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Bucha tornou-se um dos espelhos da ação destrutiva dos militares russos em território ucraniano
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Bucha tornou-se um dos espelhos da ação destrutiva dos militares russos em território ucraniano

REUTERS

Bucha tornou-se um dos espelhos da ação destrutiva dos militares russos em território ucraniano

REUTERS

Bucha. O relato de Ivan Skyba, o único sobrevivente de uma execução em série

Ivan Skyba é um dos nove homens da imagem de prisioneiros ucranianos em Bucha. E o único que escapou à morte porque se fingiu de morto, apesar das dores causada por uma bala.

A imagem de vários homens em fila indiana, de mãos na anca uns dos outros e cabeça baixa, com um militar de arma apontada atrás tornaram-se um dos marcos da violência da intervenção russa em território ucraniano. Agora, mais de quatro meses depois, o único homem — dos nove que se veem nas imagens — que sobreviveu, relata como se salvou. O ferimento de bala que tinha no corpo causava-lhe dores inimagináveis, mas qualquer gemido podia ditar o fuzilamento.

Novas imagens mostram como civis terão sido executados em Bucha

Taxista e pai de quatro crianças, Ivan Skyba foi um dos nove baleados e descreveu agora à BBC o que viveu no dia 4 de março. Com dores e uma hemorragia fruto do primeiro tiro, Ivan viu um a um os outros oito homens serem baleados e morrerem. Na dúvida sobre se já estariam mortos ou não, relata Skyba, os russos optavam por disparar uma segunda vez.

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“Aquele ainda está vivo”, ouviu, questionando sobre se aquela seria a sua vez ou não. Com frio na rua, qualquer expiração denunciaria rapidamente que Ivan Skyba ainda estava vivo. Afinal, o vapor de água ficaria rapidamente visível. Não bastava suster a respiração. Precisava também de calar os gritos de dor que queria soltar, pois sabia que naquele momento eram sinónimo de morte.

Ali ao lado, perante a dúvida sobre se ainda estaria vivo ou não, alguém foi alvejado a segunda vez acabando por morrer. Agora, quatro meses depois Ivan Skyba está a viver na Polónia com a família. Trabalha e os filhos vivem sem medo, mas as cicatrizes na memória de Skyba continuam bem frescas.

Imagem dos homens em fila ficou registada pelas câmaras de vigilância frente ao número 144 da rua Yablunska

No dia em que a invasão russa avançou, a 24 de fevereiro, Ivan Skyba estava como era habitual até então, a conduzir o táxi pela capital ucraniana. Em Kiev, Ivan questionou a veracidade das explosões que ouvia. “Não imaginei que fosse acontecer”, diz à BBC.

O responsável pela gestão dos táxis ordenou que todos regressassem à base de imediato. A primeira coisa em que Ivan Skyba pensou foi na necessidade de ir a casa buscar os documentos da família — caso precisassem de apanhar um voo para sair do país os passaportes seriam imprescindíveis. A mulher e os filhos estavam em Bucha a visitar a sogra. Até que definissem um plano, seria lá que ficariam abrigados.

Mas em poucos dias os russos chegaram à região onde sofreram uma emboscada da artilharia ucraniana. E foi isso que terá contribuído para adensar a raiva dos militares russos que se vingaram em quem estava escondido na cidade, convencidos de que teria sido algum dos habitantes a denunciar a presença dos russos aos militares ucranianos.

Nos primeiros dias da invasão os ucranianos mobilizaram-se para defender o território, de uma forma que terá surpreendido inclusivamente Putin, que não conseguiu cumprir os tempos que tinha definido para o que chamou “operação especial”. Ivan e um amigo, padrinho da filha de dois anos, não foram exceção. A informação de que estaria a formar-se uma brigada local em Bucha do exército ucraniano foi passando de porta em porta e os dois decidiram juntar-se.

