O primeiro texto que publiquei no Observador, há já quase um ano, intitulava-se “O PS não aprendeu nada com Pedrógão Grande”. Infelizmente, é um texto que não poderia ser mais atual. Qualquer governo com um mínimo de decência e consciência teria alterado o seu comportamento e a sua ação política depois dos trágicos incêndios de 2017. Mas o governo de António Costa, em vez de encarar com seriedade algo cuja repetição é impensável, olhou para os fogos como continua a olhar para tudo o resto: uma oportunidade de compadrio, negócio e spin.
O Partido Socialista não aprendeu mesmo nada com Pedrógão Grande ou com qualquer outra perda de vida e património durante esta legislatura, caso contrário não seriam adjudicados 125 mil euros à empresa do marido de uma autarca do PS em golas inflamáveis, nem se nomearia um jovem pasteleiro como adjunto especialista em Proteção Civil, nem tão-pouco um secretário de Estado do MAI teria a família com negócios relacionados com a indústria da madeira. É uma absoluta vergonha, uma indignidade sem nome, que os governantes que deviam representar e defender o povo se aproveitem da desgraça do povo para encherem os seus bolsos enquanto pagos pelo povo.
Em outubro de 2017, o atual primeiro-ministro cometeu a gaffe de reagir às primeiras 35 vítimas confirmadas com a garantia que tal “se seguramente repetiria”. Chegados a 2019 e os incêndios não só continuam a destruir o território português como, em jeito de acrescento, se tornaram uma fonte de rendimento extra para os dirigentes do partido do governo. Fomos de ‘habituem-se a morrer’ para ‘bora lá lucrar com isto’; de nepotismo no conselho de ministros para endogamia até na ANPC; do ato de contrição nacional para a celebração da adjudicação partidária.
Em qualquer outro país esta soma de aberrações não daria somente direito a demissões: daria obrigação de investigação e demais consequências. É, então, neste momento que devemos usufruir da sorte de ter um Presidente com experiência jurídica e política, na medida em que ele, melhor do que ninguém, saberá isto: os governos, na sua essência, propõem-se a uma missão básica, que é melhorar a vida dos seus concidadãos. E este, na sua prática, será lembrado pelo oposto disso, lucrando na tragédia dos portugueses.
A maioria, como já escrevi, até pode ser absoluta. A imoralidade é já total.