Sebastião Bugalho nem sequer era a estrela principal da Festa do Pontal, tendo menos minutos de palco (zero) que o músico Beto Kalulu. Mas isso não o impediu de ser uma espécie de estrela das rentrées do partido. No Algarve, deu entrevistas a televisões e tirou várias fotografias com fãs, sendo talvez o campeão do selfómetro de Quarteira. Na segunda parte da rentrée do PSD, na Universidade de Verão do partido em Castelo de Vide esta terça-feira, o cenário repetiu-se: houve quem esperasse mais de 15 minutos só para ter uma fotografia com o ex-comentador político. Bugalho continua o flirt com o partido que começou na campanha, embora garanta que no horizonte só tem os cinco anos de mandato.
Começando pela Festa do Pontal, Sebastião Bugalho — sempre mais popular entre os mais novos — foi abordado por jovens, mas também por mais velhos e famílias inteiras. O próprio não se escondia e parecia gostar da popularidade. Aproveitou o momento para conviver com alguns membros do Governo, como se fizesse parte da família política. No mesmo dia, Bugalho conseguiu desfazer uma espinha que trazia na garganta: nas imagens televisivas aparece a posar ao lado da mulher que durante a campanha disse preferir uma cabeça de lista às europeias e que o levou a irritar-se com perguntas dos jornalistas.
Embora continue sem se filiar no PSD, Sebastião Bugalho segue uma informal e distendida rota da carne assada, ora promovida pela máquina do partido (como é exemplo o convite para a Universidade de Verão), ora de relações que vai estabelecendo a título pessoal. Exemplo disso é que uma semana depois do Pontal, a 22 de agosto, recebeu das mãos de um escuteiro uma almofada com uma tesoura para, nada mais, nada menos, cortar a fita vermelha que inaugurou a Festas em Honra de Nossa Senhora dos Remédios, em Lamego. Ao seu lado estava o presidente da câmara municipal de Lamego, Francisco Lopes, que é autarca do PSD. Para as estruturas locais, Bugalho também é uma estrela. E tem solicitações de várias concelhias.
Agora, na Universidade de Verão do PSD, o cenário repetiu-se. Muitos dos alunos, antes de fazerem as perguntas, disseram sentir-se representados por Sebastião, que foi promovendo a informalidade. “Não me chamem doutor”, “tratem-me por tu”. Ao longo da intervenção, o eurodeputado foi dizendo a expressão “já fomos a votos”, mas agiu como se continuasse em campanha.
O europeu que é atirador nacional
O próprio Sebastião Bugalho chega-se à frente com frequência, sem temer segundas interpretações das suas palavras e atos. O porta-voz dos eurodeputados do PSD no Parlamento Europeu tinha uma missão na ida à Universidade de Verão do PSD: falar sobre Europa. O tema era, aliás, preciso e confinado: “A Europa: a instabilidade na incerteza”. Mas o cabeça de lista às europeias não resistiu ao combate político nacional, colocando-se na piscina (nacional) dos grandes: atirou ao líder da oposição.
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Bugalho criticou o facto de o líder do PS dizer que António Costa é “o primeiro presidente do Conselho Europeu com peso político”, ignorando o polaco Donald Tusk, que “acabou de tirar a extrema-direita do poder na Polónia”. E questionou: “Não leu os jornais? Esqueceu-se? Não se apercebeu?” Qualquer uma das três opções, acrescenta Bugalho, “não é bom sinal para quem tem de liderar o segundo maior partido” nem sinal de alguém “apto a liderar um partido na Europa nos dias de hoje.” Em resposta aos alunos também continuaram algumas provocações ao PS, mas esta referência é mais relevante por estar na própria intervenção inicial — ou seja, não foi provocada.
