A falta de personalidade das elites portuguesas é um perigo nacional permanente”. Artur Ribeiro Lopes (in “Política”).

Vai para aí grande celeuma por se ter atribuído a nacionalidade portuguesa, em Abril de 2011, ao judeu russo Roman Abramovich, que se tornou conhecido entre nós por ser o dono de um clube inglês de Futebol, o “Chelsea”, sobretudo depois de o português José Mourinho ter treinado o clube e obtido muitas vitórias naquele jogo em que 25 cidadãos correm atrás de uma bola a ver quem a mete num espaço coberto de rede por todos os lados menos por um, chamado baliza. Não foi por ser rico, tão pouco por ser amigo de um novo “Tsar” (“César”, em russo), de uma renovada Federação Russa, nem sequer por ser seguidor da lei mosaica.1

Ora o nosso agora “compatriota” passou de bestial a besta por o seu chefe de Estado (o tal Tsar) – poderia, por outras razões, ser o Presidente da Lituânia, pois ele também tem essa nacionalidade; idem para Israel, ou até o próprio presidente português, afinal ele, Abramovich, colecciona nacionalidades para quê? – ter ordenado invadir a Ucrânia e, com isso, indispor grande número de países contra ele – nomeadamente os do mundo “Ocidental” e, no caso vertente, esta nesga de terra cercada de mar e Espanha.

E tal teria feito despertar, “helás”, suspeitas de que a nacionalidade portuguesa tinha sido mal atribuída (ou foi coincidência?).

Isto num país em que a nacionalidade portuguesa (apesar do terno “Nação” ter sido abolido do discurso político) é distribuída a esmo, e vale menos do que um caracol, esse simpático gastrópode a que os alentejanos (que ainda restam) amiúde apelidam de “animal irrequieto”.2

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Ora os verdadeiros portugueses, e quem lhes faz a cabeça, não deviam estar preocupados com o facto de o russo Abramovich passar a ser português pelas razões apontadas (haver suspeitas de o Rabino Daniel Litvak, íntimo da “comunidade Israelita do Porto”, e que dava os pareceres sobre a descendência sefardita dos candidatos a nacionais, não ter actuado correctamente) que são laterais à questão, mas sim, porque de facto, tudo o que se tem vindo a passar com a atribuição da nacionalidade portuguesa ser um embuste pernicioso e de lesa-Pátria, a começar na lei principal que o regula.

Porém, a atribuição da nacionalidade portuguesa não ocorreu através dessa mesma lei, facilitista e corruptora da matriz cultural portuguesa que temos (a Lei 37/81, de 03 de Outubro), que já vai em onze versões, a última das quais é a Lei Orgânica no 2/2020, de 10/11; tão pouco pela Lei que regulamenta a atribuição dos Vistos Gold e actividades correlacionadas, a que já apelidei várias vezes, de “prostituição da nacionalidade‟, que nos devia envergonhar a todos pela falsidade e cupidez que encerra – mas infelizmente raros são as opiniões que se preocupam com coisas importantes.3

O senhor Abramovich pretendeu obter a nacionalidade portuguesa (vá-se lá saber porquê) através de uma outra Lei especial, aprovada na Assembleia da República, por unanimidade: a Lei 1/2013, regulada pelo Decreto-Lei 30 – A/2015.

Esta Lei permite aos descendentes dos judeus portugueses que tenham sido expulsos de Portugal desde o reinado de D. Manuel I (e estejam espalhados pelo mundo) que possam requerer, mediante prova, a nacionalidade portuguesa, por naturalização, isentando-os dos requisitos de residência e conhecimento da língua.

A prova (como se conseguirá “provar” uma coisa destas?) tem que ser atestada como verdadeira pela Comunidade Israelita/Judaica do Porto ou de Lisboa.

