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A controversa redução transversal do IRC não avançou, mas o Orçamento do Estado para 2023 traz um pacote cheio de medidas para as empresas. A maior parte delas alavancadas pelo acordo de rendimentos assinado com os parceiros sociais na véspera da apresentação de Fernando Medina. Mas há outras propostas, mais ou menos ambiciosas, às quais os empresários devem ficar atentos.
O estímulo à capitalização é um dos focos, bem como o alívio fiscal, ainda que seletivo, e os incentivos ao tecido empresarial do interior. E de acordo com o Executivo, “mantêm-se salvaguardados os movimentos de concentração de mercado – porque o objetivo é que as empresas que hoje são pequenas, amanhã sejam grandes”. Estas são as grandes linhas com que as empresas poderão contar em 2023.
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Capitalização de empresas deduzida no IRC durante 10 anos
Era uma medida “há muito ambicionada” pelas empresas, reconheceu Fernando Medina. Já tinha sido antecipada nas últimas semanas e vai mesmo avançar. A bandeira do Governo para as empresas é a criação de um incentivo à capitalização (ICE) que, na prática, “funde e simplifica dois regimes atuais”: a dedução por lucros Retidos e Reinvestidos e a Remuneração Convencional do Capital Social. O novo regime, explicou Medina, vai “acabar com a distorção antiga que favorece quem pede dinheiro ao banco e aquelas em que os sócios fazem aumento de capital direto”.
O ICE, que se destina a todas as empresas, exceto às do setor financeiro, e terá um impacto de 120 milhões de euros nas contas do Estado em 2024, possibilita a dedução, à taxa anual de 4,5 % e durante dez anos, do montante dos aumentos líquidos dos capitais próprios das empresas. Isto inclui as entradas em dinheiro e em espécie feitas pelos sócios, os prémios de emissão de participações sociais e os lucros aplicados em resultados transitados, em reservas ou no aumento do capital social.
A taxa de dedução sobe para 5% para as micro, pequenas e médias empresas ou empresas de pequena-média capitalização (small mid cap). A dedução pode ser feita até 2 milhões de euros ou 30 % do EBITDA. A medida “vai permitir um balanço mais sólido e mais robusto” das empresas, notou o ministro.
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Incentivo à subida de salários com 3 condições
Estava previsto no acordo de rendimentos, dos salários e da competitividade, assinado com os parceiros sociais, e o Orçamento trouxe luz ao custo que terá beneficiar as empresas que subam salários: 75 milhões de euros, que terão impacto em 2024. A medida mexe com o bolso dos trabalhadores, mas também com os cofres das empresas. Cerca de 500 mil, concretamente, de todas as dimensões.
Isto porque o incentivo vai garantir uma diminuição do IRC para “todas as empresas que acompanhem, através da contratação coletiva dinâmica, as valorizações salariais dos trabalhadores”. Ou seja, ao contrário do que chegou a ser aventado pelo ministro da Economia, e que gerou um sonoro debate entre membros do Governo, empresas e associações, a redução do IRS não será transversal.
Será necessário cumprir três requisitos: a referida contratação coletiva dinâmica, que significa que têm de ter renovado os acordos coletivos há menos de três anos; aumento de salários conforme ou acima dos valores do acordo (5,1% em 2023; 4,8% em 2024; 4,7% em 2025 e 4,6% em 2026); e redução do gap salarial entre os 10% dos trabalhadores que ganhem mais e os 10% que ganhem menos.
Na prática, para estas empresas, “determina-se que são majorados em 50% todos os custos – quer remuneração fixa, quer contribuições sociais – inerentes a valorizações em linha com o acordo de competitividade e rendimentos”.
São abrangidos os encargos relativos a trabalhadores com vínculos a tempo indeterminado e com remunerações acima da remuneração mínima mensal garantida do ano respetivo.
Não poderão beneficiar da medida as empresas “que agravem o seu leque salarial entre a maior e menor remunerações atribuídas aos trabalhadores num determinado ano”.
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Taxa reduzida de IRC chega a mais empresas
A taxa reduzida de IRC de 17% a passará a ser aplicada a lucros tributáveis até 50 mil euros, ao invés do montante atual de 25 mil euros.
Será também aplicada a empresas de pequena-média capitalização (small mid cap) e excecionalmente, durante dois anos, a empresas que perderam a sua natureza de PME ou small mid caps for força de operações de reestruturação realizadas entre 2023 e 2026.
A medida é aplicável a 221 mil empresas e custará 60 milhões de euros.
Regime de reporte de prejuízos fiscais simplificado
Também como previsto no acordo de rendimentos, será simplificado o regime de dedução de prejuízos fiscais, sendo eliminados os limites temporários de reporte, que é, atualmente, de cinco anos, e de 12 anos para as micro, pequenas e médias empresas.
Os procedimentos de prejuízos fiscais no âmbito dos processos de reestruturação de sociedades também serão simplificados, passando a ser diretamente declarados pelas empresas.
Será ajustado o montante de prejuízos fiscais dedutíveis de 70% para 65% do lucro tributável do exercício em causa. Mantém-se a majoração deste limite em 10 pontos percentuais para prejuízos fiscais apurados em 2020 e 2021, na sequência da pandemia.
