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HUGO AMARAL/OBSERVADOR

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Sete desafios (ou dores de cabeça) para Mário Centeno

O ano vai começar com muito trabalho de casa atrasado, mas nem por isso os restantes problemas esperarão sentados. Mário Centeno e a sua equipa terão as mãos cheias nos próximos meses.

Ano novo, vida nova, os problemas de sempre. 2016 será o primeiro ano do Governo de António Costa, pouco mais de um mês após a tomada de posse, e o Executivo não deverá ter a vida facilitada. Entre aprovar o orçamento, controlar as contas públicas, estimular a economia, resolver as questões com Bruxelas e fazer tudo isto mantendo o apoio do PCP e do Bloco de Esquerda, o Executivo não precisa de arranjar mais sarna para se coçar.

O calendário eleitoral e as negociações que se seguiram, que permitiram ao PS chegar ao Governo, atrasaram o processo orçamental. Pelo meio, surgiu uma solução custosa para a questão do Banif e muitas dúvidas sobre a prestação da economia portuguesa no próximo ano.

António Costa e Mário Centeno vão precisar de jogo de cintura para manobrar as exigências de manter os acordos com os partidos à esquerda, que já mostraram que vão continuar a tentar avançar com sua agenda partidária, as exigências de Bruxelas e a sua própria agenda.

Aqui ficam alguns desafios mais imediatos que a equipa de Mário Centeno deverá ter pela frente nos próximos meses.

1 - A herança deixada por Maria Luís Albuquerque

Chegar ao Governo e encontrar surpresas nas contas, ainda mais com eleições perto do final do ano, é um clássico quase tão repetido como ver Julie Andrews a cantar com as crianças da família Von Trapp na consoada. A meta do défice orçamental do anterior Governo, de 2,7% do PIB, foi colocada em causa desde o início pela Comissão Europeia e pelo Fundo Monetário Internacional, apesar da resistência do anterior Governo, que sempre acreditou que no final a realidade lhe iria dar razão. Chegado ao Governo com uma meta mais relaxada, de 3% do PIB, Mário Centeno teve de aplicar medidas para controlar as contas e permitir que essa meta fosse alcançada.

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Com as eleições e a indefinição que se lhe seguiu, a preparação do Orçamento ficou por fazer, os serviços do Estado estiveram em suspenso e as surpresas começaram a surgir, com o Banif na lista das mais pesadas e mais caras para o Estado. Mário Centeno e António Costa tentaram garantir que a fatura fica toda em 2015, mas a injeção de capital de 2255 milhões de euros terá de ser financiada de alguma forma. Seja através das reservas do Estado, a dita ‘almofada orçamental’, seja através de emissão de dívida, a tesouraria do Estado ficará sempre numa situação mais debilitada.

Outra das questões que será esclarecida quando as contas de 2015 ficarem fechadas e o ano começar será a dos gastos dos serviços na parte final do ano. Quanto foi gasto a mais do que devia, quanto é que foi ‘empurrado com a barriga’ para o próximo ano e que pesará nas contas de 2016? Algo a ter em conta no próximo orçamento.

A ex-ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque

AFP/Getty Images

2 - Um Orçamento atrasado

Será a primeira grande pedra no sapato será o primeiro Orçamento do Estado deste Governo. Chega tarde, com a entrega do documento na Assembleia da República provavelmente a não chegar antes do final de janeiro e a sua aprovação só em março ou abril. E isso deixará o Estado a ser gerido ainda com as regras do ano passado, que prevê mais gastos, e logo um défice maior, durante três a quatro meses.

O Governo tentou precaver-se em algumas leis fundamentais, caso da sobretaxa e dos cortes nos salários, mas muita da gestão do Estado ainda será feita em regime de duodécimos.

Com isto, não só as regras de despesa não entram em vigor logo no início do ano, como não entrarão as mudanças que o Governo prevê no seu programa para estimular a economia, nas quais está a basear muito do sucesso para atingir as metas orçamentais do próximo ano.

Mário Centeno e o seu braço direito, o secretário de Estado adjunto, do Tesouro e Finanças, Ricardo Mourinho Félix

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

3 - A relação com Bruxelas

Não começou da melhor forma. Apesar da razão válida, Bruxelas fez pressão desde o início para obter um esboço do Orçamento a tempo, até 15 de outubro. O anterior Governo disse que não, já prevendo que iria cair na Assembleia da República, e a Comissão Europeia continuou a fazer pressão.

