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CONGRESSO PSD: Intervenção de Luís Montenegro, líder do partido, no 40º Congresso Nacional do Partido Social Democrata (PSD), no Pavilhão Rosa Mota, no Porto. 2 de Julho de 2022 Pavilhão Rosa Mota, Porto TOMÁS SILVA/OBSERVADOR
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A média das sondagens realizadas até ao momento deixa o PS com 35.10%; o PSD está nos 24.90%

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

A média das sondagens realizadas até ao momento deixa o PS com 35.10%; o PSD está nos 24.90%

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Montenegro à procura de recuperar o brilho e o estado de graça

Caso Pinto Moreira, dirigente e amigo de Montenegro, criou dificuldades. Cascas de banana na bancada irritam e críticas públicas começam a aumentar. Regresso de Passos entra nos planos dos opositores.

Primeiro, foi um processo de revisão constitucional que deixou deputados e membros da direção de cabelos em pé. Depois, foi o embate indireto com Pedro Passos Coelho à boleia da morte medicamente assistida, visto como uma tentativa de matar o pai político. Pelo meio, uma abstenção na censura mal compreendida por alguns setores do partido. A terminar, um caso judicial (o segundo) a atingir diretamente dirigentes do partido. E, em cima de tudo isto, sondagens que não deslumbram. Cerca de oito meses depois de tomar posse, o brilho de Luís Montenegro começa a ficar mais fosco.

A última semana acabou por ser de gestão delicada para o líder social-democrata. Numa altura em que António Costa ainda procurava sair dos escombros de mais uma remodelação forçada no Governo, as atenções mediáticas viraram-se para o PSD a propósito da Operação Vórtex. Apesar de visar sobretudo o autarca socialista Miguel Reis, o envolvimento de Joaquim Pinto Moreira, ex-presidente da Câmara de Espinho, vice-presidente da bancada do PSD e figura muito próxima de Montenegro, obrigou o líder social-democrata a entrar em modo de contenção de danos.

Se na terça-feira Pinto Moreira quebrou o silêncio para dizer que não prescindia dos cargos que tinha no Parlamento e que só faria quando conhecesse os termos em que será constituído como arguido (se for), quase 48 horas depois, Montenegro dava uma entrevista à SIC assumindo que, apesar de acreditar plenamente em Pinto Moreira, o seu vice da bancada não tinha condições políticas para continuar. Era a primeira vez que aparecia em público desde sábado último e depois de não ter acompanhado o debate com o primeiro-ministro no Parlamento, como é seu hábito fazer – esteve sempre na sede do partido, em Lisboa.

A entrevista à SIC, no entanto, marcou também outra viragem: pela primeira vez desde que é líder do PSD, Montenegro apareceu em modo contra-ataque, insurgindo-se  contra as “insinuações ignóbeis, maldosas, vergonhosas e levianas” de que estava a ser alvo, desafiando todos a testar a sua “honorabilidade”, criticando os jornais e as fontes em off the record, desvalorizando as sondagens e irritando-se com as perguntas sobre possíveis alianças com o Chega – que, mais uma vez, não esclareceu.

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E se é um facto que, até ver, o assunto “Espinho” ficou contido – Pinto Moreira afastou-se da direção da bancada e da presidência da comissão de revisão constitucional –, a verdade é que Montenegro foi obrigado a responder a uma frente de batalha que não antecipava, desviando energias que tentava empenhar no combate a António Costa.

Mais: o renovado Conselho Estratégico Nacional (CEN) do partido, apresentado a 7 de janeiro, que pretende ser uma espécie de governo sombra e o caldeirão onde se vai cozinhar a alternativa que o PSD quer apresentar ao país, virou nota de rodapé da agenda mediática. Pior ainda: os primeiros sinais de descontentamento público começam a surgir, prometendo contaminar aquele que deveria ser o ano de afirmação de Montenegro.