Ou seja, o Estado Português fez-se substituir por uma “entidade social‟ cujo estatuto jurídico, ou outro, se desconhece, e ligada a um país estrangeiro. E estranha- se até que, sendo Portugal um Estado laico e não havendo discriminação relativamente a religião, se possa interpretar existir uma “Comunidade Judaica‟ entre a nacionalidade portuguesa?4

Ou será que ser judeu é já uma nacionalidade como o uso indiscriminado dos termos “judaico” e “israelita”, indicia?

Ora o senhor Abramovich, que terá alegado ter tido uns ancestrais portugueses que viviam em Hamburgo, veio a ser atestado como tendo direito à nacionalidade portuguesa, ou seja, é um descendente de judeus expulsos de Portugal!

Ora, mesmo sem conhecer nada do processo, permito-me duvidar que tal seja verosímil, ou apenas tem 0,001 % de hipóteses de ser verdade.

A razão é tão simples quanto isto: os judeus que havia em Portugal, no século XVI, eram descendentes da diáspora judaica que houve no Império Romano especialmente depois de as Legiões de Roma, comandadas pelo general Tito (mais tarde imperador), terem destruído o II Templo (de Salomão), em Jerusalém, em 70 DC e que , mais tarde, habitaram os territórios sujeitos às invasões dos “bárbaros”, árabes, otomanos, etc.

Assim chegaram à Península Ibérica e por cá ficaram misturados com a amálgama que se foi fazendo, até os povos/nações que se foram formando se individualizarem nas realidades políticas que ainda hoje existem, chamadas Portugal e Espanha.5

Ora esta gente, originalmente oriunda da região da Judeia e outras partes do Médio Oriente eram Semitas, com características próprias, donde sobressaiam uma tez branco escuro e um nariz grande e algo adunco.

Os judeus são também caracterizados por casarem entre eles e raramente com outros de diferente estirpe a quem muitos chamam, algo depreciativamente, “Goy” ou “goym‟ (gentio, estranho). Num modo, aliás, de auto preservação e sobrevivência, a que se deve acrescentar a maior importância dada ao ser “filho de judia‟ – que também acontece em algumas tribos africanas – o que não deixa de ser uma garantia de individualização cromossomática.

Ora o senhor Abramovich de “branco escuro‟ não tem nada é, outrossim, alvo, mais branco até do que a grande maioria dos portugueses. Ou seja, não pode ser sefardita (de “SEFARAD‟ Península Ibérica, em hebraico), logo dificilmente será descendente de antigos judeus portugueses expulsos ou auto exilados das antigas partes do Reino de Portugal.

Então o que é?

Bom, não sendo “Falacha” – um grupo minoritário de judeus que habitavam uma área onde hoje fica a Etiópia (são por isso negros acastanhados), só pode ser um judeu Ashkenazi (em português “Asquenaze”), “raça” de judeus há muito tempo maioritária no mundo, oriundos de um reino outrora existente numa área extensa entre o Mar Negro e o Mar Cáspio, constituídos por tribos migrantes da Ásia Central, a que se deu o nome de “Kazharia‟, ou Reino dos Khazars. Um Rei desta gente, no século VIII, converteu-os ao judaísmo. O Reino foi derrotado pelos russos no século XI e desapareceu.

Estes novos judeus foram-se espalhando pela Rússia e toda a Europa do Norte e Central, onde foram perseguidos durante 1000 anos, por razões que não vamos agora aflorar. Foram até expulsos de Londres, capital da, hoje, muito liberal e democrática Inglaterra, em 1290. Sem embargo de contemporaneamente só se falar da Inquisição Portuguesa e Espanhola, pouco da Italiana e quase nada da Austríaca. Tudo o resto foi “esquecido”, incluindo as perseguições ocorridas nas populações maioritariamente tocadas pelo Luteranismo.

Ainda tem mais: a maioria dos judeus que abandonou Portugal – onde até ao reinado de D. Manuel I tiveram sempre um razoável relacionamento por parte das populações e Coroa Portuguesa, aliás numa tradição Moçárabe que vinha do anterior – dirigiram-se para as partes ultramarinas da nação portuguesa, onde essa “perseguição” quase não se fez sentir, e sobretudo para a Inglaterra, Países Baixos e Repúblicas Italianas, onde ajudaram o sistema financeiro daqueles países a prosperar. Do mesmo modo que judeus portugueses que resolveram acompanhar os invasores holandeses expulsos definitivamente do Brasil, em 1654, e se dirigiram à América do Norte, estiveram na origem da Wall Street, após a fundação de Nova York, com o primitivo nome de “Nova Amesterdão”.

