Essa manhã eu estava lendo o livro Correr, do médico e escritor Drauzio Varella. Na página 53, ele começou a narrar a história da maratonista brasileira Adriana Silva. Num dado momento, me deparei, surpresa, com o seguinte trecho, acerca da carreira da atleta:

“Os controles ginecológicos mapeiam suas menstruações (que são regulares), para evitar provas que coincidam com esse período, precaução nem sempre possível. ‘Correr menstruada, com cólica, desconcentra, prejudica a performance e duplica o sofrimento’, diz Adriana.”

Eu confesso que na última semana, enquanto assistia aos Jogos Olímpicos, em nenhum momento havia parado para pensar nesse assunto. Enquanto as mulheres jogavam futebol, vôlei ou tênis, enquanto nadavam, corriam ou lutavam judô, em nenhum momento eu imaginei que boa parte delas pudesse estar menstruada, com dores abdominais e tantos outros desconfortos que obviamente atrapalhariam suas performances.

Sim, é possível evitar que isso ocorra recorrendo a hormônios ou outras formas bastante invasivas de tentar gerir fenômenos naturais com mecanismos artificiais. Mas, a que custo? Quantos danos colaterais podem derivar dessa manobra? Como o corpo responde a esse tipo agressão?

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Eu, honestamente, não consigo imaginar como alguém pode ser capaz de fazer saltos ornamentais utilizando um absorvente interno. Ou como uma mulher consegue fazer uma corrida com obstáculos enquanto o seu fluxo desce, por melhor que possa ser sua proteção. Ou, ainda, como alguém pode jogar 90 minutos de uma partida de futebol com cólicas menstruais.

Atletas merecem muita, muita admiração e respeito. Suas carreiras são histórias de esforços e sacrifícios que, em geral, não são recompensados financeiramente de forma justa. É muito fácil julgar uma derrota (ou até um afastamento voluntário, como no caso da corajosa Simone Biles, que deixou as competições por motivos de saúde mental) sem enxergar a longa história que há por trás dela. E trata-se não só de um julgamento infundado, mas de um julgamento cruel.

Sigo, cada vez mais, tentando admirar genuinamente as trajetórias dos atletas, independentemente dos seus resultados. Mas, agora, quando olho para atletas mulheres e me lembro que elas menstruam – e que elas podem ter dor de ovulação, e que elas podem ter inchaço derivado do anticoncepcional, e que elas podem estar no período pré menstrual, e que elas podem ter sequelas de pós parto – a única coisa que me ocorre é: respeito. Muito respeito. Porque isso é realmente heroico.