Conforme prevê a nossa Constituição, a língua oficial da República Portuguesa é o Português, sendo tarefa fundamental do Estado a sua defesa e a sua difusão (art.º 9º, al. f) e art.º 11º, nº3 da CRP). Porém, não bastando tal obviedade, o legislador português clarificou ainda explicitamente noutros diplomas legais que a língua portuguesa seria a língua usada nas tramitações administrativas e judiciais do Estado (cfr. arts.º 54º C.P. Administrativo; 133º C.P. Civil ; 92º, nº1 C.P. Penal).

Por esta evidência, o conhecimento e uso da língua portuguesa torna-se condição indispensável para a integração de cidadãos de origem estrangeira que pretendam residir no nosso país e aqui construir as suas vidas. São inegáveis as dificuldades linguísticas de vários cidadãos estrangeiros que têm chegado a Portugal nos últimos anos e que apresentam enormes problemas de comunicação. Quem viva nas grandes cidades e já tenha recorrido aos serviços das plataformas tvde (transporte de pessoas e bens), provavelmente já tenha tido contacto com esta realidade que descrevo. As barreiras linguísticas e o deficit de conhecimentos da língua portuguesa de muitos cidadãos de origem asiática têm gerado incompreensões e mal-entendidos, traduzidos num sentimento de perda generalizada na qualidade da prestação dos respetivos serviços. Face a esta realidade, cabe-nos analisar o conjunto de medidas e políticas públicas que têm sido responsáveis por esta situação, quer pela sua permissividade, quer pela sua inexistência ou quer ainda pela sua falta de eficácia.

No que concerne aos conhecimentos da língua para efeitos de aquisição do título de residência permanente por parte de cidadãos estrangeiros, releva da lei «a comprovação de conhecimentos básicos de português» (art.º 80º, nº1 al. e) RPSAE). Quanto à aquisição da nacionalidade, a lei dispõe sob a forma de um conceito qualitativo que basta «conhecerem suficientemente a língua portuguesa» (art.º 6º, nº1, al. c) da Lei da Nacionalidade), desenvolvendo no seu respetivo regulamento que esse conhecimento corresponde ao nível A2 segundo o Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (art.º 25º, nº 2 al. e) Regulamento da Nacionalidade Portuguesa). Por extensão e por coerência legal, aplica-se também a exigência do mesmo nível A2 de proficiência linguística para efeitos de aquisição do título de residência permanente, conforme se poderá confirmar facilmente numa pesquisa à página online da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA). Este é o regime legal em que se enquadram milhares de cidadãos estrangeiros com títulos de residência permanente ou novos cidadãos portugueses. Será de facto eficaz? Estaremos realmente a conseguir integrar na nossa sociedade com as melhores políticas linguísticas milhares de cidadãos estrangeiros e novos cidadãos portugueses? A meu ver, a resposta é um claro Não!

Para que se entenda, em termos de proficiência linguística, o nível A2 corresponde a um conhecimento elementar ou pré-intermédio. Em termos técnicos, um estudante que conclua este nível de estudos terá apenas conhecimento dos tempos verbais do Presente, Pretérito Perfeito Simples e Pretérito Imperfeito. Na melhor das hipóteses conhecerá as conjugações do Futuro, do Condicional e dos dois tempos compostos do Modo Indicativo. Em termos práticos, o estudante saberá interagir em diálogos básicos do quotidiano, como pedidos na restauração e no comércio, mas dificilmente conseguirá interagir num contexto médico ou hospitalar.

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Um falante de nível A2 dificilmente conhecerá as formas do Modo Conjuntivo, e portanto, não saberá exprimir formas gramaticais comuns da língua portuguesa como talvez seja, quando for ou se fosse. Os conhecimentos de um falante de nível A2 são manifestamente reduzidos. Atrevo-me a dizer que correspondem ao grau normal de sobrevivência num país para o desenvolvimento das atividades quotidianas mais básicas, mas jamais permitem uma integração efetiva de cidadãos de origem estrangeira. Em vários países da União Europeia como a Itália, França e Alemanha, a proficiência linguística mínima requerida é o nível B1. Porque a lei portuguesa minimiza este aspeto? Não será o conhecimento adequado da língua portuguesa um aspeto determinante para a integração de cidadãos estrangeiros no nosso país?

Por último, e não de menos importância, é premente introduzir-se um exame de história e cultura para efeitos de aquisição da nacionalidade. Nem que seja através de um modelo de escolha múltipla. É inadmissível o atual regime legal que desconsidera os conhecimentos culturais, abrindo portas ao cenário em que os novos adquirentes da nacionalidade portuguesa nunca tenham ouvido falar de Fernando Pessoa, Luís de Camões, nem tão pouco de D. Afonso Henriques.

Neste âmbito urgem políticas linguístico-culturais pautadas por realismo, seriedade e sobretudo responsabilidade, a bem da nossa coesão social.