Ora o Rei D. Manuel I também teve razões sociais, religiosas e de Estado – apesar de tal poder ser tido como uma violência e se tenham cometido muitas injustiças e barbaridades – para expulsar os judeus (decisão que ficou muitas vezes a “marinar‟), que não se quisessem converter ao Cristianismo. Isto após um número estimado de judeus, entre 40 a 120 000 (segundo os principais cronistas e estudiosos) ter chegado a Portugal, vindos de Espanha (não eram pois portugueses), após a data limite para permanecerem no território, recentemente unido pelos Reis Católicos, após a Conquista de Granada: 3 de Agosto de 1492 – curiosamente a data em que Cristóvão Cólon (não Colombo) zarpou de Palos de La Frontera, para a sua primeira viagem para o que ficou conhecido como “Novo Mundo”.

Mas como o politicamente correcto (e também os judeus) não querem aparentemente que se saiba ou fale destas coisas e muito mais, agora surgem estes casos, que seguramente não têm a ver apenas com eventuais negócios obscuros de corrupção barata.

Por isso Abramovich deve ser tão descendente de sefarditas portugueses, como o cônsul Aristides Sousa Mendes passou 30 000 vistos, em meia dúzia de dias, aos refugiados que fugiam das tropas alemães, em 1940, como é alegado…

E se quiserem tirar a prova dos nove, convidem o Abramovich a ir orar numa sinagoga sefardita, ou ofereçam-lhe uma campa num cemitério que não seja para ashekanezi, para ver como é que ele reage (para uma data que Deus afaste).

Aliás, este caso, e os já 56 685 judeus a quem foi atribuída a nacionalidade portuguesa, só foi possível porque houve uma proposta para se aprovar esta lei dita “humanista” e “aberta e generosa” mas que, na prática, é idiota por utópica e perigosa por incerta. E agora começou a ser um caso de polícia.6

Tanto quanto se sabe a autoria desta Lei é do então deputado do CDS-PP Ribeiro e Castro, o qual veio a ter ajuda, entre outros, da deputada do PS Maria de Belém Roseira, tendo a lei sido proposta pelo CDS e PS.

Por melhores que tenham sido as intenções (de que está o inferno cheio) dos que a idealizaram – e é sempre de louvar os bons propósitos – a lei abriu uma “caixa de Pandora”, para além de não se vislumbrar como poderá corrigir eventuais injustiças cometidas há mais de 400 anos, aliás num quadro político, social e moral, muito distinto do actual.

Não sei até porque é que não se faz uma lei também para dar a nacionalidade portuguesa a descendentes de pessoas que por cá tenham tido o estatuto de escravos.

Sem embargo de haver já por aí uns quantos mouriscos que também querem ter direito à nacionalidade portuguesa alegando a mesma reparação que agora se deu aos sefarditas.

E também não se entende como é que atribuir a nacionalidade portuguesa possa reparar algo a putativos descendentes de judeus que nem sequer a perdiam, pelo facto de serem expulsos, há quatro séculos. E, não raro, adquiriram uma nova. Será que agora o Estado português vai ter a coragem e a decência de retirar a nacionalidade a quem ela foi indevidamente (e nunca devia ter sido) atribuída?

E é, outrossim, curial tentar perceber porque é que existem tantos judeus, que terão uma remota ideia do nosso país, a quererem a nacionalidade portuguesa, a maioria dos quais vive em Israel. Será por quererem ter uma retaguarda para viver caso os muçulmanos os expulsem da Palestina? Onde, “por acaso”, habitam desde a fundação do Estado de Israel muitos mais Ashkanezin do que Semitas?