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Não agravamento de tributações autónomas para 88 mil empresas
O OE prevê o não agravamento das tributações autónomas para empresas com prejuízos fiscais, caso tenham tido lucros num dos três períodos de tributação anteriores e tenham cumprido as obrigações declarativas nos dois períodos anteriores.
Também se prevê o não agravamento das tributações autónomas para os três primeiros anos de atividade das empresas. A medida vai custar 10 milhões de euros e beneficiar 88 mil empresas.
Investimentos no interior com mais benefícios
O Governo propõe uma melhoria do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), “através do reforço da dedução à coleta aplicável dos atuais 25% para 30% das aplicações relevantes, relativamente ao investimento realizado até ao montante de 15 milhões de euros, nas regiões Norte, Centro, Alentejo e Regiões Autónomas”. Lisboa e Vale do Tejo e Algarve mantêm a dedução inalterada nos 10%.
A medida terá um impacto orçamental de 25 milhões de euros.
Encargos salariais de empresas do interior têm vantagem no IRC
Os encargos salariais com a criação líquida de emprego no interior poderão ser majorados em 120%. Isto inclui a remuneração fixa do trabalhador e as contribuições para a segurança social.
Estas empresas verão ainda alargada a aplicação da taxa reduzida de IRC de 12,5% a lucros tributáveis até 50 mil euros, ao invés dos atuais 25 mil euros. As empresas de pequena-média capitalização (small mid cap) também terão esta taxa. A medida vai custar 10 milhões de euros e abranger 7500 empresas.
Empresas mais afetadas pela inflação recebem apoios
Há um conjunto de apoios, alguns já previstos, destinados às empresas mais fustigadas pela inflação galopante. Para cerca de 140 mil agricultores, haverá a redução do ISP do gasóleo agrícola para o mínimo legal e a uma compensação pelo IVA, no total de 10 cêntimos por litro, “tendo em consideração os consumos de gasóleo agrícola reportados ao último ano completo”. Custará 40 milhões de euros.
Está ainda prevista uma majoração em IRC de 20% do aumento dos gastos em energia e 40% dos gastos em produtos agrícolas, isto para os gastos incorridos em 2022. Custará 60 milhões e poderá chegar a mais de 500 mil empresas.
Todas as empresas que consomem eletricidade e gás vão ainda beneficiar da redução dos aumentos dos preços através da injeção de capital (CESE e taxa de carbono) e excedente tarifário nos sistemas de eletricidade e gás. A medida custa três mil milhões de euros, dos quais mil milhões correspondem a 2022, outros mil de CESE mais a taxa de carbono em 2023 e os restantes mil dizem respeito ao excedente tarifário.
Por fim, e ainda sem montante previsto, o Governo contabiliza nestes apoios a limitação do preço de referência do gás natural para produção de eletricidade através do mecanismo ibérico de limitação dos preços da eletricidade.
35 milhões de euros em apoios à transição energética
Neste campo, serão reforçados os incentivos à produção de energia renovável em regime de autoconsumo ou por unidades de pequena produção, até 1MW de potência instalada, através da exclusão de tributação de IRS até ao limite anual de 1000 euros de rendimentos resultantes da transação da energia excedente à rede. A medida custa 5 milhões de euros e, além de particulares, beneficiará pequenos negócios com fontes de energia renovável instalada.
Também está previsto o fim gradual das isenções prejudiciais de ISP, que custará 25 milhões de euros e abrange as empresas produtoras de energia através de combustíveis fósseis. No caso do gás natural, “face ao contexto atual, suspende-se extraordinariamente em 2023 a tributação do ISP do produto energético, retomando a sua trajetória nos anos subsequentes”.
Por fim, há 12.500 empresas que serão beneficiadas com a diminuição da tributação de viaturas ligeiras de passageiros híbridas plug-in e de viaturas ligeiras de passageiros movidas a gás natural veicular (GNV). Passam a ser tributadas às taxas de 2,5 %, 7,5 % e 15 % “em função do valor de aquisição do veículo em causa”.
E também passam a ser tributados autonomamente à taxa de 10% os veículos movidos exclusivamente a energia elétrica com um valor de aquisição igual ou superior a 62 500 euros. A medida custa cinco milhões de euros.
Taxa sobre lucros excessivos avança já em 2022
Não passa de um rodapé no Orçamento do Estado, no capítulo que faz o enquadramento internacional das perspetivas do Governo. Na conferência de imprensa, Fernando Medina explicou porquê. A taxa sobre os chamados “lucros caídos do céu”, ou windfall tax, vai ser alvo de um diploma autónomo, que será aprovado ainda este ano, para que seja possível tributar os lucros excessivos que as empresas tiveram em 2022, e não apenas em 2023.
O Executivo vai cumprir o regulamento europeu, que prevê a criação de uma “contribuição solidária das empresas baseadas em combustíveis fósseis que apresentem lucros 20% superiores aos da média dos últimos quatro anos (utilizando-se a receita coletada para apoio a cidadãos mais atingidos e empresas)”.
Segundo a apresentação de Medina, a taxa mínima será de 33% e será aplicada a setores como o petróleo bruto, gás natural, carvão e refinação. O ministro das Finanças adiantou que ainda não é possível estimar a receita da nova taxa, nem a que empresas será aplicada, já que o seu âmbito só ontem ficou fechado com a aprovação do regulamento europeu, mas espera que seja superior à primeira versão da taxa aplicada em Itália, que rendeu cerca de 10 milhões de euros.