Uma publicação que está a ser partilhada no Facebook defende que as máscaras cirúrgicas, consideradas das mais eficazes na proteção contra o novo coronavírus, são prejudiciais para a saúde por serem “borrifadas com PTFE (politetrafluoretileno)”, um “fluoreto sintético encontrado no teflon”, explica o mesmo post. Apesar de ser verdade que estas máscaras contêm PTFE, não é, no entanto, verdadeira a afirmação de que este componente é prejudicial para a saúde.

O polímero politetrafluoretileno (PTFE) é um tipo de plástico de alto desempenho, conhecido comercialmente como teflon e hostaflon. Foi descoberto acidentalmente em 1938, pelo químico norte-americano Roy Plunnkett, que estava a tentar criar um novo gás refrigerante, e desde então tem sido aplicado nos mais variados artigos técnicos. Extraordinariamente resistente aos agentes químicos, o PTFE consegue suportar temperaturas de 250º e tem uma boa aderência, sendo utilizado para revestir cabos, mangueiras e até aeronaves. É, no entanto, pela sua aplicação nalguns artigos domésticos que é mais conhecido — é este componente que permite, por exemplo, tornar as frigideiras antiaderentes. Um aspeto menos conhecido da história do PTFE é a sua utilização na vedação das válvulas da bomba atómica lançada sobre Hiroshima, em 1945.

Durante vários anos, foi utilizado no fabrico de PTFE e de outros componentes semelhantes um outro composto químico, chamado ácido perfluorooctanoico (PFOA), também conhecido como C8. Recentemente, percebeu-se que o PFOA pode ser prejudicial para a saúde, porque permanece no meio ambiente e no organismo durante um longo período. Estudos em laboratório, feitos em animais, concluíram que a exposição ao PFOA “aumenta o risco de certos tumores do fígado, testículos, glândulas mamárias e pâncreas”, refere a página da Sociedade Americana de Cancro, que explica que, “de forma geral, estudos bem conduzidos em animais são capazes de predizer que exposições podem causar cancro em pessoas”.

O post que defende que o PTFE é prejudicial para a saúde. “Outro prego para o seu caixão”, refere a imagem

Desde que foi estabelecida uma ligação entre o PFOA e alguns tipos de cancro, este componente químico deixou de ser utilizado no fabrico de teflon. Relativamente a este último, não existe nenhum motivo para preocupação, já que, como refere a Sociedade Americana de Cancro, o foco das preocupações das autoridades tem sido o PFOA, “assim como outros  surfactantes fluorados (PFAS), como o ácido perfluorooctanessulfónico (PFOS)”. Por essa razão, o teflon continua a ser usado em diversos objetos, nomeadamente no revestimento de tachos e panelas antiaderentes.

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Este componente é também detetável nalguns tipos de máscara, por ser considerado um método extremamente eficaz de filtragem do ar, como se explica neste artigo, publicado na revista especializada Cleanroom Technology. Ao contrário do que afirma a publicação do Facebook, o PTFE não é “borrifado” na máscara, mas usado para construir uma “membrana” que a torna impermeável a líquidos, mas permeável a gases, como o oxigénio. Isto é importante porque o coronavírus se transmite através das gotículas, libertadas com a tosse, espirros ou até enquanto se fala. Mais recentemente, o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) norte-americano confirmou que o vírus se transmite também por aerossóis emitidos durante a respiração.

Desde que o uso de máscara passou a ser obrigatório no contexto da pandemia do novo coronavírus, têm surgido nas redes sociais inúmeras notícias falsas que procuram descredibilizar a sua utilização, algumas delas desmentidas pelo Observador (uma das mais recentes alegava que o uso de máscara durante um longo período de tempo provoca hipoxia, isto é, uma redução da concentração de oxigénio no sangue, o que não é verdade).

Ao contrário do que muitas vezes circula no Facebook, estudos mostraram que a utilização de máscara pode reduzir a transmissão do novo coronavírus. Uma recomendação da Direção-Geral da Saúde (DGS) sobre o uso de máscara refere isso mesmo, remetendo para um estudo publicado a 3 de abril na revista Nature Medicine: “Estudos recentes mostram que as máscaras cirúrgicas podem reduzir a deteção de RNA de coronavírus em aerossóis, com uma tendência para redução em gotículas respiratórias, sugerindo que as máscaras cirúrgicas podem prevenir a transmissão de coronavírus para o ambiente, a partir de pessoas sintomáticas, assintomáticas ou pré-sintomáticas”.

Em relação às máscaras cirúrgicas, aqui em causa, as evidências disponíveis mostram que são mais eficazes do que outras, como as que são feitas em algodão ou poliéster, como explica o Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova: “Alguns estudos mostraram que 40-90% das partículas virais penetraram na máscara, a tal ponto que casos de doença viral confirmada em laboratório foram significativamente mais frequentes entre os profissionais de saúde que usavam máscaras de pano, em comparação com aqueles que usavam máscaras cirúrgicas.”

Apesar de, “face a estas evidências, as máscaras comuns de tecido (sociais) não serem consideradas protetoras contra vírus respiratórios e o seu uso não ser incentivado com essa indicação”, o IHMT incentiva o seu uso “no sentido altruístico, de diminuir a dispersão de gotículas respiratórias do próprio, atendendo ao facto de haver casos de pessoas que estão a expelir o vírus e não apresentam ainda sintomas ou não virão a apresentá-los de todo”.

Conclusão

O polímero politetrafluoretileno (PTFE), utilizado no fabrico de máscaras cirúrgicas por ser considerado um método eficaz de filtragem do ar, não é prejudicial para a saúde. O que é prejudicial para a saúde é o ácido perfluorooctanoico (PFOA), também conhecido como C8, que durante muitos anos foi utilizado na produção do PTFE. Recentemente, estabeleceu-se uma ligação entre o PFOA e alguns tipos de cancro, como do fígado ou pâncreas, levando a que este deixasse de ser utilizado. Contrariamente a este componente, o PTFE é considerado seguro e continua a ser aplicado a vários tipos de objetos, nomeadamente nas frigideiras anti-aderentes.

Relativamente às máscaras cirúrgicas, é unânime entre os especialistas que são as mais eficazes na prevenção da transmissão do novo coronavírus, sendo as mais aconselhadas pelas autoridades de saúde.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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