O resultado das eleições nos Açores foi uma surpresa. Quase todos esperavam que o PS renovasse a maioria absoluta, sobretudo os socialistas. A reação imediata foi a esperada. Como disse Vasco Cordeiro, “o PS ganhou as eleições, e o partido que vence, governa”. Essa foi a regra até 2015. Mas o PS deixou de a respeitar. Depois da geringonça, o poder pertence ao bloco maioritário, a esquerda ou a direita. A decisão de António Costa em 2015 reduziu a política portuguesa ao confronto entre as esquerdas e as direitas. Mas custa muito aos socialistas aceitar a nova regra, agora que estão nos Açores como estavam o PSD e o CDS em 2015.

Os socialistas usam ainda um segundo argumento, que resulta do primeiro. Apesar de não haver uma maioria de esquerda, podem governar em minoria, com apoios parlamentares variáveis. Foi o argumento dos opinion makers amigos do PS na noite das eleições. Na análise das eleições, na edição de segunda feira, o Público tem esta frase admirável: “Cordeiro parte para o seu último mandato no governo mais fragilizado do que nunca”. Extraordinário, para o Público, o parlamento açoriano é irrelevante. Mesmo sem maioria, o PS ganhou, por isso tem uma espécie de direito natural a continuar no governo.

Outros socialistas foram ainda mais longe. Afirmaram que um parlamento não pode funcionar com oito partidos. Por isso, deveria realizar-se novas eleições. Este argumento é ainda mais espantoso do que o anterior. Se aquele não respeita o parlamento açoriano, este quer educar os eleitores: não podem votar em tantos partidos. O sonho do PS é dizer aos portugueses em que partidos podem e devem votar.

O último argumento pretende aproveitar as divisões entre as direitas. Se não há maioria de esquerda, o PS pode governar com alguns partidos de direita, por exemplo o CDS e o PPM. O PS seria assim o partido permanentemente no poder. Com maioria absoluta, com maioria parlamentar das esquerdas, em minoria, ou com apoio de alguns à direita. Eis o conceito socialista de democracia: não há alternativas de governo; o PS é que muda de parceiros.

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Neste momento, compete aos partidos de direita mostrar que o PS está errado. Depois da geringonça em 2015, é uma responsabilidade histórica. E com implicações nacionais. Nos Açores, as direitas vão mostrar se os portugueses podem olhar para elas como uma alternativa ao governo socialista nas próximas eleições legislativas.

Na noite das eleições açorianas, o CDS e o PPM orgulharam-se de ter contribuído para o fim da maioria socialista. Se fizessem uma aliança com o PS, esse passo significaria a reconstrução da maioria socialista. Seria impensável. O Chega já garantiu que nunca votará a favor de um governo socialista, o que faz sentido. Se o fizesse, André Ventura não poderia fazer campanha nas presidenciais contra a cooperação entre Marcelo Rebelo de Sousa e o governo socialista.

Como partido mais votado, o PS irá tentar formar governo. Se todos os partidos de direita votarem contra o governo socialista, não terá maioria parlamentar. A iniciativa política depois passará para as direitas. Espera-se que estejam à altura das suas responsabilidades.