Logo que se soube que o Presidente da República (PR) havia recorrido à promulgação de um decreto com implicações orçamentais aprovado por todos os deputados menos os do PS, ficou confirmada a guerra aberta, se não contra o governo, de certeza contra a sua política e, mais do que isso, contra o seu domínio quanto à tal «lei-travão». Simultaneamente, ficou patente que esta iniciativa do PR surge na continuação de outras que já constituíam verdadeiros actos de confrontação.

Na realidade, a abertura do confronto entre o PR e o PM remonta ao modo expedito como o Presidente investiu há cinco meses o PSD e os seus aliados no governo dos Açores, incluindo o ominoso Chega, apesar de o PS local ter mais deputados que o PSD… Tal e qual como o «golpe parlamentar» do PS contra a maioria de votos da coligação do PSD+CDS em 2015: «Cá se fazem, cá se pagam»!

Ainda pensei que o PM deixasse passar a última provocação do PR mas os factos comprovam que António Costa está a vingar-se do que o Presidente lhe fez, mandando o decreto presidencial para o Tribunal Constitucional na esperança que os constitucionalistas de serviço inflijam um desaire ao PR para compensar o chumbo da eutanásia! Quanto a mim, os meios de comunicação estão a enganar-nos quando fingem que nada de grave se passa e que tudo irá correr pelo melhor, conforme têm vindo a fazer desde que o governo atribuiu uma verba inédita à maioria dos «media»…

Ignoro se e quando o actual governo cairá, mas é possível que seja antes das eleições marcadas para 2023! Assim seja: Portugal necessita urgentemente de um governo que ponha termo à demagogia e à propaganda que alimentaram a aliança do PS com o PCP e o BE. Recordo que este governo só logrou constituir-se devido ao calendário das eleições presidenciais, pois quando as legislativas de 2015 tiveram lugar, Cavaco Silva já chegara aos últimos seis meses do mandato presidencial, ficando impedido de dissolver a Assembleia da República perante a insistência do PS em formar uma coligação governamental não anunciada previamente com a «esquerda»…

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Quando o líder do PS concebeu o seu plano, já sabia isso mas nem por isso advertiu os seus potenciais eleitores do que se preparava, pois sabia que grande parte destes não alinharia com a «frente popular» que viesse a constituir-se uma vez fechada a votação. Houve quem avisasse a opinião pública mas tarde de mais. Um dia se conhecerão as negociações que levaram ao «golpe parlamentar» de 2015 mas os danos infligidos ao país serão irreversíveis. Só um novo modelo de governação combaterá a sério – assim esperamos! – o clientelismo, a corrupção e a pressão sobre a comunicação social, bem como a incapacidade de lidar com a pandemia e com a economia conforme o PS demonstrou. A manifesta debilidade governativa do PS e dos seus aliados, desde os incêndios florestais e o assalto de Tancos a todo o género de erros e mentiras, como a gestão das empresas e dos bancos falidos, continua a agravar-se de dia para dia, conforme o disparo da dívida demonstra.

Não é que outros agentes governamentais não venham a cometer outros erros mas pelo menos que não sejam os mesmos cometidos pela série de governos socialistas que levaram o país a sucessivas bancarrotas. Há semanas, se não meses, alguns comentadores aperceberam-se que o PR está com receio de ser arrastado pela desgovernação socialista e não quer ver o seu nome amarrado a ela. Com efeito, o PR não tem perdido as oportunidades de controlar o governo, se não mesmo substituir-se a ele, intervindo como interveio contra decisões governamentais que ferem um eleitorado silencioso e receoso mas que nem por isso deixa de ter as suas opiniões: contra a eutanásia e contra a recusa do PS em atribuir algum dinheiro às pessoas em dificuldade!

A tudo isto acresce a completa desarticulação do PSD e do CDS, cujas lideranças estão entregues ao deus dará, enquanto proliferam os mini-partidos. Repito, pois, que está em curso uma desvinculação política clara entre o PR e o PM enquanto a Constituição pretende que o regime é semi-presidencialista… Pessoalmente, nunca gostei disso e agora está-se a ver porquê: a prova é que os constitucionalistas que o apregoam se inclinam para a primazia do primeiro-ministro…

Esquecem, porém, que esta Constituição nunca foi submetida a referendo nem tão pouco os Tratados europeus apesar de reduzirem a soberania nacional. Está porventura na hora de o PR promover um processo público de avaliação desta Constituição com 45 anos mas nunca foi referendada e, já agora, reformar um sistema eleitoral cada vez menos proporcional. Na sua mais recente intervenção, o PR chuta para o lado mas isso não quer dizer que fique tudo na mesma.