Semelhante a tudo isto, é o acordo existente – e cujos contornos permanecem “camuflados” – para que alegados descendentes de portugueses que habitavam o antigo (e saudoso) Estado Português da Índia possam requerer a nacionalidade portuguesa, o que permite a qualquer indiano que se preze de querer entrar no espaço europeu, obter o passaporte português. Esquema semelhante também já foi montado em Macau.

Aliás, a bandalheira é tanta (a que se chama com ufania “estado de direito democrático”) e tanta gente finge que não vê que muitos outros cidadãos do mundo, nomeadamente brasileiros, que trabalham num país europeu, venham viver para Portugal quando chega ao fim o seu visto temporário, a fim de obter a nacionalidade portuguesa (a qual está em almoeda ao nível do tal caracol) e depois regressar ao país de onde vieram.7

Tudo isto num país chamado Portugal (que era, por si só, uma espécie de “CEE”, sozinho, mas muito mais avançado) que não permitiu a cerca de 60% da população – que tinha o estatuto de portuguesa – poder optar igualmente por essa cidadania (mesmo aqueles que lutaram de armas na mão, no nosso Exército), aquando daquela coisa ignóbil que deu pelo nome de Descolonização!

A falta de “personalidade” das elites portugueses é, de facto, um perigo nacional permanente.

1 Abramovich tem uma fortuna avaliada em 12.3 biliões de dólares. Consta ainda estar ligado à Liga Anti Difamação; ao B ́nai B ́rith Internacional; ao Holocaust Educational Trust e à Conferência das principais organizações judaicas Americanas.
2 Sim porque os alentejanos do futuro vão chamar-se qualquer coisa terminada em “vich”; Abrahim; Djaló, Smith e outros apelidos do mais fino recorte lusíada…
3 Legislação entretanto alterada pelo Decreto-Lei no14/2021, de 12/02 (mas que só entrou em vigor, a partir de 1/1 do corrente ano), certamente pelos abusos, incongruências e danos, entretanto verificados. O que não encerra a questão pois o fundo de tudo isto chama-se a “extinção de Portugal e dos portugueses”.
4 Relativamente às provas, estas deviam incluir para além de um estudo genealógico, uma certificação que inclua alguma característica ligada a Portugal, como apelidos, idioma, familiares directos ou colaterais, etc.
5 Um dos muitos nomes ou epítetos, que existem em Portugal, sobre os judeus, existe um curioso, que lhes chama “judeus errantes”.
6 Agora também decorre um processo disciplinar no IRN (Instituto de Registo Notarial), organismo que dava o “ámen” final à certificação dos candidatos à lei dos sefarditas. Entre 1/3/15 e 31/12/21 foram atribuídos os tais “passaportes” a 56 685 estranhos; mas houve 137.087 pedidos! Dos atribuídos só 300 foram recusados e há 80.102 pendentes! Ver “ECO” de 15/3, no Sapo 24.
7 Veja-se o que disse o Dr. Joshua Ruah (o nome não engana), que esteve à frente da comunidade Judaica de Lisboa, em entrevista ao Diário de Noticias, publicada no dia 15/3/22, em que teceu considerações pouco elogiosas para com a comunidade judaica do Porto tendo, a dado passo dito (referindo-se ao processo de certificação de putativos sefarditas, “Foi a de que bastava como prova um rabino de uma sinagoga sefardita – até podia ser da Cochinchina – dizer que fulano de tal frequentava a nossa sinagoga e é do rito sefardita e pouco mais. É o caso desse “futebolista”, o Roman Abramovich”. E diz muito mais, a começar por “Que é uma estupidez”. E a entrevista tem uma nota, no final que diz “A entrevista foi concedida antes dos recentes desenvolvimentos do caso que envolve a atribuição de nacionalidade portuguesa a Roman Abramovich pela Comunidade Judaica do Porto”. Adianta-se ainda como curiosidade e certamente por coincidência, que outro arguido que está a ser investigado é o Dr. Francisco de Almeida Garrett, sobrinho da Dra. Maria de Belém Roseira.