“Não leu os jornais?” Bugalho vê sinais de que Pedro Nuno não está “apto” para ser líder do PS
Na Festa do Pontal, sem grande preocupação de articulação com a comunicação do PSD, deu uma curtas declarações à SIC Notícias e também não deixou de dar uma opinião sobre o Orçamento de Estado, um assunto, naturalmente, de política nacional. “Há todas as condições [para o PS aprovar o OE]. Ainda hoje o Álvaro Beleza, que foi o mandatário do Pedro Nuno Santos na sua campanha interna, manifestou a disponibilidade do PS para viabilizar o orçamento “, disse Bugalho.
A ambição de chegar lá e a tranquilidade de Montenegro
Na primeira ida a Estrasburgo, que o Observador também acompanhou, foram vários os funcionários (portugueses) que abordaram Sebastião Bugalho, ora para o cumprimentar, ora para pedir fotografias. “Criaram um monstro, agora lidem”, dizia fonte da direita europeia em Estrasburgo, num tom não depreciativo. Pelos mesmos dias, Sebastião Bugalho deu uma entrevista ao Observador onde não conseguiu negar ter a ambição de um dia ser primeiro-ministro. Com todas as letras deu a seguinte resposta:
Observador — Consegue dizer: “Eu não quero ser primeiro-ministro um dia”?
Sebastião Bugalho — “Não, não posso assumir isso. Mas só para ficar claro que acho que neste momento estamos bem servidos.”
Sebastião Bugalho tem, portanto, uma resposta em dois tempos à pergunta se quer ser primeiro-ministro: o país está bem entregue a Luís Montenegro; e não quer verbalizar que não tem essa intenção. Aliás, no Debate das Rádios, a 3 de junho, também tinha sido incapaz de dizê-lo:
Observador/Antena1/TSF/RR — Vai deixar aqui, para memória futura, a frase: ‘Eu nunca serei candidato a primeiro-ministro’?
Sebastião Bugalho — As pessoas dizem que sou muito ambicioso. Eu tenho ambição de dar o meu melhor. Acho que, neste momento, o Governo está bem entregue.
O “neste momento” foi medido. E não foram casos únicos. Logo no discurso de arranque da candidatura, Bugalho se tinha comparado com o jovem primeiro-ministro francês e utilizado a mesma expressão que António Costa utilizou com Pedro Nuno Santos, no congresso que revelou ambições de ser sucessor do então primeiro-ministro.
Tenho ouvido as críticas, até já respondi a algumas com humildade e boa disposição. Parece que dizem que sou muito novo. E é verdade e, como diz o senhor primeiro-ministro, é um problema que passa com o tempo. Mas o primeiro-ministro francês neste momento tem 34 anos, eu sou só candidato Parlamento Europeu. E, que eu tenha dado conta, o dr. Luís Montenegro não pensa meter os papéis para a reforma”, disse Bugalho.
Apesar da aparente ousadia, Luís Montenegro e a sua equipa parecem não se importar em dar palco a Sebastião Bugalho, precisamente porque consideram que o porta-voz dos eurodeputados do PSD não é uma ameaça ao atual primeiro-ministro. “O problema nunca será com Montenegro, para quem ele não é concorrência. No limite, o problema é para o Moedas ou com gerações intermédias como Leitão Amaro ou Hugo Soares que também podem querer ter uma palavra a dizer na sucessão”, diz ao Observador fonte social-democrata. O que é certo é que Bugalho, apesar de ser independente, continua a ser promovido no PSD. Ou seja: o partido considera-o uma mais-valia.
A presença no Pontal e em Castelo de Vide significa, precisamente, que a direção do PSD entende que a notoriedade e a popularidade de Bugalho não prejudica, nem tampouco atrapalha, o primeiro-ministro. Nas próximas horas, Bugalho vai continuar em Castelo de Vide a dar provas desse reconhecimento público. E, claro, a namorar o partido. O almoço desta terça-feira, sem estranheza, foi com o presidente da câmara de Castelo de Vide, António Pita, que é, claro, autarca do PSD. Como diria Santana Lopes — que até viu no jovem potencial para Belém (depois de fazer os 35) — Bugalho vai andar por aí.