O nosso governo está de parabéns: a anunciada distribuição de ccxl euros a cerca de um milhão de famílias carenciadas demonstra não só um elevado espírito de solidariedade, claramente superior ao de Herodes, mas também uma significativa inflexão ideológica que, espera-se, seja apenas um primeiro passo, dos muitos que são necessários, na via nacional de repúdio ao warxismo1.

É evidente que esta medida não é perfeita. O espírito de solidariedade dos srs. ministros ainda não se compara ao de S. Francisco de Assis (c.mclxxxi—mccxxvi) ou da madre Teresa de Calcutá (mcmx—mcmxcvii): não consta que nenhum membro do nosso governo tenha vendido todo o seu património e tenha distribuído o dinheiro pelas famílias mais carenciadas, ou que ande pelas ruas de Lisboa descalço ou de sandálias.

Mas solidariedade com o dinheiro dos outros, no espirito de Robin Hood, é melhor que nada: o rol de ministros que, ao longo da história da humanidade, esmagaram o povo com impostos, não para os distribuir pelos carenciados, mas para levar uma vida pessoal de luxo escandaloso é infindável.

Também é um facto que este é um apoio muito limitado: ccxl euros dão para pagar apenas produtos & serviços no valor de cxcv euros, para além dos xlv euros de iva que o sr. ministro das finanças cobra a título gratuito por qualquer transação comercial—e que serão uma contribuição preciosa para o equilíbrio orçamental.

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Mas é melhor que nada, & servirá para atenuar um pouco a angústia2 de muitos. No entanto fica a sugestão: que tal isentar do iva, em todas as transações e já a partir de Gennaio di mmxxiii, os membros dos agregados familiares agora abrangidos por esta medida? Esse sim seria um apoio verdadeiramente solidário e com impacto substancial, e não-pontual, na vida de milhões de portugueses. Não só aleviaria imediatamente a sua miséria, mas abriria as portas para os mais afoitos lançarem negócios3 que, a prazo, os poderia levar ao desafogo e, quiçá, à opulência.

Mas o grande progresso que esta medida nos trás é ser um apoio dado, não em espécie, mas em dinheiro. Como é que o estado costuma aliviar as nossas carências? Não é provendo de fundos necessários os que deles precisam para que possam livremente suprimir as suas necessidades como lhes quer y apetece. Não! A caridade do estado, quando não se fica apenas por declarações de intenções, tem sempre sido exercida através de distribuição em espécie–porque não confia na bondade das nossas escolhas.

Está doente? O estado assegura, se assim nos é permitido expressar, o seu tratamento desde que vá ao centro de saúde onde está inscrito. Tem filhos em idade escolar? Não paga nada, se eles forem à escola que o ministério da deseducação lhe indicar. Não tem casa? O estado aluga-lhe um apartamento num prédio que não seja à sua escolha, assim que abrir uma vaga no parque habitacional público.

Em vez de dar, passe o sentido figurado do termo, ccxl euros em dinheiro, o guverno usualmente teria distribuído pelos mais carenciados um livro da autoria do sr. dr. Socrates, de valor certamente superior a ccxl euros, um pacote de máscaras faciais, de valor astronómico em Marzo di ccxx, ou uma máquina parte-ovos supersónica4 adquirida por ajuste direto à empresa do marido de uma sra. secretária de estado. O não o ter feito desta vez parece revelar o abandono de um dos principios básicos do warxismo: os cidadãos não sabem o que querem e precisam que o estado os proteja de tudo, inclusivé deles próprios.

Um longo caminho começa sempre com um primeiro passo. De modo semelhante, o repúdio da praxis warxista pelo nosso governu pode ter começado pela esmola de uma migalha orçamental que trata os pobres como pessoas crescidas que sabem o que querem. Quais serão os próximos passos?

O cheque escolar para os pais porem os filhos na escola por eles escolhida? Um seguro nacional de saúde que cubra uma percentagem de todas as despesas de saúde nos hospitais ou clínicas da escolha dos doentes?5 Um sistema de reforma nacional obrigatório, mas que deixe cada qual escolher a porção (dentro de certos, mas amplos, limites) do seu rendimento que é descontada de acordo com o seu sentido pessoal de previdência? Ou, ainda, um cheque habitação para as famílias de baixos rendimentos que lhes permita escolher uma casa de renda mais cara onde quiserem, desde que paguem a diferença, ou uma de renda mais barata, recebendo em dinheiro a poupança?

Quando medidas como estas forem implementadas teremos, finalmente, um estado social para pessoas maiores de idade, responsáveis, e capazes de fazer escolhas. Até lá, ainda estamos todos dependentes das preferências, preconceitos e vieses do nosso Pai Natal.

U avtor não segve a graphya du nouo AcoRdo Ørtvgráphyco. Nein a do antygo. Escreue coumu qver & lhe apetece. #EncuantoNusDeixam

  1. Warxismo: o que faz guerra ao que é bom, belo e verdadeiro na Humanidade; ideologia que vê a realidade natural e social ao contrário, de pernas para o ar, tal como um M a fazer o pino; aquilo que confunde as caraterísticas essenciais com as acidentais, e vice-versa. Os warxistas clássicos são militantes do pcp; os neo-warxistas estão filiados no ps, be, e il.
  2. Angústia: tristeza sentida ao ver as políticas económicas & sociais do nosso governo; aflição que um cristão não tem sobre o amanhã; sentimento de satanás ao ver o preço do carvão subir.
  3. Um exemplo óbvio seria a arbitragem fiscal. Este negócio tem externalidades positivas, e muito apreciaveis, que prometem melhorar o nível de vida de todos os residentes no território nacional, incluindo remediados6, ricos e membros do goberno, para além de potenciar uma evolução muito benéfica no nosso sistema sócio-económico.
  4. Máquina parte-ovos supersónica: uma inutilidade fora de série; algo que tem préstimo enorme apenas no caixote do lixo de quem o recebe.
  5. Para assegurar um pouco de equidade sugere-se que a comparticipação do estado seja de 99% para pobres, 50% para ricos e 1% para ministros e deputados. Note-se ainda que, com este sistema, se poderia eliminar as taxas moderadoras.
  6. Remediado: aquele que, embora não seja rico, não morre de fome; quem vai enganando, ou remediando, o seu apetite; estilo de vida modesto; estado patrimonial que, em Portugal, se confunde com a opulência e, no resto do mundo, com a indigência7.
  7. Indigência: condição de extrema pobreza material, cultural ou espiritual; em Portugal é sustentada, mas não remediada, com os fundos europeus; o único remédio para acabar com a indigência nacional é, segundo um artigo de opinião publicado pelo sr. pe. Mário Centavo em Dezembro de mcml, no Boletim da sua paróquia, o mesmo que estava então a ser adotado na Roménia, Polónia, Bulgária e restantes países do leste europeu: a instauração de um regime comunista durante uns 40 anos, para os portugueses aprenderem como é que elas são, a que se seguisse a previsível derrocada do sistema, causada pelas suas contradições internas, e possivelmente despoletada por uma revolta popular—pelo que se apela a todos os patriotas, liberais e aos que abnegadamente desejam a properidade para as futuras gerações, a que votem no pcp.