As reacções ao manifesto em prol da democracia liberal publicado no Público, de que fui um dos subscritores, leva-me a escrever sobre o assunto. A par com os vários elogios anónimos oriundos da direita, que passaram despercebidos mas que devem ser referidos, houve lugar a várias críticas nas redes sociais e em alguns artigos de opinião. Estas cingiram-se a dois aspectos: primeiro, que o manifesto se traduzia numa submissão da direita à esquerda; segundo, que o acordo do PSD com o Chega nos Açores não devia ser questionado, sendo até do agrado de alguns dos que não gostaram do manifesto.
Relativamente ao primeiro aspecto, fui forçado a concluir que quem recuse movimentos nacional-populistas, xenófobos e autocráticos é rotulado de amigo da esquerda. Como se ser de esquerda seja o equivalente automático a ser contra os ditos movimentos nacional-populistas, xenófobos e autocráticos. Como se a esquerda tivesse o monopólio da luta contra, e cito o manifesto, as “forças políticas que menosprezam as regras democráticas, esmagam as minorias, estigmatizam etnias ou credos, acicatam os divisionismos, naturalizam a linguagem insultuosa, agitam fantasmas históricos, degradam as instituições”. Não tem. E porque não tem, criticar e recusar a dita amálgama que o manifesto tão bem menciona não torna amigos da esquerda quem o subscreve, mas sim em veladores de princípios. Básicos, mas ao que parece não consensuais. Essenciais numa democracia liberal, mas ao que parece descartáveis quando se quer chegar ao poder. De princípios que parte da esquerda portuguesa não partilha, ponto em que se equipara ao Chega.
O segundo tipo de crítica ao manifesto relacionou-se com a recusa do acordo entre o PSD e o Chega nos Açores. O manifesto não tinha nada que ver com o dito acordo, mas foi uma maneira de o estereotipar e, a partir daí, reduzir o seu âmbito. Independentemente disso e porque foi essa a crítica, devo referir que considero que o acordo é mau para os Açores e é mau para a direita. Para meu espanto, este manifesto levou pessoas que lutaram contra o Chega a aceitarem o acordo com o partido de André Ventura. O seu raciocínio subjacente é este: havendo entendimento à esquerda, só com o Chega a direita volta a governar. A conclusão, além de fatalista, é falsa. É falsa, porque coloca o Chega no mesmo espaço político que PSD, CDS e IL; é fatalista, porque reduz a direita a uma coligação negativa. Reduz a direita àquilo em que a esquerda se tornou desde 2015. Nesta perspectiva, à direita não caberia mais ter um projecto reformador; à direita não caberia libertar a economia, que equivale a tirar as mãos do Estado de cima da vida dos cidadãos. Nesta perspectiva, à direita resta somar sobras de votos na esperança que façam uma maioria para governar (será mais aguentar-se) quatro anos e ir gerindo o sistema criado pela esquerda. É este o único resultado possível de uma coligação negativa: esperar que a legislatura termine para poder clamar sucesso, que foi precisamente o que fez a geringonça de esquerda. Por isso o acordo nos Açores é mau para os açoreanos (como a geringonça de esquerda foi má para o país) e péssimo para a direita. A direita que se reduz a acordos negativos é uma direita que concede e aceita uma superioridade moral, intelectual e cultural à esquerda. Não existe, vegeta. Não governa, junta votos. Não tem discurso, nem política, mas frases ocas e medidas estéreis. Não faz alianças, mas dá jeitos conforme as conveniências. Contenta-se em marcar passo. Uma direita perfeitamente à altura do que tem sido Rui Rio, André Ventura e Francisco Rodrigues dos Santos.
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