Bruxelas quer avaliar as propostas do novo Governo português no âmbito do semestre europeu e Mário Centeno prometeu enviar um esboço até ao final deste mês.

Mas a questão não se fica pelo procedimento burocrático. As relações ficaram mais tensas desde que Portugal saiu do resgate, com várias críticas às previsões da Comissão Europeia e às avaliações pós-programa da equipa comunitária, a que se juntam questões mais profundas de conteúdo, como a não redução do défice estrutural, muito criticada por Bruxelas, no ano que passou.

Ao abrigo das regras europeias, Portugal tem não só de reduzir o défice para 3%, como cumprir o calendário acordado para reduzir esse défice para menos de 3% e conseguir uma redução mínima no défice estrutural de 0,5 pontos percentuais do PIB por ano, que basicamente traduz o verdadeiro esforço de consolidação orçamental, já que exclui o fator cíclico.

Portugal devia abandonar o grupo de países com défices excessivos este ano, mas não só a situação ficou tremida com algumas derrapagens no final do ano, como se juntou o Banif. Mário Centeno disse que Bruxelas iria fechar os olhos ao Banif, que deve aumentar o défice em pelo menos 1,25 pontos percentuais, mas a UTAO duvida que assim seja e explicou porquê.

Se assim for, Portugal continuará sujeito a regras mais apertadas e sem acesso ao perdão da chamada flexibilidade do Tratado Orçamental, não pode derrapar nas contas públicas para promover investimento ou fazer reformas estruturais.

Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia

OLIVIER HOSLET/EPA

4 - A relação com os parceiros no Parlamento

O acordo com a esquerda não foi fácil e acabou mesmo em ‘acordos’. O plural diz muito da relação entre os três partidos, em especial entre o PCP e o Bloco de Esquerda. António Costa conseguiu o apoio parlamentar que precisava para ser Governo, mas esse apoio está longe de ser incondicional.

Se com o Bloco de Esquerda foi possível acordar um conjunto mais alargado de medidas e calendarizado, com o PCP nem por isso. O PCP é mais intransigente em questões como a eliminação da sobretaxa de IRS e a reversão dos cortes salariais. Quanto aos orçamentos, a única garantia que fica é que irão analisar em conjunto, não há carta-branca.

Os dois partidos também não estão interessados em derrotar um Governo de esquerda e dar nova oportunidade à direita, a grande vantagem de António Costa e Mário Centeno nestas negociações, mas nem por isso vão facilitar-lhes a vida.

Aqui entre um terceiro fator em jogo: Bruxelas e o Orçamento. A Comissão Europeia vai analisar o documento e fazer recomendações. PCP e Bloco de Esquerda são dois partidos com uma posição de princípio contra as regras orçamentais europeias (o PCP vai mais longe e é mesmo contra o euro). Quando o Governo tiver que fazer cedências para cumprir metas, terá certamente um desafio em convencer os seus aliados parlamentares.

A líder do Bloco de Esquerda, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP

MÁRIO CRUZ/LUSA

5 - Acertar contas com o FMI

O caso Banif obrigou o Estado a adiar mais um pagamento antecipado do empréstimo do FMI, do resgate a Portugal, e no próximo ano Portugal quer devolver 10 mil milhões de euros ao Fundo.

A fatia de dívida que quer pagar ao FMI é mais de metade do que Portugal tem de reembolsar no próximo ano – cerca de 17,5 mil milhões de euros -, mas a fatura com juros pode ainda aumentar devido à injeção de capital no Banif.

Em janeiro o FMI deverá estar em Lisboa para fazer a avaliação pós-programa, uma visita que tem vindo a ser adiada devido à inexistência de orçamento.

Christine Lagarde, diretora-geral do FMI

JIM LO SCALZO/EPA

6 - Uma economia a crescer lentamente

Previsões há muitas, realidade há só uma. Todos os governos sofrem do mesmo mal e com o atual não será diferente. O que António Costa previa no seu programa de Governo já foi adaptado às exigências dos acordos parlamentares, mas até que ponto está adaptado ao atraso na aprovação do Orçamento só mesmo no fim se conseguirá saber.

As medidas com que o Governo pretende estimular a economia e fazer cumprir as suas máximas dependem em muito de um orçamento em pleno vigor e esse já se sabe que chegará tarde devido ao calendário eleitoral.