Santana Lopes sugeriu na CMTV que "Pedro Passos Coelho está a marcar espaço" e deixou dois cenários: "Pode ser para as presidenciais ou pode ser [para a liderança do PSD], se isto correr muito mal a Luís Montenegro". Mendes, Relvas e Jardim manifestaram reservas sobre condução do PSD. E José Eduardo Martins publicou foto com Passos

Mendes avisa, Relvas condiciona e Jardim ataca

Se até aqui Montenegro tem tido a arte e o engenho de unir o partido e circunscrever as críticas internas, as últimas semanas começaram a destapar algum do descontentamento que vai lavrando no partido. O último aviso, aliás, veio de Luís Marques Mendes, próximo de Luís Montenegro e insuspeito de qualquer alinhamento com fações ligadas ao rioísmo.

“O PSD ainda não é visto como alternativa e precisa de preencher essa lacuna. Depois, 2023 é também um ano decisivo para o PSD. Ou o partido se afirma como alternativa ou parte enfraquecido para as europeias de 2024. É aí que começa o futuro”, afirmou Marques Mendes, no seu habitual espaço de comentário, na SIC.

Ainda antes, Alberto João Jardim, que, apesar de ser um crónico adversário, apoiou Montenegro nas últimas diretas contra Jorge Moreira da Silva, não se conteve e criticou abertamente a abstenção do PSD na votação da moção de censura ao Governo socialista.

Ridícula a posição desta direção nacional do PSD ao se abster na moção de censura ao Governo socialista. Até agora,vem faltando a estes ‘millennials’ de casaco escuro,camisa branca sem gravata e calças cinzas – iguais como na creche – a força, a afirmação e o crédito do meu PSD”, escreveu no Twitter enquanto decorria o debate da moção de censura.

Na CNN, Miguel Relvas, antigo número dois de Pedro Passos Coelho, insuspeito de nutrir qualquer simpatia por Rui Rio e próximo da atual direção, não escondeu que gostaria de ver o PSD a votar favoravelmente a moção de censura que esta quinta-feira vai ser discutida no Parlamento.

Esta sexta-feira, José Eduardo Martins, que nunca morreu de amores por Montenegro mas que tem na atual direção gente que lhe é próxima, como Miguel Pinto Luz, fez questão de publicitar um almoço com Pedro Passos Coelho, de quem chegou a ser um feroz crítico, com seguinte legenda: “Farto de anões e aldrabões, farto de poucochinho, fui desabafar com o gigante que conheço. Não muda, mas alivia. Bom fim de semana a todos”, escreveu no Facebook.

Apesar de preferir não esclarecer o(s) alvo(s) que procurou atingir, no partido, inclusive na direção de Montenegro, as palavras de José Eduardo Martins foram interpretadas como um ataque (também) a Luís Montenegro, a quem, no passado, chegou a chamar de “garrafa de ketchup por estrear” –  “bate-se, bate-se e não sai nada”.

E, talvez de forma mais dolorosa e surpreendente, Pedro Passos Coelho, que, a propósito do referendo à eutanásia, questionou a posição assumida por Luís Montenegro e tentou condicionar o futuro do PSD. “O que desejaríamos era que os partidos que estão contra esta ‘revolução’ de organização da eutanásia se comprometessem transparentemente em lutar pela sua revogação caso venham a lograr conquistar uma maioria de deputados no futuro”, escreveu Passos no Observador.

O episódio deu origem a um drama quase shakesperiano, com elementos da direção do PSD a assumirem ao Observador que era importante marcar uma posição e mostrar que quem manda no partido é Montenegro e não Passos. Do outro lado, senadores do partido houve a dizerem que a “birra” do líder social-democrata foi “uma enorme infantilidade”, um “erro” e uma tentativa falhada de “matar o pai”.

O mais curioso é que pouco ou nada une estas cinco figuras do universo social-democrata – não raras vezes estiveram em trincheiras opostas nas muitas lutas internas que o partido já conheceu. E que só vêm engrossar o (para já) tímido coro de críticos internos, que, nos bastidores, vai ganhando forma no grupo parlamentar do PSD e a distribuir cascas de banana no caminho de Montenegro.

Apesar de dono e senhor do aparelho social-democrata, e apesar de ter uma direção blindada e coesa, o caminho do líder do PSD vai-se estreitando. E ainda falta muito tempo para o grande teste, as europeias de 2024 — será um ano e meio (as eleições são em maio) de grande desgaste.

