O 25 de Abril foi há mais de 45 anos, mas as esquerdas não conseguem deixar de ser “anti-Salazaristas” ou “anti-fascistas”. Essa atitude não larga as nossas esquerdas. Mais, não sabem fazer política se não existir um “Salazar”. Ficam perdidas. E, não havendo Salazar, criam um. Vejam a lista de “Salazares” na história política portuguesa desde o 25 de Abril e mais de meio século depois do original ter morrido. Sá Carneiro e Freitas do Amaral foram alguns dos primeiros “Salazares” e “fascistas” da democracia portuguesa. E não foram apenas as extremas esquerdas a atacar o “fascismo” dos fundadores da AD. O PS juntou-se ao coro “anti-fascista” durante as campanhas eleitorais da primeira AD e da candidatura presidencial de Freitas do Amaral.

Mais tarde, foi Cavaco Silva a ocupar o lugar do “Salazar” das esquerdas. Durante os anos das maiorias absolutas de Cavaco, um autêntico inverno político para as esquerdas, Cavaco tornou-se uma figura “Salazarista” para as nossas esquerdas. Recentemente, o lugar de “Salazar” foi ocupado por Passos Coelho. Aliás, a necessidade da figura Salazarista é tão forte que já Passos Coelho tinha abandonado a liderança do PSD, e as esquerdas ainda o atacavam. Foi mesmo mais atacado do que o próprio Rui Rio.

Desconfio que a partir de agora as esquerdas vão deixar Passos Coelho mais descansado. Já encontraram um novo “fascista”: chama-se André Ventura. As esquerdas, em primeiro lugar o Bloco de Esquerda, logo seguido pelo PS (o PCP anda mais preocupado), andavam desesperadas por por um “Vox” ou por um “Salvini” portugueses. Nisto, as esquerdas portuguesas não são diferentes das suas camaradas de outros países do sul da Europa. Em grande medida, Le Pen (o Pai) foi uma criação política dos socialistas franceses e de Mitterrand. Em Itália, o Partido Democrata e Renzi (entretanto abandonou o partido) acreditam que o seu ressurgimento passa pelo combate ao novo “Mussolini”, Salvini. E em Espanha, a extrema esquerda Catalã, o radicalismo do Podemos e a estranha fixação do PSOE pelo cadáver de Franco ajudam a explicar o terceiro lugar do Vox nas últimas eleições.

As esquerdas precisam de “fascistas” por duas razões. As extremas esquerdas acreditam que beneficiam politicamente do aumento do radicalismo e da polarização. Foi o que aprenderam com a história do século XX e com os seus grandes mestres como Lenin, Trotsky e Estaline. Aliás ainda mais impressionante do que o persistente “anti-Salazarismo”, é o leninismo e o trotskyismo das extremas esquerdas portuguesas. De um ponto podemos estar certos: o mundo muda, mas o PCP e o Bloco não mudarão. Mesmo a suposta modernidade do Bloco, não passa de uma aparência. No fundo e no essencial, continua a ser um partido Trotskyista, radical e revolucionário.

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No caso das esquerdas moderadas, e do PS, a figura “salazarista” é instrumental. O PS não precisa da extrema direita para crescer. Mas enfrenta um problema diferente. Os governos socialistas deixam de governar quando o dinheiro se acaba. Como mostra a degradação dos serviços públicos, o governo socialista não tem dinheiro para distribuir. Neste momento, o grande pesadelo para Costa será perceber como vai governar durante quatro anos sem dinheiro. Nesse sentido, a emergência de um partido de extrema direita ajuda. Distrai os portugueses e transforma o PS, de novo, no líder da luta contra o “fascismo” em Portugal.

Tal como aconteceu em França, em Itália e em Espanha, o oportunismo das esquerdas vai virar-se contra elas. O Chega já está a crescer e, em parte, à custa do eleitorado de esquerda. Há duas razões que ajudam a explicar o crescimento de partidos como o Chega. As esquerdas abandonaram o operariado e as classes baixas sub-urbanas. Os seus líderes já não vão às fábricas, só sabem falar para as elites urbanas e intelectuais, e mesmo os sindicatos transformaram-se em em grupos políticos cada vez mais afastados dos trabalhadores. Em França, a emergência dos “coletes amarelos” resultou da crise dos sindicatos tradicionais. Já não representam ninguém a não ser os seus dirigentes. Estas classes baixas, que habitam os bairros abandonados na periferia das grandes cidades, são os que mais sofrem com a emigração e, em matérias de costumes, são maioritariamente conservadoras. A nova agenda das esquerdas nada lhes diz, no melhor dos casos. No pior dos casos, são contra mais emigração e contra os ataques à família tradicional. Não é por acaso que o PCP é muito prudente com as questões sociais e de género.

Além disso, muitos dos eleitores já deixaram de levar a sério o rótulo de “fascista” ou de “Salazarista”. A vulgarização do termo, pelas esquerdas, acabou com os “fascistas” e com os “Salazaristas”. Podem chamar o que quiserem ao André Ventura. Não será isso a travar o seu crescimento. Será que as esquerdas nunca aprendem? Não percebem o que está a acontecer em França, Itália e Espanha?