Qualquer português que assista às manifestações dos polícias – que reivindicam melhores condições de trabalho e recusam deslocar-se em viaturas sem segurança – não pode deixar de ficar orgulhoso pelo estado do país. É que os protestos vêm desmentir a ideia de que Portugal estagnou e tem-se vindo a atrasar em relação às nações mais desenvolvidas. É totalmente falso.

Os Estados Unidos da América têm uma das sociedades mais evoluídas do mundo e Portugal, com os chaços da PSP e as infiltrações nas esquadras, mostra que está muito avançado, pois pratica políticas modernas nas forças de segurança há muito mais tempo que os progressistas americanos. Refiro-me, como já percebeu o leitor bem informado (ou o que leu este texto um bocadinho à frente), ao movimento “defund the police”, que faz sucesso em Portugal.

Em algumas cidades americanas, a desorçamentação dos departamentos de polícia tem vindo a ser aplicada desde o homicídio de George Floyd, em 2020. Ora, em Portugal, o desinvestimento é muito anterior a isso. Se tivesse de indicar uma data relacionada com um Floyd, diria que é desde o último álbum dos Pink Floyd. Com a formação original, claro.

Neste momento, os carros da PSP estão tão degradados que, quando ligamos para o 118 a solicitar a intervenção urgente de um polícia, temos de enviar um Uber a buscá-lo à esquadra mais próxima.

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É natural que os polícias protestem. Na semana passada, um agente mandou-me encostar na estrada. Mas não me pediu os documentos, pediu-me boleia. E há dias, no Portimonense-Farense, 500 polícias ocuparam uma bancada inteira do estádio municipal de Portimão. Cantaram o hino ao minuto 25 do jogo. Um número simbólico, pois 25 km/h é a velocidade máxima recomendada nos carros de patrulha. Por isso é que lhes chamam carros de patrulha pata: vão mais rápido se forem a pé. Todos de preto, pareciam mesmo uma claque. Às tantas, até julguei tê-los ouvido cantar o clássico “A bófia não anda aqui!” Os carros não servem para andar, mas são ideais para fazerem festas. Acendem tantas luzinhas no tabliê que parecem discotecas.

Os protestos também se devem ao facto de o Governo ter aprovado o pagamento de um suplemento de missão para as carreiras da PJ, sem equivalente nas restantes forças de segurança. Um agente da PSP não recebe suplemento de missão, mas sente-se um missionário, pela posição em que o Governo o coloca.

Prestes a entrar em campanha eleitoral, os partidos oferecem-se para resolver os problemas dos polícias. O mais entusiástico é Pedro Nuno Santos. No Sábado disse: “Queremos ser os primeiros, se for possível, a receber a plataforma que representa as forças de segurança. Queremos fazer isso o quanto antes, estamos disponíveis para os receber já na próxima semana”. Antes de mais, louva-se a vontade de mudança de PNS. É refrescante ver um secretário-geral do PS que, cheio de vontade, se propõe proactivamente a colocar questões à polícia. O habitual é o contrário, ser a polícia a querer interrogar dirigentes do PS.

Mas o mais insólito é o facto de o partido do Governo ter pressa para ouvir os polícias queixarem-se do Governo. Aparentemente, enquanto candidatos, os socialistas propõem medidas para resolver os problemas causados por medidas aplicadas pelos socialistas enquanto Governo. Não sei se a artimanha vai resultar e engana os polícias. Ninguém melhor que um polícia para topar o conhecido estratagema em que Pedro Nuno é o good cop e Costa é o bad cop. Até porque, no fim do dia, são ambos socialist cops.

Ultimamente, olhando para as sondagens e vendo a popularidade que o PS mantém ao fim de 8 anos de Governo, vários analistas têm dito que o partido domina completamente o sistema político português. Prevêem que o futuro traga uma sucessão de Primeiros-Ministros socialistas, em que cada um fará campanha a dizer mal do Governo anterior do qual fez parte e de cujas medidas é corresponsável. Parece que isto se chama “hegemonia”. Ou, como se trata de Portugal, “hegemoníaco”: a mistura entre hegemonia e amoníaco, um óptimo detergente que limpa o que foi feito na legislatura anterior para parecer que é um novo começo.

Estou igualmente muito curioso para ouvir as promessas de Pedro Nuno Santos para a saúde. Depois do próprio se ter sujeitado à cirurgia, é provável que proponha que o SNS passe a realizar himenoplastias [https://pt.wikipedia.org/wiki/Himenoplastia] a quem também deseje restaurar a virgindade.

Na escola primária, quando algum coleguinha fazia uma asneira, a professora Isabel castigava ainda os cúmplices. Dizia ela: “Tão culpado é o que rouba o banco, como o que fica no carro à espera”. (O que era bizarro para se dizer a miúdos que ainda não percebiam metáforas e se tinham limitado a entupir o algeroz, um, e a fornecer as pedras, o outro). Mas é uma eficaz imagem sobre responsabilidade e conivência. Há anos que Pedro Nuno Santos estava no carro à espera de António Costa. O objectivo era fugirem os dois com o saque, mas agora PNS quer que acreditemos que estava ali de guarda, para atropelar Costa e impedir o assalto. Vamos ver. Se o carro for como os da polícia, pode ser que não pegue.