O dono da Tesla, Elon Musk, e o líder do Reform UK, Nigel Farage, parecem estar em rota de colisão e no centro do diferendo está outro nome: Stephen Yaxley-Lennon, mais conhecido como Tommy Robinson, que está atualmente a cumprir uma pena de prisão de 18 meses por repetir alegações falsas contra um adolescente sírio refugiado — e cuja libertação é pedida por Musk.
Robinson, de 42 anos, é visto como um “herói” dentro da extrema-direita e tem mostrado posições anti-Islão e anti-imigração ao longo dos últimos anos. Chegou a apelidar o islamismo como uma “doença” e uma “ameaça ao nosso modo de vida” e caracterizou a crise de refugiados como uma “invasão muçulmana da Europa”, segundo o The Telegraph, que acrescenta que tem uma “reputação” de “hooligan” (expressão que descreve os adeptos mais violentos do futebol).
Com um historial longo de condenações, a mais recente está relacionada com um jovem refugiado sírio que foi atacado fora da escola, no Reino Unido. O vídeo da violência tornou-se viral e Robinson alegou, falsamente, que o rapaz foi atacado por ter abusado sexualmente de jovens inglesas. Acabaria por ser condenado a pagar 100 mil libras ao rapaz e obrigado a não repetir as acusações. Mas em julho viria a fazê-lo num documentário, que foi inclusive elogiado e recomendado por Musk. Robinson saiu do país, tendo sido emitido um mandado de detenção. Quando voltou ao Reino Unido, em outubro, entregou-se à polícia e um tribunal condenou-o a 18 meses de prisão.
Elon Musk considera que Nigel Farage “não tem o que é preciso” para liderar o partido Reform
Agora, está no centro de um rutura entre Elon Musk e Nigel Farage, com o primeiro a defendê-lo e o segundo a garantir que não será bem-vindo ao partido que lidera, o Reform UK.
Musk — que se especulou que estaria a preparar um donativo histórico na política britânica ao Reform — não concorda com essa postura, tendo atacado Farage na rede social X, onde defendeu que o partido “precisa de um novo líder” já que Farage “não tem o que é preciso”.
Não há muito tempo, em dezembro, foi noticiado que Musk se preparava para financiar o partido com “o maior donativo da história da política britânica” — falava-se, na altura, num encaixe de 100 milhões de dólares (cerca de 96 milhões de euros). Os dois, Musk e Farage, tinham estado reunidos na mansão de Donald Trump em Mar-a-Lago, na Flórida, depois da vitória do republicano. Antes da zanga, ainda na semana passada, Farage tinha, segundo o Politico, apelidado Musk como um “herói, particularmente para os jovens“.
Reino Unido. Elon Musk entre vários bilionários que vão doar dinheiro ao partido de Nigel Farage
Uma fonte desse desentendimento parece ter sido Tommy Robinson. Nigel Farage — um dos rostos do Brexit — tem procurado distanciar-se de Robinson. O The Telegraph escreve que o faz porque o cadastro deste não é compatível com um partido que quer ser governo e que precisa de convencer mais do que o eleitorado que apoia Robinson.
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No verão, Farage disse que não quer “ter nada a ver com Tommy Robinson” e em agosto acusou-o de “incitar ao ódio“, a propósito das manifestações contra o homicídio de três crianças em Southport (incluindo uma portuguesa).
Na sexta-feira, Farage disse que “nunca quis que Tommy Robinson se juntasse ao UKIP“, o antigo partido de Farage a que o “hooligan” acabou por juntar-se, tornando-se conselheiro do seu líder, Gerard Batten. “Não quero que ele se junte ao Reform UK”, voltou a dizer. Segundo o Telegraph, porém, haverá elementos do partido que têm outra opinião.
Elon Musk tem defendido a libertação de Robinson — “Libertem Tommy Robinson!”, escreveu a 2 de janeiro, sugerindo que foi punido por dizer a verdade sobre os gangs de “grooming” (aliciamento de menores para fins sexuais, que tem sido notícia no Reino Unido).
Free Tommy Robinson!@TRobinsonNewEra
— Elon Musk (@elonmusk) January 2, 2025
Também no X, Farage reagiu. “Bem, isto é uma surpresa! Elon é um indivíduo notável mas tenho de discordar nesta questão”, escreveu. “O meu ponto de vista continua a ser que Tommy Robinson não é certo para o Reform e nunca abro mão dos meus princípios.”
Well, this is a surprise! Elon is a remarkable individual but on this I am afraid I disagree.
My view remains that Tommy Robinson is not right for Reform and I never sell out my principles. https://t.co/V7iccN6usS
— Nigel Farage MP (@Nigel_Farage) January 5, 2025
A desinformação e as manifestações anti-imigração
Nascido em Londres em 1982, com o nome Stephen Yaxley — a que acrescentou o Lennon do padrasto — cresceu em Luton e adotou o nome Tommy Robinson quando começou a fazer campanha contra o Islão, em homenagem a um “hooligan” de Luton. Ajudou a fundar a Liga de Defensa Inglesa, um grupo de extrema-direita fundado em 2009 em resposta aos protestos de grupos muçulmanos contra as tropas britânicas que retornavam do Afeganistão e que chegou a ter o apoio do norueguês Anders Behring Breivik, autor confesso dos atentados na Noruega que mataram 77 pessoas e feriram 51, em 2011. Viria a sair da liga mais tarde.
Nos últimos tempo, tem organizado manifestações em larga escala anti-imigração no Reino Unido.
Free Tommy Robinson!@TRobinsonNewEra
— Elon Musk (@elonmusk) January 2, 2025
Segundo o Telegraph, Robinson é muito popular nos EUA onde dá palestras que o jornal apelida como “lucrativas” e onde terá, alegadamente, financiadores.
Voltou a ser notícia em agosto do ano passado, por disseminar desinformação, a partir de um resort de luxo no Chipre, sobre a origem étnica do autor do ataque que matou três crianças que participavam numa aula de dança em Southport, atiçando a revolta daqueles que saem à rua para se manifestar contra os imigrantes — e culpando-os pela violência. Robinson garantia, na altura, que “mulheres estão a ser violadas diariamente” por estrangeiros no Reino Unido e ia mais longe ao afirmar que quem defende pactos de migrações se preocupa mais com “paquistaneses, somalis e afegãos” do que com a sobrevivência das crianças britânicas.
Deixou a escola aos 16 anos, mas era tido como uma pessoa inteligente e conseguiu um estágio em engenharia aeroespacial no aeroporto de Luton. Semanas depois, porém, foi demitido na sequência de uma condenação por violência. Foi a primeira condenação de várias, que incluem violência, fraude e posse de droga.
Em 2005, foi condenado a 12 meses de prisão por violência contra um agente da polícia que não estava de serviço e que tentou intervir numa discussão entre Robinson e a namorada. Em 2013, foi condenado a 10 meses de prisão por usar um passaporte que não o seu para viajar até aos EUA, onde foi proibido de entrar pelo seu registo criminal. Também tem uma condenação por fraude e perseguição e assédio a uma jornalista.
Foi banido do Twitter (agora X), em 2018, por violar as regras por conteúdo de ódio, mas a conta foi restabelecida o ano passado, depois de Musk ter comprado a rede social e alterado a política da rede social. Sobre esse regresso, Robinson disse, citado pelo Telegraph: “Fui censurado, atacado, caluniado e detido por ter revelado verdades incómodas que o nosso governo quer esconder, o público sabe agora que eu estava a dizer a verdade”.
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— Elon Musk (@elonmusk) January 2, 2025