"Não tenho sombras. Vivo muito bem com as minhas responsabilidades. Não tenho nenhum temor de disputar eleições. Já ganhei e perdi muitas vezes", afirmou Montenegro em entrevista à SIC

As sondagens que não ajudam

De resto, Marcelo Rebelo de Sousa, com quem a atual direção (tal como Rui Rio, aliás) vai mantendo uma relação no mínimo complexa, não contribuiu exatamente para a causa de Montenegro. Ainda que as justificações de Marcelo Rebelo de Sousa para a não dissolução da Assembleia da República (“Não é claro que surgisse uma alternativa evidente, forte e imediata”) tenham sido genericamente compreendidas pela atual direção do PSD, as palavras do Presidente da República tiveram um efeito político e mediático imediato. E obrigaram os sociais-democratas a reconhecer que precisam de mais tempo.

As tímidas sondagens são um indicador que inspira cautelas. Em outubro, elementos do núcleo duro de Montenegro desvalorizavam o arranque menos conseguido – “sem dramas”, dizia-se. Três meses depois, e sem grandes alterações, a ordem para desvalorizar é a mesma. “Não governo para as sondagens”, cortou Montenegro na mesma entrevista à SIC.

O líder social-democrata disse mais. “A tendência das sondagens, a mim, satisfaz-me. Não o suficiente. Até hoje, o PSD baixou o seu valor numa sondagem. Tem vindo a subir consistentemente. Lentamente, gradualmente e pouco de cada vez, é verdade. O que só mostra consistência. O PS está a perder e está a perder de uma forma muito mais abrupta. É o que dizem as sondagens”, defendeu.

Não é necessariamente verdade. Nas 17 sondagens realizadas desde que é líder do PSD, Montenegro consegue uma média de 24,90% – o partido teve 27,67% nas últimas legislativas. A subida gradual e consistente nas sondagens também não é facilmente comprovável. Montenegro tem tido picos positivos (julho, outubro e dezembro) e quedas abruptas (agosto, setembro e novembro, por exemplo), sendo que os valores chegam a oscilar muito e mesmo quando ‘fotografados’ no mesmo mês.

Sendo que há uma nota importante: as diferentes empresas de sondagens usam diferentes tipos de metodologias — inclusivamente na forma como são distribuídos os indecisos. No entanto, mesmo nos estudos de opinião que são diretamente comparáveis há variações positivas e negativas. Por outras palavras: não há consistência, como sugeriu Montenegro.

Independentemente do copo meio cheio ou meio vazio com que se queira olhar para o acumulado das várias sondagens, há dois dados objetivos: apesar da queda do PS nos estudos de opinião, os sociais-democratas continuam consistentemente a mais de 10 pontos percentuais do PS; e em 11 das 17 sondagens realizadas até ao momento, o PSD tem resultados inferiores ou em linha com a votação de Rui Rio das últimas legislativas.

A evolução de todas as sondagens realizadas desde que Luís Montenegro foi eleito líder. A média das sondagens realizadas até ao momento deixa o PS com 35.10%; o PSD está nos 24.90%

A segurança da ausência de sombras. Até ver

Tudo somado, os críticos internos existem, as reservas em relação a Montenegro crescem (ou, noutros casos, confirmam-se), a agitação vai aumentando, os planos vão-se desenhando, mas, no final do dia, continua a não existe qualquer embrião de oposição organizada ao atual líder social-democrata. Mais: não há nenhuma figura no horizonte próximo que esteja em condições sérias de personificar uma candidatura sólida ao trono. Ou quase nenhuma.

Montenegro, apesar de tudo, não ignora essa agitação. Na mesma entrevista à SIC, já depois de ter criticado aqueles que na sombra conspiram contra ele, deixou claro que não tem “sombras”, nem qualquer “temor de disputar eleições”. “Já ganhei e perdi muitas vezes”, rematou, visivelmente agastado com a insistência na conversa sobre conspirações internas.

