Poucos são os que em Portugal querem saber dos serviços de informações (Serviço de Informações de Segurança e Serviço de Informações Estratégicas e de Defesa). Mesmo entre os mais atentos, são muitos os equívocos sobre os nossos “serviços secretos”. A criação da aberração burocrática chamada Secretário Geral do Sistema de Informações da República (SG SIRP) é ainda mais incompreensível na medida em que se tonou num terceiro serviço com departamentos próprios e gabinete político, complicando em vez de trazer eficiência. Pior: desvalorizou efetivamente a autonomia funcional do SIS e SIED, comprometendo a sua operacionalidade.

Neste imbróglio tão ao gosto da governação nacional, que decide criar estruturas sobrepostas para não ter de resolver os problemas na origem, as avaliações neutras e credíveis têm escasseado sobre a efectiva utilidade do trabalho aí desenvolvido. À excepção dos mesmos de sempre – nomeadamente de um “Observatório” (OSCOT) sobre o qual não se conhece uma página de estudos ou de investigação – sobra um alegado Conselho de Fiscalização do SIRP que, como já escrevi em tempos, se limita a fazer eco de banalidades e a confraternizar com os fiscalizados. O silêncio deste conselho sobre este caso traduz de forma translúcida a sua inutilidade.

Nas últimas semanas ficámos, no entanto, a conhecer duas preciosidades sobre o SIS: a primeira que a grande ameaça à segurança nacional são os movimentos radicais de extrema-direita; a segunda que o SIS obedece cegamente à voz do dono e passou a ter como missão pública recuperar equipamentos informáticos que alguém decidiu classificar de “segredo de Estado”.

Num país em total descontrolo face aos fluxos de imigração provenientes de países de elevado risco político; ao aumento certo (mesmo que não assumido) da criminalidade organizada e comum; em contexto de conflito militar entre dois Estados no limite oriental da Europa, sob a ameaça de estratégias disruptivas de Moscovo; em situação de crise económica internacional e de permeabilidade das infraestruturas críticas europeias; sob a grande incógnita sobre se a União Europeia e a NATO conseguirão gerir integradamente a crise externa; em ambiente de pré-conflito entre a República Popular da China e Taiwan… ficámos a saber que Portugal tem de se preocupar com o crescimento da extrema-direita e que será provavelmente essa a prioridade de acção do SIS – certamente que qualquer “colagem” ao Chega será mera coincidência…

Ficámos também a saber que qualquer chefe de gabinete, secretário de Estado, ministro pode, com um telefonema, mandar o SIS recuperar material “crítico” ou potencialmente comprometedor. O SIS é assim um moço de recados, uma “esfregona” como diria o Eça, do governo. Pior: a ignorância sobre os serviços de informações, a sua missão e os limites de actuação é tal que vimos um ministro assumi-lo de forma totalmente serena e “normal” como se uma qualquer “ordem” justificasse a actuação do SIS sem mandato judicial (que também não poderia ter obtido dado tratar-se de competência policial). Mas há pior: qualquer actuação do SIS assim tornada pública anula a eventual eficácia de qualquer operação. Ou seja, o ministro em causa, talvez para sacudir a culpa, matou o carácter “confidencial” da operação, tornando-a aberta e assumidamente ilegal, colocando um selo oficial sobre a “politização” do SIS.

Apesar de irrelevante para a opinião pública em geral e, em grande medida, para as políticas públicas nacionais (seja a de segurança interna ou externa, caso existam), o SIRP, porque é dotado de um orçamento de mais de 40 milhões de Euros por ano, provenientes dos impostos dos portugueses, tem de se explicar ou de ser imediatamente “reestruturado”. A actual Secretária geral está no cargo há mais de 6 anos e o actual diretor do SIS há mais de 8 anos sendo legítimo que o contribuinte espere correções e que o governo as cumpra. Afinal, perduram ainda muitas embaixadas portuguesas pelo mundo que poderão vagar em nome do “interesse nacional”.

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