Do lado internacional, há três fatores que continuarão a soprar a favor da economia portuguesa: as taxas de juro baixas, um euro desvalorizado e o preço do petróleo em queda. Mas nem tudo são rosas, e algumas destas bendições também têm o seu lado de maldição, como é o caso do preço do petróleo. Se é verdade que os preços mais baixos vão ajudar as empresas portuguesas e o Estado, baixando os custos de funcionamento, também é verdade que têm consequências sérias na venda de produtos portugueses para fora.

Muito do que se espera do desempenho de Portugal no próximo está, mais uma vez, dependente das exportações. O euro baixo pode ajudar na venda para fora da União Europeia, mas a queda no preço do petróleo está a afetar seriamente um dos principais mercados de Portugal: Angola. Só nos primeiros nove meses, as exportações para Angola estavam a cair quase 30%. Muitas empresas portuguesas que têm negócios em Luanda enfrentam dificuldades e a tão cedo a economia angolana não deverá recuperar. Angola é agora o sexto maior mercado para as exportações portuguesas, mesmo depois da queda expressiva que se verificou.

A China, que também está na lista dos dez maiores importadores de produtos portugueses, está a reorientar a sua economia para os serviços, com reduzido valor importado, o que já está a afetar alguns importantes mercados para as importações portuguesas, caso de Angola e Brasil, mas também tem impacto direto, já que Pequim é o décimo principal mercado para a economia portuguesa.

Junta-se a este lote Espanha, a maior incógnita e o maior parceiro comercial de Portugal. A economia espanhola está em franca recuperação e a situação política uma autêntica confusão. Ainda que com semelhanças para o caso português, com o principal partido de direita a ter mais votos e a esquerda a parecer querer alinhar-se, a verdade é que um acordo aqui não é tão fácil, especialmente devido a questão da independência da Catalunha, algo que poderia trazer constrangimentos à economia espanhola, e, consequentemente, afetaria a economia portuguesa.

A capital angolana, Luanda

STEPHANE DE SAKUTIN/AFP/Getty Images

7 - Uma dívida pública demasiado alta

O anterior Governo PSD/CDS-PP esperava chegar ao final do ano com a dívida pública no máximo em 124,2% do PIB, o novo Governo PS é menos otimista e aponta para os 128,2% do PIB, à semelhança do que esperam a Comissão Europeia e a OCDE. Mas as contas estão a complicar-se.

No final de setembro, a dívida pública portuguesa atingia os 130,5% do PIB, segundo as contas do Banco de Portugal. Em outubro, a dívida caiu mais de 2,6 mil milhões de euros, mas à custa das reservas de tesouraria do Estado. Com a injeção de capital no Banif, decidida no final de 2015, ou o Estado reduz ainda mais a margem de tesouraria que tem ou recorre à emissão de dívida. De qualquer das formas, o pagamento antecipado ao FMI, para evitar os juros elevados que o Fundo cobra, já foi adiado.

2015 era suposto ser o primeiro ano em que a dívida pública finalmente caia, depois de sete anos a subir ininterruptamente e para quase o dobro, mas será mesmo preciso esperar pelas contas finais das autoridades estatísticas para saber se é desta que esse objetivo é cumprido.

Outra questão que pode voltar a ser discutida é a da reestruturação da dívida. Apesar de os partidos que apoiam o PS no Parlamento pedirem uma reestruturação, e de alguns dos membros do PS (incluindo um governante) o terem defendido no passado, António Costa disse numa entrevista recentemente que não iria avançar com nenhuma proposta, mas que quando essa questão surgir a nível europeu, estará preparado para a discutir, e que não bloqueará a discussão, como o PSD teria feito quando a questão grega estava em discussão.

A questão grega pode mesmo voltar a estar em cima da mesa no próximo ano. Apesar da resistência dos países do euro, que muito têm a perder com uma eventual reestruturação, o FMI defende que essa solução é inevitável, o fundo de resgate do euro já apresentou propostas e há o compromisso da ideia ser discutida com as autoridades gregas. A questão será quando e que margem de manobra tem a Grécia para exigir medidas. Para já, o maior problema da Grécia pode mesmo ser o seu maior trunfo nesta discussão, que é ter a maior dívida da zona euro.

O encontro entre o presidente do Eurogrupo (esquerda) e o primeiro-ministro grego (direita)

PETROS GIANNACOURIS / POOL/EPA

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