Aliás, não foi a primeira vez que demonstrou irritação contra os que se lhe vão opondo – mais uma vez, e até ver, quase sempre no conforto do anonimato. Durante o processo de revisão constitucional, e quando acusado de ter mantido elementos da direção e a generalidade dos deputados às escuras sobre as propostas do partido, Montenegro deixou uma certeza: “Ninguém me intimida com esse tipo de pequena intriga”.

Na mesma semana, e em frente a todos os conselheiros nacionais do partido, Montenegro voltou a atingir os críticos internos. “Sabemos como é que isto funciona. Mas quanto menos intriga criamos a nós próprios, mais capacidade vamos ter em passar os nossos intentos. Estou absolutamente ciente de que não era possível fazer de forma diferente, nem melhor, modéstia à parte.”

Para já, de facto, Montenegro tem o conforto de estar a enfrentar uma oposição interna sem rei nem roque. O que resta da ala rioísta, que vai tentando desgastar o líder social-democrata via Parlamento, não tem um cavalo certo para apostar. Os que criticam aberta e circunstancialmente Montenegro – Relvas, Jardim, Mendes, etc. – não têm uma linha estratégica clara, nem necessariamente um plano de ataque concreto. E os planos para encontrar um verdadeiro challenger pertencem, para já, ao plano da pura efabulação.

Jorge Moreira da Silva, a única figura nacional que não se juntou de uma forma ou de outra à atual direção do PSD, continua (publicamente, pelo menos) fora de combate. Carlos Moedas vai mantendo a aura sebastiânica, mas os calendários para o presidente da Câmara Municipal de Lisboa não são brilhantes – se se quisesse candidatar à liderança do PSD teria de o fazer no segundo semestre de 2024; e as próximas autárquicas são em 2025. Entrar nessas duas frentes seria politicamente pouco previdente.

De resto, e embora tenha mantido sempre o tom cordato, desafiado a responder se temia a sombra do antigo comissário europeu, Montenegro apontou o caminho a Moedas. “Tenho a expectativa de que vai continuar a ser um excelente presidente da Câmara de Lisboa e que vai dar uma maioria absoluta ao PSD em 2025”, frisou Montenegro. Nas entrelinhas: Moedas está agarrado à cadeira da capital.

E depois há Pedro Passos Coelho. Apontando com insistência à Presidência da República, há setores do partido que, sabe o Observador, vão insistindo nele para suceder a Montenegro caso as coisas continuem sem sair dos eixos. Curiosamente (ou não), o primeiro a verbalizar isso mesmo foi Pedro Santana Lopes, na CMTV. “Pedro Passos Coelho está a marcar espaço. Pode ser para as presidenciais ou pode ser [para a liderança do PSD], se isto correr muito mal a Luís Montenegro…”, sugeriu o antigo primeiro-ministro à boleia do debate sobre a eutanásia.

A publicação de José Eduardo Martins, que depois de ter sido um crítico quase isolado tem feito um caminho de aproximação ao antigo primeiro-ministro, também ajudou a alimentar o mito do desejado no partido – assim que o antigo secretário de Estado tornou público o almoço com Passos os canais de WhatsApp que se alimentam da vida interna do PSD vibraram de excitação.

“Essa questão [uma disputa com Passos] não se coloca, não sou capaz de colaborar nesse tipo de exercício mental, académico ou abstrato”, tentou esvaziar Montenegro, que já tinha sido confrontado com o tema na véspera — prova de que o rumor existe e que está a ser alimentado. “Passos tem uma qualificação quase única no país que o habilita a ser quase tudo o que se pode ser numa sociedade. Ele escolherá aquilo que for melhor e aquilo que corresponder às suas expectativas”, reconheceu.

No entanto, poucos, talvez à exceção do próprio, saberão o que quer e o que fará o antigo primeiro-ministro – ou se fará. O mesmo se aplica a Moedas ou Jorge Moreira da Silva. E a quase todos os notáveis que, em teoria, estariam em condições de ambicionar a liderança do PSD. Até alguém sair da sombra, Montenegro continuará líder incontestável.

Montenegro ensaia emancipação de Passos. “Demonstração de autoridade” ou “infantilidade”

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