"Vi um Renault branco ser encurralado e uma mulher e os filhos presos lá dentro, o carro estava a arder", Ivan Skyba

“Trabalhávamos nos checkpoints, verificávamos os documentos e certificávamo-nos que ninguém transportava armas. Estávamos a organizar a passagem segura das pessoas porque conhecíamos a zona”, explica Ivan que acrescenta que a “brigada” que tinham formado estava armada apenas com uma espingarda, uma granada e um par de binóculos. No total. Nove homens, uma espingarda, uma granada e uns binóculos. Trabalhavam por turnos.

Tudo se manteve relativamente calmo até dia 3 de março. O dia em que os tiros indiscriminados começaram, os rockets caíram. “Vi um Renault branco ser encurralado e uma mulher e os filhos presos lá dentro, o carro estava a arder”, relata. Com os russos a aproximarem-se do checkpoint Ivan e os parceiros de posto decidiram esconder-se na casa mais próxima, do outro lado da estrada.

Ivan Skyba ferido e baleado pelos russos, depois de receber tratamento médico

Dentro de pouco tempo podiam ouvir os militares de Putin a aproximar-se. As hipóteses de escapar eram poucas e decidiram inventar uma história. Se os russos os detetassem responderiam que eram trabalhadores da construção civil. Enviaram SMS às mulheres e namoradas: “Estamos encurralados, haveremos de encontrar uma forma de sair daqui”.

Pouco mais de uma hora depois os russos descobriram o esconderijo. Obrigaram os homens a sair, em fila indiana. Uma mão na cabeça, a outra na anca do da frente. Atrás, um militar russo de arma apontada. A imagem ficou registada em câmaras de vigilância e é agora usada também nos tribunais internacionais para provar que os militares russos cometeram crimes de guerra em Bucha.

Os russos alvejaram primeiro Vitaliy Karpenko, de 28 anos. Em resultado, um dos homens mais jovens deixou cair a história de que eram trabalhadores da construção civil admitindo que eram uma brigada ucraniana. Na resposta, os russos torturaram-nos e balearam-nos.

Nos dias seguintes, o número de mortos dentro da brigada ia aumentando. Além da tortura através de agressões, eram baleados em várias partes do corpo até que o “tiro final acontecesse”. Ivan relata que um dos homens, Anatoliy Prykhidko, ainda tentou fugir a correr, mas foi de imediato abatido com um tiro. Depois, os russos abriram fogo sobre os restantes homens. E foi aí que Ivan Skyba ficou ferido.

À volta não havia qualquer sinal de vida, era único momento que tinha para fugir. Ao seu lado estava outro homem morto, do qual aproveitou os sapatos. Arrastou-se até à casa mais próxima, deixada para trás durante o bombardeamento.

Ivan não consegue dizer quanto tempo é que os militares russos demoraram a ir embora, mas lembra-se do momento em que tirou a cabeça debaixo do casaco que a cobria. À volta não havia qualquer sinal de vida, era o único momento que tinha para fugir. Ao seu lado estava outro homem morto, do qual aproveitou os sapatos. Arrastou-se até à casa mais próxima, que escapara ao bombardeamento.

Tratou as feridas com o que encontrou no armário da casa de banho e mudou de roupa. Aproveitou um cobertor que encontrou e tentou dormir, mas havia vozes de russos a entrar pela casa.

“Viram-me e perguntaram-me quem era e o que fazia ali”. Convenceu-os de que era o dono da casa e que a família tinha sido retirada. Os ferimentos? Justificou-os como sendo o resultado do bombardeamento. Os russos acreditaram, mas disseram-lhe que não podia continuar ali. Disponibilizaram-se a transportá-lo para uma base militar médica onde podia receber tratamento. Ainda que tenha receado estar apenas a passar de um cativeiro para outro, Ivan acabou por ser, de facto, tratado pelos russos. Alguns dias mais tarde recebeu alta e saiu.

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