse seria o cenário desejável e isso implica também que cada um trabalhe mais para convencer mais portugueses a deixarem de votar quer no PS, quer no Chega, essencialmente, e também para tentar que algumas pessoas que, se calhar ainda estão na abstenção possam votar numa alternativa de governo.

Isso passaria sempre pela integração da Iniciativa Liberal num futuro governo da AD?
Sim. Depois dependeria sempre daquilo que o próprio PSD aceitasse.

Se a IL avançar para esse cenário de uma  coligação governamental, não corre o risco de se tornar uma espécie de CDS?
Os partidos existem também para exercer poder, não é só para fazer oposição ou só para lançar ideias. Se não, éramos um think tank. Não acho que ir para o Governo e assumir responsabilidades governativas é uma forma de irmos desaparecendo. Acho que é totalmente normal os partidos que vão para o Governo, ao fim de algum tempo, de um ciclo ou dois, serem castigados ou ir diminuindo a sua expressão. Mas, mesmo que isso acontecesse, se o partido não existe para depois tentar implementar as suas ideias, então não existe para nada. Não vale a pena estar com esse tipo de calculismo no futuro, se daqui a x anos, vamos perder votos ou não. Queremos implementar as nossas medidas.

“Líder da IL? No futuro, parece-me que seria um desejo. Não agora”

É candidato a vice-presidente da Aliança dos Liberais e Democratas pela Europa, é insistentemente apontado também com insistência à futura liderança do partido. É um caminho que admite para o futuro?
Bem, em relação à primeira questão, há uma tentativa que acho que está a ter sucesso de nos darmos a conhecer e de me dar a conhecer. Vi aqui uma oportunidade para nos promovermos, também para me dar a conhecer, para promover alguma discussão dentro do ALDE para que haja algumas mudanças, porque achamos que as prioridades não têm sido as corretas. É uma candidatura mais para pormos o primeiro
pé na porta.

Bom, mas dentro da IL não precisa de pôr o pé na porta.
Não vou fugir dessa questão. Não tenho qualquer intenção, pelo menos por agora, a curto prazo, de me candidatar a presidente. Já disse várias vezes que no futuro me parece que seria um desejo, mas agora não tenho qualquer intenção de o fazer.

Caso existam eleições antecipadas decorrentes de um chumbo do orçamento do Estado e a IL do seu ponto de vista deve adiar o Congresso e a disputa eleitoral e avançar para as eleições antecipadas com o Rui Rocha à frente do partido?
É uma boa questão. Não pensei sobre isso. Mas não me parece que se deva adiar o Congresso. Pode ajustar a data um bocadinho mais para a frente ou mais para trás, consoante o período em que as eleições forem marcadas, mas não me parece que se deva adiar o Congresso.

Mas aqui estamos a falar nesse cenário de antecipação de eleições. Isso também deve precipitar alguma mudança no partido ou Rui Rocha seria o candidato?
Assim sendo, se for a intenção de Rui Rocha de recandidatar-se, se houver eleições antecipadas, mais um motivo ele terá para recandidatar-se.

Tiago Mayan Gonçalves acusou a atual liderança de ter pouca ambição e de praticar a “idolatria pessoal”. Há um problema de falta de ambição e de culto da personalidade no partido?
Não, pelo contrário. Nem vejo qual é esse culto da personalidade. Acho que a IL deve ser dos partidos onde as pessoas veem diferentes deputados a falar. Temos um partido ao nosso lado na Assembleia da República onde um dos deputados decide tudo pelos outros 49. Aqui é exatamente o oposto. Mas percebo: às vezes é preciso ter notícias e por isso dizem-se coisas, diria que não muito honestas. Não parecem muito refletidas, mas percebo que é preciso.

Acha que Mayan estava apenas à procura de atenção, é isso?
Sim, parece-me que sim, não vejo nenhum fundamento.

"Se a mim já me parece difícil, muito difícil, nós podermos aceitar um orçamento ainda sem alterações do PS, tendo as contas públicas a níveis muito parecidos com aqueles dos últimos anos do Partido Socialista... Se em cima disso ainda vêm alterações efetuadas pelo PS, que certamente não serão para o lado que nós queremos, de menos despesa do Estado e de menos impostos, parece-me ainda mais difícil, obviamente, ter essa aprovação"

“Marques Mendes ou Passos? Já votei Passos uma vez”

Vamos avançar para o segundo segmento do nosso programa, o bloco “Carne ou Peixe”. Só podes escolher uma de duas opções. Preferia trabalhar com o fundador Miguel Ferreira da Silva no gabinete de Carlos Abreu Amorim ou ser assessor de Mayan Gonçalves na junta de Nevogilde?
Sem problema nenhum em trabalhar com os dois, até porque, sobretudo com o Miguel já trabalhei muito no início da Iniciativa Liberal. Mas acho que ia preferir o Miguel simplesmente pela função. Acho que poderia estar a trabalhar no Governo, nada contra, obviamente, o poder local, mas gosto mais da parte nacional.

Se Passos Coelho e Marques Mendes passassem à segunda volta das Presidenciais, em quem é que colocaria uma cruzinha nas Presidenciais? Pode tapar com o dedo, se quiser.
Não, não precisava de tapar no sentido em que já votei Pedro Passos Coelho uma vez. Entre os dois, acho que votaria outra vez.

Quem é que convidava para jogar pádel, Mariana Mortágua ou André Ventura?
É uma coisa que gostava de fazer e que já não faço mesmo há muitos meses. Provavelmente convidava o André Ventura, porque já o vi a fazer desporto e gosto de competição. Acho que ia dar um bom jogo, uma boa competição.

Se votasse nas próximas eleições americanas, em quem é que votaria, Donald Trump ou Kamala Harris?
Agora, provavelmente, em Kamala.

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